Hendrik Macedo
22/04/2018

Fotografia da retina humana. [1]
O número de pessoas com diabetes no Brasil aumentou mais de 60% na última década, atingindo, nos dias de hoje, aproximadamente 9% da população. Esses dados são da pesquisa de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel) do Ministério da Saúde, divulgada em abril de 2017. Uma das complicações da diabetes é a retinopatia diabética (Diabetic Retinopathy – DR). A doença provoca alterações estruturais nos vasos sanguíneos da retina e é uma das principais causas de cegueira em adultos. O diagnóstico da retinopatia diabética é tradicionalmente feito por oftalmologista especialista em retina através da análise de imagens de alta resolução do fundo do olho do paciente, obtidas através de dispositivo médico eletrônico para este fim.

Abordagens automáticas via computador para análise do fundo do olho têm sido investigadas [2] [3], e aparecem como possível solução para o dilema do aumento dos casos de diabetes vs. quantitativo de especialistas que os sistemas de saúde precisam enfrentar. Em um trabalho recente [4], pesquisadores avaliaram a qualidade de um software inteligente, o EyeArtTM, para detecção da DR através de fotografia de fundo de olho obtida por smartphone. A inteligência artificial utilizada para detectar e classificar o nível de DR consiste de uma arquitetura profunda (deep learning) que se utiliza de milhares de imagens de fundo de olho de variados graus de DR para que aprenda a reconhecer os padrões da doença. Um dos desafios dessa IA é conseguir boa taxa de sucesso no diagnóstico de DR a partir de uma fotografia de fundo de olho de um paciente feita com auxílio de smartphone, não tendo sido treinada com fotografias feitas com smartphones, mas, sim, com as tradicionais obtidas com dispositivo médico eletrônico específico.

No estudo, 296 pacientes com diabetes tipo 2 foram submetidos a fotografias de fundo de olho com smartphone em um centro de saúde na Índia. A identificação do nível de DR foi realizada por oftalmologistas usando a escala padronizada internacional de classificação, a ICDR (International Clinical Diabetic Retinopathy). Das pessoas diagnosticadas com DR pelo oftalmologista, a IA identificou corretamente mais de 95% delas, ou seja, menos de 5% de falsos negativos. Para os casos de DR com comprometimento visual (Sight-Threatening Diabetic Retinopathy – STDR), a IA obteve desempenho ainda melhor: mais de 99% de acerto. Em ambos os casos, a IA obteve em torno de 80% de acerto ao afirmar que o paciente não sofria da doença, ou seja, 20% dos pacientes diagnosticados com DR (ou STDR) pelo oftalmologista não o foram pela “máquina”. As taxas de diagnóstico de DR (ou STDR) obtidas pelo software a partir de imagens de smartphone do fundo de olho dos pacientes voluntários da pesquisa são similares (em alguns casos até melhores) às obtidas através da IA com uso de dispositivo médico específico e que estão descritas em outros trabalhos na literatura relacionada [5] [6].

O trabalho realizado demonstrou ser possível utilizar imagens obtidas com auxílio de um smartphone para diagnosticar retinopatia diabética em doentes com boa acurácia. A menor acurácia na identificação de pacientes sãos não é tão preocupante (apesar do susto :), uma vez que a maior consequência seria a necessidade de exames mais aprofundados que, certamente, corrigiriam o diagnóstico. O rastreamento/acompanhamento regular da retina para pessoas com diabetes ainda é uma necessidade não atendida em muitos países. Essa combinação de algoritmos inteligentes com dispositivos pervasivos de baixo custo pode ser muito útil para a massificação de programas de diagnóstico da retinopatia diabética e triagem de pacientes, particularmente, em áreas remotas de países pouco desenvolvidos e com carência de profissionais especialistas.

[1] Crédito da imagem: rdowns (Pixabay) / CC0 Creative Commons. https://pixabay.com/pt/retina-nevo-olho-1214187/.

[2] M Abràmoff et al. Evaluation of a system for automatic detection of diabetic retinopathy from color fundus photographs in a large population of patients with diabetes. Diabetes Care 10.2337/dc07-1312 (2008).

[3] OB Walton et al. Evaluation of automated teleretinal screening program for diabetic retinopathy. JAMA Ophthalmology 10.1001/jamaophthalmol.2015.5083 (2016).

[4] R Rajalakshmi et al. Automated diabetic retinopathy detection in smartphone-based fundus photography using artificial intelligence. Eye 10.1038/s41433-018-0064-9 (2018).

[5] A Russo et al. Comparison of smartphone ophthalmoscopy with slit-lamp biomicroscopy for grading diabetic retinopathy. Am J Ophthalmol 10.1016/j.ajo.2014.11.008 (2015).

[6] D Ting et al. Development and validation of a deep learning system for diabetic retinopathy and related eye diseases using retinal images from multiethnic populations with diabetes. JAMA 10.1001/jama.2017.18152 (2017).

Como citar este artigo: Hendrik Macedo. Diagnóstico de retinopatia diabética com imagens de smartphone. Saense. http://www.saense.com.br/2018/04/diagnostico-de-retinopatia-diabetica-com-imagens-de-smartphone/. Publicado em 22 de abril (2018).

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