Tábata Bergonci
26/01/2017

[1]
Nosso DNA é composto por quatro moléculas diferentes, chamadas bases nitrogenadas. As bases nitrogenadas são divididas em dois grupos, purinas (Adenina e Guanina) e pirimidinas (Citosina e Timina). Essas quatro bases, A-G-C-T, formam pares A-T e G-C entre si e compõem o alfabeto genético que codifica todas as informações biológicas dos seres vivos. Em 2009, cientistas desvendaram como as pirimidinas foram originadas na Terra e, no ano passado, purinas foram criadas em laboratório com a combinação de hidrogênio, cianeto e água (falei sobre isso nesse artigo aqui). Porém, há muito tempo pesquisadores andam tentando criar novas letras para o alfabeto.

Em 2014, Romesberg e colaboradores anunciaram o desenvolvimento de duas bases nitrogenadas artificiais, nomeadas X e Y, que formam pares, marcando um avanço no campo da biologia sintética [2]. Na época, eles mostraram que bactérias Escherichia coli poderiam utilizar essas bases sintéticas em seu DNA. Contudo, o que a E. coli não podia fazer era manter essas bases quando ela passava pelo processo de divisão celular. Ou seja, quando o DNA sofria replicação para formar novas bactérias, as bases sintéticas eram expulsas do genoma.

Desde então, o grupo de Romesberg vinha tentando construir um genoma estável, capaz de manter a informação genética artificial e passá-la aos descendentes. Um artigo publicado na PNAS essa semana mostra que eles finalmente conseguiram [3]! Primeiramente, os cientistas aperfeiçoaram uma ferramenta chamada transportadora de nucleotídeo, que permite que as bases nitrogenadas X e Y passem através da membrana celular após serem copiadas. Esse transportador já havia sido usado em 2014, mas a bactéria ficava muito doente. Modificações fizeram então com que este não afetasse mais a saúde do organismo. O segundo passo foi fazer modificações na base Y, para que esta pudesse ser melhor reconhecida pelas enzimas que sintetizam o DNA durante o processo de replicação.

Para finalizar, os pesquisadores alteraram o sistema imune da bactéria para reconhecer sequências de DNA que não continham as bases X e Y como invasoras. Assim, uma célula que expulsasse as bases X e Y seria marcada para destruição. Esse novo organismo semissintético é capaz de manter as bases não-naturais por mais de 60 gerações, levando os cientistas a acreditarem que estas possam ser mantidas indeterminadamente.

Para Romesberg, o estudo sugere que os processos vitais podem ser manipulados, mas enfatiza que seu grupo trabalha apenas com organismos unicelulares e não pretende aplicar a técnica em seres vivos mais complexos. O próximo passo para o grupo agora é saber como esse novo código genético é transcrito para RNA, a molécula que as células precisam para produzir proteínas.

[1] Crédito da imagem: johntisza (Flickr) / Creative Commons (CC BY 2.0). URL: https://www.flickr.com/photos/34503836@N02/3321754352/.

[2] DA Malyshev et al. A semi-synthetic organism with an expanded genetic alphabetic. Nature 10.1038/nature13314 (2014).

[3] Y Zhang et al. A semisynthetic organism engineered for the stable expansion of the genetic alphabet. PNAS 10.1073/pnas.1616443114 (2017).

Como citar este artigo: Tábata Bergonci. A-T-G-C… X e Y! Nosso código genético ganha mais duas letras. Saense. URL: http://www.saense.com.br/2017/01/a-t-g-c-x-e-y-nosso-codigo-genetico-ganha-mais-duas-letras/. Publicado em 26 de janeiro (2017).

Artigos de Tábata Bergonci     Home