Claudio Macedo
28/06/2016

Veículo sem motorista. [1]
Veículo sem motorista. [1]
Desde o surgimento dos primeiros testes de uso em vias públicas de veículos sem motorista têm surgido estudos que indicam que esses veículos têm potencial para nos trazer muitos benefícios. Eles podem, por exemplo, aumentar a eficiência do tráfego e eliminar cerca de 90% dos acidentes de trânsito [2]. Além disso, hoje, os carros são bens pessoais, mas quando veículos autônomos se disseminarem, o interesse em ser proprietário de carro pode diminuir à medida que as pessoas se cansarem de pagar para possuir veículos que ficam estacionados na maior parte do tempo. Os carros do futuro poderão ser apenas unidades intercambiáveis dentro de um amplo sistema de transportes [3].

Pesquisadores norte-americanos [2] investigaram um dilema ético que está subjacente na programação computacional dos veículos sem motorista: como escolher entre dois males: atropelar pedestres para salvar o passageiro ou sacrificar o passageiro para salvar pedestres?

Os autores da pesquisa consultaram 1.928 pessoas sobre questões de como devem ser programados os carros autônomos para tomar decisões em situações críticas de acidentes inevitáveis e sobre suas possíveis escolhas pessoais para uso de tais veículos.

O resumo da pesquisa indica que a maioria dos entrevistados aprovam que os veículos sem motorista, no caso de acidentes inevitáveis, devem minimizar os danos, inclusive sacrificar os seus passageiros para o bem maior, e gostariam que as pessoas os comprassem, mas eles próprios preferem andar em veículos autônomos programados para proteger seus passageiros em todas as situações.

O bem maior deveria ser a diretriz para a escolha dos programas computacionais desses veículos e até uma determinação legal; ocorre que, caso assim aconteça, pode haver um retardamento na adoção ampla dos carros sem motorista pelo fato dos possíveis usuários não quererem adquirir ou usar veículos assim programados. Por outro lado, a não disseminação dos veículos autônomos pode significar que se deixe de evitar a morte de inúmeras pessoas pela redução dos acidentes que esses veículos poderão promover, além de não se viabilizar a possível inclusão do automóvel em um desejável impessoal sistema de transportes.

Outra opção, é deixar que o fabricante do veículo escolha o algoritmo computacional que toma a decisão “moral” a ser adotada em casos de acidentes inevitáveis. Nesse caso, os fabricantes de carros que minimizam danos serão criticados por optarem pela morte de seus próprios passageiros, e os fabricantes de carros que privilegiam seus próprios passageiros serão criticados por desvalorizar a vida dos outros. Além disso, surge uma nova questão: se um fabricante oferece diferentes versões do seu algoritmo “moral”, e um comprador conscientemente escolheu um deles, é do comprador a culpa para as eventuais consequências nefastas das decisões do algoritmo? Certamente, considerações de responsabilidade deste tipo terão de acompanhar as discussões sobre a regulação desses veículos.

Com a possível disseminação dos veículos autônomos e a mudança do conceito de veículo pessoal para simplesmente uma unidade de um sistema de transporte, as pessoas naturalmente poderão preferir veículos que maximizam a segurança global, isto é, o bem maior [3].

O fato é que os consumidores, os fabricantes e o governo devem coletivamente decidir como lidar com os problemas éticos dos veículos sem motorista, antes de se estabelecer uma legislação para regular o tipo de algoritmo “moral” que pode ser adotado na programação de tais veículos.

[1] Crédito da imagem: Ed and Eddie (Flickr) / Creative Commons (CC BY-SA 2.0). URL: https://www.flickr.com/photos/edandeddie/16294467119.

[2]. JF Bonnefon et al. The social dilemma of autonomous vehicles. Science 352, 1573 (2016).

[3]. JD Greene. Our driverless dilemma. Science 352, 1514 (2016).

Como citar este artigo: Claudio Macedo. O dilema ético dos veículos sem motorista. Saense. URL: http://www.saense.com.br/2016/06/o-dilema-etico-dos-veiculos-sem-motorista/. Publicado em 28 de junho (2016).

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