Matheus Macedo-Lima
04/08/2019
Para entender os hormônios, imagine-os como maestros de orquestra. Eles “conduzem” diversos e diferentes músicos (órgãos) à distância, ditando intensidade, mudanças de ritmo e emoção. Em termos mais biológicos, as células que produzem hormônios geralmente os lançam na corrente sanguínea para controlar remotamente o funcionamento de outros órgãos.
Algumas moléculas que agem como hormônio são cortisol (o do estresse), adrenalina e hormônios sexuais.
Os mais famosos hormônios sexuais são os estrógenos (como o estradiol) e a testosterona. Uma coisa interessante é que todos são derivados da molécula do colesterol e podem ser transformados um no outro por enzimas. A testosterona, por exemplo, pode ser transformada em estradiol por meio da enzima aromatase. Por esse motivo aqui vai uma informação importantíssima: não há hormônio feminino ou masculino. Eles ocorrem e são importantes em ambos os sexos!
Agora vamos falar de autismo… correção: desordens do espectro autista (DEAs). Como o nome mais complicado sugere, o autismo existe em muitas formas e intensidades. Um ponto bastante preocupante é que se estima que DEAs estão presentes em 1 em cada 59 crianças norte-americanas (4x mais frequente em meninos) e há vários relatos de que essa incidência está aumentando (dobrou desde 2004!) [2]. A causa desse aumento é ainda um mistério, e obviamente é um motivo de preocupação para o futuro da humanidade.
Desesperador? Em caso de desespero acerca do futuro da humanidade, só a ciência pode nos socorrer!
Cientistas já desconfiavam há um tempo de que a incidência 4x maior de DEAs em homens poderia estar relacionada a hormônios sexuais. Seguindo essa lógica, um grupo recentemente sugeriu que há uma correlação entre índices de autismo e níveis de estrógenos durante a gravidez [3].
O grupo liderado pelo Dr. Simon Baron-Cohen (por curiosidade primo do ator e comediante Sacha Baron-Cohen, o Borat) identificou que mães de meninos com DEA apresentavam níveis de estrógenos acima do comum durante o 3º mês de gravidez. Eles identificaram que, dentre eles, o estradiol foi o mais fortemente correlacionado com os índices de DEAs.
Essa ideia parece fazer sentido, já que a vida humana moderna acidentalmente introduziu vários químicos sintéticos que agem como mímicos de hormônios sexuais quando entram no nosso corpo. São chamados coletivamente de disruptores endócrinos. Alguns exemplos básicos: plásticos contendo bisfenois e pesticidas contendo DDT e glifosato (este último presente em vários pesticidas recentemente aprovados pelo novo governo brasileiro).
Portanto, níveis elevados de estrógenos durante a gravidez são um candidato sério à posição de causador do aumento da incidência de desordens do espectro autista. Isso sugere que medidas de saúde pública que visem a reduzir a exposição da população à disruptores endócrinos podem ajudar a conter e reduzir a incidência de autismo na população.
[1] Créditos da imagem: hepingting. https://www.flickr.com/photos/57570482@N06/5299266366.
[2] R. R. Redfield et al., “Prevalence of Autism Spectrum Disorder Among Children Aged 8 Years-Autism and Developmental Disabilities Monitoring Network, 11 Sites, United States, 2014,” Morb. Mortal. Wkly. Rep., vol. 67, no. 6, 2014.
[3] S. Baron-Cohen et al., “Foetal oestrogens and autism,” Mol. Psychiatry, p. 1, Jul. 2019.
Como citar este artigo: Matheus Macedo-Lima. Estrógeno alto na gravidez é a causa do autismo? Saense. https://saense.com.br/2019/08/estrogeno-alto-na-gravidez-e-a-causa-do-autismo/. Publicado em 04 de agosto (2019).