UFSC
08/09/2021

Pesquisadores verificaram que a intensidade e a duração das atividades influenciam diretamente o acúmulo de poluentes no trato respiratório [1]

Um artigo publicado na revista científica Environmental Research demonstra como a realização de atividades físicas em ambientes poluídos pode levar à inalação de partículas nocivas e ao seu acúmulo no sistema respiratório, bem como aumentar a exposição ao coronavírus. Os resultados, além de ampliarem a discussão sobre os riscos dessas práticas para a saúde, ajudam a entender como o SARS-Cov-2 é transportado até o pulmão durante os exercícios. Baseado em modelos teóricos e simulações matemáticas com diferentes cenários, o trabalho envolveu pesquisadores da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), da Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) e da Universidade de São Paulo (USP).

Os testes tiveram o objetivo de calcular como a intensidade e a duração das atividades físicas impactam a quantidade de material particulado – partículas muito finas de sólidos ou líquidos suspensos no ar – que se deposita em nosso trato respiratório. Apesar de os materiais particulados abrangerem distintos tipos de substâncias, incluindo poeira e areia, por exemplo, o foco da pesquisa foram os poluentes. “Essencialmente, o que estamos tratando aqui no texto é essa partícula oriunda da poluição atmosférica, de atividade industrial, queimadas e, principalmente, da combustão dos veículos automotores, pode ser gasolina, diesel, álcool, qualquer combustível”, afirma Ramon Cruz, professor do Centro de Desportos (CDS) da UFSC e um dos autores do artigo.

Dados previamente coletados em outro estudo permitiram simular o que acontece no sistema respiratório humano durante uma corrida. Foram consideradas três intensidades: moderada, intermediária e severa, com duração de até 90, 60 e 20 minutos, respectivamente. O tempo foi definido em função das particularidades de cada uma.

A atividade moderada se caracteriza pela possibilidade de ser realizada por um longo período, sem desconforto físico. Nela, o praticante é capaz de conversar confortavelmente. Na faixa intermediária, a pessoa já não consegue permanecer por tanto tempo, começa a ficar ofegante, menos confortável e com alguma dificuldade para falar. Por fim, na intensidade severa, não é possível conversar confortavelmente, o esportista fica muito ofegante e percebe uma espécie de queimação na musculatura ativa. Os exercícios realizados nessa última intensidade possuem, em geral, curta duração e costumam compor treinos intervalados, que os alternam com atividades mais leves ou até com períodos em repouso.

O que se observou, de modo geral, foi que quanto mais tempo a pessoa passa se exercitando em locais poluídos, como ruas e avenidas no horário de pico do trânsito, maior o número de partículas inaladas. Atividades muito intensas, contudo, mesmo que praticadas durante curtos períodos, podem implicar uma grande quantidade de partículas absorvidas. “Se você ficar se exercitando por 90 minutos num ambiente muito poluído, é quando você mais deposita poluente no seu trato respiratório, só que, como a taxa de ventilação [quantidade de ar inspirado e expirado por minuto] não é tão alta assim, a deposição não chega principalmente nas vias mais profundas do trato respiratório. Agora, se eu fizer a correção por tempo, ou seja, o tanto de partícula que foi depositada de acordo com o tempo pelo qual eu me exercitei, aí o pior cenário possível está lá no domínio severo, porque a taxa de ventilação é muito alta, eu supero todos os meus mecanismos de defesa ou de filtragem e a maior parte desses poluentes vai direto para a região do meu pulmão”, alerta Ramon.

Coronavírus e atividades físicas

O artigo traz novas contribuições para a compreensão de como ocorre a infecção pelo SARS-CoV-2, uma vez que o material particulado pode servir de transporte para o coronavírus. Ramon explica que a ideia da pesquisa surgiu após o grupo ter acesso a estudos que faziam a relação entre poluição atmosférica e taxas de infecção e de casos graves de covid-19. “Depois, fizeram alguns modelos experimentais para testar, e, de fato, isso ocorre, porque o vírus acaba, de uma certa forma, agregando as partículas que estão em suspensão no ar”, comenta o docente. 

Ou seja, a realização de atividades físicas em ambientes poluídos também aumenta nossa exposição ao coronavírus. E, quanto mais intenso o exercício, maior a probabilidade de o vírus chegar ao pulmão, junto com as demais partículas dispersas pelo ar.

Testes com pessoas

Para além dos modelos teóricos e simulações matemáticas, os pesquisadores também têm se dedicado a estudos com pessoas, em situações reais e com diferentes modalidades de exercícios. Entre as questões que os cientistas buscam responder, estão até que ponto a exposição à poluição pode anular os benefícios do exercício à saúde ou atrapalhar o desempenho de atletas.

Em sua tese de doutorado, Ramon constatou uma série de impactos negativos da prática de exercício intervalado de alta intensidade desenvolvido em ambiente com poluição atmosférica. Outra pesquisa, com ciclistas que pedalaram por 90 minutos em baixa intensidade, teve seus resultados parcialmente publicados: “O que a gente tem percebido é que tem um modelo de transição. A partir de mais ou menos 60 minutos, pode ficar negativo para a saúde de modo geral [se exercitar em local poluído], especificamente para a saúde cardiovascular e o sistema imune. Também pode acontecer, infelizmente, se você se exercitar em alta intensidade em um período curto de tempo, que é aquele exercício intervalado. Isso também pode atrapalhar essa resposta da saúde cardiovascular, do sistema imune e do metabolismo”.

Orientações

Alguns cuidados podem ajudar a reduzir os riscos de contaminação – tanto pela poluição como pelo SARS-CoV-2 – durante os exercícios físicos. “Qual seria a mensagem final que esse artigo nos traz? Primeiro, evidentemente, que a gente fique distante da poluição atmosférica. Se for inevitável, se for só naquele horário que você pode se exercitar, ou se não tem nenhuma outra saída, o que a gente tem percebido até agora, baseado nos estudos que ainda estão em processo de revisão por pares, é que é melhor que você evite os exercícios de alta intensidade. Então, você pode escolher outro dia, outro horário ou outro local para inserir esse tipo de tarefa na sua rotina, principalmente agora, no momento em que nós estamos”, aponta Ramon. O professor recomenda também que as pessoas evitem se exercitar em ambientes fechados ou com aglomeração (mesmo que em locais abertos) e que sempre usem máscara de qualidade e de maneira correta. [2]

[1] Foto: Clem Onojeghuo/Unsplash.

[2] Texto de Camila Raposo/Jornalista da Agecom/UFSC.

Como citar este texto: UFSC. Exercícios em locais poluídos podem trazer riscos à saúde e aumentar exposição à covid-19, aponta estudo. Texto de Camila Raposo. Saense. https://saense.com.br/2021/09/exercicios-em-locais-poluidos-podem-trazer-riscos-a-saude-e-aumentar-exposicao-a-covid-19-aponta-estudo/. Publicado em 08 de setembro (2021).

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