Luana Mendonça
20/11/2018

[1]
Mimetismo é a capacidade de uma espécie de ‘imitar’ a forma ou o comportamento de outra geralmente para dificultar a vida dos seus predadores, mostrar mais agressividade ou facilitar a reprodução. Obviamente o mimetismo é uma característica adaptativa e se desenvolve a partir de uma série de fatores específicos para cada uma das espécies envolvidas, mas temos alguns exemplos bem conhecidos como a cobra coral, a orquídea (Ophrys apifera) que tem uma estrutura que se assemelha a fêmea de abelhas e algumas mariposas, como o exemplo da figura acima, cujas asas imitam olhos e passam a informação de que na verdade seriam um outro organismo, maior e robusto.

As mariposas também podem apresentar outro padrão de ‘imitação’ que é a camuflagem, que se diferencia de mimetismo pois, nesse caso, a espécie imita o ambiente ao seu redor e se torna praticamente invisível aos predadores a depender do nível de camuflagem. Outros exemplos de organismos que ‘imitam’ o ambiente são o bicho-pau e algumas corujas.

Obviamente para que o mimetismo ou camuflagem funcionem, é necessário que o outro organismo, o possível predador por exemplo, se oriente primariamente por meio da visão, ou seja, não adianta eu imitar outra espécie ou me camuflar no ambiente se o meu predador consegue me sentir de outra forma (sinais químicos, elétricos, sonoros, etc.). Um exemplo de predador não visual são os morcegos, eles se orientam a partir de ecolocalização, resumidamente é a capacidade de reconhecer a posição e a distância de objetos a partir do mecanismo de emissão e recepção de sons, ou seja, o morcego emite um som, esse som viaja no espaço, atinge um objeto que vai refletir o som (eco) e o morcego é capaz de receber de volta esse eco e saber onde está o objeto em questão.

Com toda essa capacidade de localizar objetos em um espaço, podemos imaginar que o mimetismo ou camuflagem visual das mariposas, que são predadas por morcegos, não funcionam. Então como evitá-los? Dois artigos publicados em outubro e novembro desse ano responde a essa pergunta. Neil et al. [2] relatam a incrível capacidade da mariposa Bunaea alcinoe (imagem acima) de evitar os morcegos a partir da camuflagem acústica!!! Os autores mencionam que em algumas mariposas, estruturas similares a ouvidos evoluíram e elas conseguem ‘ouvir’ os morcegos e evitá-los, mas que algumas são completamente ‘surdas’ e desenvolveram um outro mecanismo para evitar seus predadores. O mecanismo, apesar de simples é muito eficiente, trata-se de especializações na morfologia dos pelos (sim, mariposas tem pelos), tornando o corpo mais peludo, absorvendo o som, evitando o eco e impedindo a localização das mariposas pelos morcegos. Essa estrutura morfológica foi melhor estudada por Shen et al. [3] que evidenciaram que os pelos dessas mariposas têm uma complexidade incrível em tamanho, forma e espessura absurdamente adequadas para absorver as ondas sonoras (ultrassom) que são emitidas por morcegos!

Quem não gostaria de ter a capacidade de não apenas de se camuflar visualmente, mas também de evitar alguns sons não tão legais?

[1] Crédito da imagem: Lsadonkey (Wikimedia Commons), CC BY-SA 4.0. https://commons.wikimedia.org/wiki/Category:Bunaea_alcinoe#/media/File:Bunaea_alcinae_-_Cameroon.jpg.

[2] TR Neil et al. Stealthy moths avoid bats with acoustic camouflage. J Acoust Soc Am 10.1121/1.5067725 (2018).

[3] Z Shen et al. Biomechanics of a moth scale at ultrasonic frequencies. PNAS 10.1073/pnas.1810025115 (2018).

Como citar este artigo: Luana Mendonça. Uma mestra no disfarce: além de camuflagem visual, mariposas podem utilizar camuflagem sonora para evitar morcegos. Saense. http://saense.com.br/2018/11/uma-mestra-no-disfarce-alem-de-camuflagem-visual-mariposas-podem-utilizar-camuflagem-sonora-para-evitar-morcegos/. Publicado em 20 de novembro (2018).

Artigos de Luana Mendonça Home