Antônio Murilo Macedo
14/04/2017

Visão esquemática da geração de fótons gêmeos por conversão paramétrica descendente espontânea. [1]
Fótons gêmeos são pares de fótons (unidades elementares de luz) produzidos quando um feixe de luz atravessa um meio com certas propriedades não-lineares. A grosso modo é como se fótons do feixe incidente se dividissem em pares de fótons. Os membros de cada par de fótons gerados neste processo apresentam fortes correlações puramente quânticas que têm sido usadas como base para os mais notáveis efeitos da tecnologia de informação quântica, como o teleporte quântico, a criptografia quântica e o imageamento fantasma [2]. O  método mais simples de geração de fótons gêmeos é denominado conversão paramétrica descendente espontânea (CPDE), no qual cada par gerado divide entre seus dois fótons a energia e o momento linear do fóton incidente, que é aniquilado no processo. Se os fótons do par recebem a mesma quantidade de energia, o processo é denominado conversão descendente degenerada (CDD) e os dois feixes de luz emitida têm exatamente o dobro do comprimento de onda da luz incidente. Podemos formular duas questões fundamentais sobre a CPDE ou a CDD. A geração dos fótons gêmeos é simultânea? Os membros do par são gerados no mesmo local?

A questão da simultaneidade foi respondida em 2011 [3] quando um grupo de pesquisadores da França observaram um atraso de algumas dezenas de femtossegundos [4] entre as gerações dos 2 fótons de cada par. A questão da localidade foi respondida em um artigo bem mais recente [5] por pesquisadores da Universidade de East Anglia na Inglaterra e causou bastante surpresa. A extensão da região de onde os fótons gêmeos emergem é bem maior do que se imaginava. Usando um formalismo de eletrodinâmica quântica, os autores conseguiram separar as contribuições de dois mecanismos distintos de CPDE, um local e um não-local. A emissão não local, ou seja em pontos espacialmente separados A e B, é explicada pela propagação de fótons virtuais através do meio do ponto A para o ponto B. A eficiência do processo depende do meio, mas segundo estimativa dos autores, para um cristal de beta borato de bário ela é de aproximadamente 8 pares não-locais para cada 10 mil pares gerados localmente.

Além da importância conceitual para os fundamentos da mecânica quântica e das diversas questões filosóficas que a geração de fótons gêmeos não-locais levanta, há também algumas consequências práticas relevantes. A CPDE é a mais simples e versátil fonte de fótons gêmeos e é portanto largamente usada em diversas aplicações da tecnologia da informação quântica. A hipótese de geração local dos gêmeos é amplamente usada no cálculo dos erros e calibração das medições. Portanto, fenômenos que hoje são atribuídos a ruído, como a perda de fidelidade em imageamento fantasma, precisam ser reavaliados para incorporar o efeito da não-localidade em alguns dos pares de fótons gerados pela CPDE.

[1] Crédito da Imagem: By J-Wiki at English Wikipedia / Wikimedia Commons. URL: https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=16525357.

[2] Imageamento fantasma é uma moderna técnica de produção da imagem de um objeto através da correlação de intensidades de dois feixes de luz que não possuem independentemente informação sobre a forma do objeto.

[3] F Boitier et al. Photon extrabunching in ultrabright twin beams measured by two-photon counting in a semiconductor. Nature Communications 2, 425 (2011).

[4] Um femtosegundo é um milionésimo de um bilionésimo de um segundo.

[5] – KA Forbes et al. Nonlocalized generation of correlated photon pairs in degenerate down-conversion. Phys Rev Lett 118, 133602 (2017).

Como citar este artigo: Antônio Murilo Macedo. Fótons gêmeos podem nascer em locais diferentes. Saense. URL: http://www.saense.com.br/2017/04/fotons-gemeos-podem-nascer-em-locais-diferentes/. Publicado em 14 de abril (2017).

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