Matheus Macedo-Lima
24/01/2019

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Antes de começar este artigo, precisamos fazer uma importante distinção. As palavras sexo e gênero não podem ser confundidas. Sexo é determinado pelo conjunto de cromossomos que um indivíduo possui. Em humanos, o sexo masculino geralmente possui o conjunto de cromossomos sexuais XY; o feminino possui o conjunto XX (embora haja exceções). Já o gênero é decidido pelo cérebro. É ligado a fatores hormonais e genéticos, mas afetado por fatores culturais, sociais e psicológicos. Cientistas que estudam identidade de gênero afirmam sem hesitar: não existem apenas dois, mas muitos gêneros. Portanto, chamar a ciência de gênero de “ideologia” é um sinal de falta de informação. Agora vamos ao artigo.

Diferenças entre os sexos (também chamadas dimorfismos sexuais) existem em muitos aspectos em animais. Diferenças em tamanho, locais de pelos no corpo e comportamentos são exemplos fáceis de observar. Porém, encontramos também alguns dimorfismos sexuais em órgãos internos, como o fígado e o cérebro. Essas diferenças podem ser devido aos cromossomos sexuais, e/ou pela ação dos diferentes hormônios.

Esses dimorfismos são muitas vezes sutis e irrelevantes, mas na medicina, eles podem ser um caso de vida ou morte. Por exemplo, o sucesso de transplantes de rim depende tanto do sexo do doador como do recipiente [2]. Em alguns tipos de câncer, o sexo pode influenciar a frequência, a severidade e a resposta aos tratamentos. Portanto, identificar esses fatores é crucial para o tratamento apropriado de pacientes; pode realmente salvar vidas!

Recentemente, um grupo de pesquisadores identificou importantes dimorfismos sexuais num tipo de câncer maligno cerebral, os glioblastomas [3]. Esses cânceres são o segundo tipo mais comum no cérebro e são muito graves: a duração média de sobrevivência após o diagnóstico é de cerca de 1 ano. Eles ocorrem 1,6 vezes mais comumente no sexo masculino, mas o tratamento é mais eficaz no sexo feminino, o que sugere que o sexo é um importante fator. Por conta disso, os cientistas decidiram estudar se havia diferenças entre os tumores masculinos e femininos, para tentar desvendar a origem desses dimorfismos e prover fundamentos para terapias mais apropriadas.

Os pesquisadores avaliaram o DNA de centenas de tumores e analisaram o tamanho e progressão destes por meio de imagens de ressonância magnética. Combinando as duas análises eles identificaram grupos de pacientes que respondiam melhor aos tratamentos. Esses grupos (um masculino e um feminino) apresentavam combinações específicas da expressão de genes em seus tumores.

A surpresa: os genes que faziam os tumores responderem melhor à quimioterapia eram diferentes entre tumores masculinos e femininos.

Os pesquisadores foram além e fabricaram no laboratório células cancerígenas com esses genes e confirmaram que as combinações entre a expressão dos grupos de genes e o sexo das células era o que determinava a eficácia das drogas usadas em quimioterapias.

Esse tipo de estudo é importante para que tratamentos apropriados sejam desenvolvidos, conforme a composição genética dos tumores. No caso dos glioblastomas, tratamentos para os grupos de pacientes que não responderam aos tratamentos precisam ser desenvolvidos, e agora sabemos que depende tanto dos genes quanto do sexo dessas células.

[1] Créditos da imagem: NIH Image Gallery (Flickr), CC BY-NC 2.0. https://www.flickr.com/photos/nihgov/37286663672/.

[2] F Lepeytre et al. Association of Sex with Risk of Kidney Graft Failure Differs by Age.  J Am Soc Nephrol 10.1681/ASN.2016121380 (2017).

[3] W Yang et al. Sex differences in GBM revealed by analysis of patient imaging, transcriptome, and survival data. Sci Transl Med 10.1126/scitranslmed.aao5253 (2019).

Como citar este artigo: Matheus Macedo-Lima. Eficácia da quimioterapia depende do sexo do paciente. Saense. http://saense.com.br/2019/01/eficacia-da-quimioterapia-depende-do-sexo-do-paciente/. Publicado em 24 de janeiro (2019).

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