Tábata Bergonci
18/10/2017

Quinze moais esculpidos pelo povo Rapa Nui na Ilha de Páscoa entre os anos de 1250 e 1500. [1]
A Ilha de Páscoa está situada no Oceano Pacífico em um ponto bastante distante de continentes. Sua localização incita longos debates sobre há quanto tempo pessoas navegam pelas águas do maior oceano do planeta. A ilha exerce fascínio devido à presença dos moais, figuras humanas gigantes que estão por todo seu território (são mais de 900 estátuas). Evidências arqueológicas sugerem que a ilha foi primeiramente habitada há menos de 1000 anos atrás. Seus primeiros habitantes são chamados Rapa Nui.

Existe uma teoria que sugere que muito antes dos europeus terem descoberto a ilha (em 1722), ela já servia de ponto de encontro para os povos da Polinésia e os nativos americanos. Assim, os Rapa Nui teriam em seu DNA uma mistura desses povos. Essa teoria foi impulsionada por um artigo publicado em 2014 que mostrou que os Rapa Nui atuais possuem 8% de DNA nativo americano em seu genoma [2]. Na pesquisa, o grupo usou um modelo estatístico que mostrou que esse DNA havia sido incorporado na população há muitas gerações atrás.

Agora, um novo artigo mostra uma história diferente. Os pesquisadores encontraram DNA antigo pertencentes a cinco Rapa Nui e os sequenciaram [3]. Três genomas são de indivíduos que viveram antes da chegada dos Europeus (entre os séculos XV e XVII) e os outros dois genomas são de indivíduos que viveram após a chegada dos Europeus (séculos XIX e XX). Esta é a primeira vez que DNA ancestral de Rapa Nui é sequenciado. E o resultado? Nenhuma das cinco amostras evidenciou DNA de nativos americanos ancestrais.

E então, o que está certo? Como os próprios pesquisadores do último trabalho apontam: o DNA sequenciado é muito antigo e mostra uma boa porcentagem de partes degradadas. O DNA é mais bem preservado em locais frios e secos, e a Ilha de Páscoa é de clima quente e úmido. Por esse motivo, nenhum genoma pôde ser sequenciado completamente. Além disso, uma amostra de cinco indivíduos não é suficiente para excluir a possibilidade de que nenhum Rapa Nui teve ancestralidade nativa americana.

Sobre o artigo de 2014, é preciso levar em consideração que ele usa um modelo para “prever” o genoma ancestral (já que os dados fornecidos ao modelo são de genomas modernos). Acontece que no século XIX a população Rapa Nui sofreu grande perda por conta de doenças (como a cólera), sobrando apenas cerca de 100 indivíduos. Esse evento, chamado em genética de efeito de gargalo, pode confundir a modelagem genética, que é baseada em tamanhos de população relativamente estáveis.

O que é certeza até agora? Parece que não muita coisa… os mistérios da Ilha de Páscoa continuam…

[1] Crédito da imagem: Lee Coursey (Flickr) / Creative Commons (CC BY 2.0). URL: https://www.flickr.com/photos/leeco/33754075822/.

[2] JV Moreno-Mayar et al. Genome-wide ancestry patterns in Rapanui suggest pre-European admixture with Native Americans. Current Biology 24, 2518 (2014).

[3] L Fehren-Schmitiz et al. Genetic Ancestry of Rapanui before and after European Contact. Current Biology 10.1016/j.cub.2017.09.029 (2017).

Como citar este artigo: Tábata Bergonci. Quando a genética ajuda a entender a história: DNA antigo desvendando a origem do povo da Ilha de Páscoa. Saense. URL: http://www.saense.com.br/2017/10/quando-a-genetica-ajuda-a-entender-a-historia-dna-antigo-desvendando-a-origem-do-povo-da-ilha-de-pascoa/. Publicado em 18 de outubro (2017).

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