IPT
11/01/2021

Exemplo de aplicação prática do uso das câmaras convencional e termográfica: a foto da esquerda obtida com o drone por meio do equipamento convencional mostra a presença de fissura tratada. No entanto, uma parte não tratada (delimitada no quadrado) dessa mesma fissura não é facilmente identificada, principalmente a olho nu. Na foto da direita a fissura (novamente delimitada no quadrado) é facilmente evidenciada pela imagem termográfica, formando uma linha horizontal contínua, em roxo, com a parte tratada. [1]

Quem assistiu ao primeiro filme da franquia ‘O Predador’, lançado em 1987, provavelmente se pegou pensando em algo como “seria interessante se eu também pudesse enxergar o calor”. No filme, o Major Alan “Dutch” Schaeffer, interpretado por Arnold Schwarzenegger, consegue derrotar o alienígena do título somente após descobrir que o inimigo se orientava pelas variações de calor no ambiente e não enxergava através da água (e da lama) porque a sua visão era infravermelha.

A partir de reflexões feitas sobre um blockbuster, o Laboratório de Recursos Hídricos e Avaliação Geoambiental (Labgeo) do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) deu início às suas pesquisas na linha de termografia com o auxílio de drones. A técnica de registro gráfico é empregada desde a medicina até indústrias para medir a energia infravermelha emitida por um objeto e, em seguida, transformá-la em imagens com tons coloridos que correspondem às diferentes temperaturas registradas.

As atividades do IPT com drones foram iniciadas em 2013 primeiramente com o propósito de auxiliar as equipes do Instituto em projetos de acompanhamento ambiental de empreendimentos de grande porte. Em sete anos de capacitação para uso da ferramenta, o drone foi ampliando suas aplicações em diversas atividades de campo e, em 2017, uma câmera termográfica foi adquirida – por ser um procedimento que não envolve contato direto com o objeto de estudo, a termografia infravermelha abre cada vez mais seu leque de uso e hoje uma câmera, com esse tipo de tecnologia, pode ser embarcada desde em um modelo simples de drone até em aviões e em satélites.

PATOLOGIAS CONSTRUTIVAS E MANUTENÇÃO – Atualmente, a câmara termográfica embarcada no drone é uma ferramenta que auxilia no processo de inspeções para a identificação de patologias construtivas em fachadas de edifícios, em uma parceria do Labgeo com o Laboratório de Materiais de Construção Civil (LMCC) do IPT.

Realizar a manutenção de edificações é um tema cuja importância atual supera a cultura de se pensar o processo de construção limitado até o momento quando a edificação é entregue e entra em utilização. “É imprescindível que a atividade de manutenção seja levada em conta tão logo uma edificação seja colocada em uso, e deve ser entendida como um serviço técnico perfeitamente programável e como um investimento na preservação do valor patrimonial”, explica o pesquisador Alexandre Cordeiro dos Santos, do LMCC.

Os tipos mais comuns de manutenção são a preventiva, que consiste na execução de serviços cuja programação é feita com antecedência, e a corretiva, caracterizada por serviços que demandam ação ou intervenção imediata a fim de permitir a continuidade do uso de sistemas, elementos e componentes das edificações, ou evitar graves riscos ou prejuízos pessoais/patrimoniais aos usuários e aos proprietários.

Os sistemas que compõem as fachadas, entre as partes das edificações, apresentam em geral uma degradação mais acelerada que as partes protegidas – afinal, eles ficam diretamente expostos aos agentes ambientais. Em muitos casos, a altura dos edifícios cria locais de difícil acesso que demandam altos gastos com locação de equipamentos e ferramentas específicas para a realização das inspeções e de manutenções.

Considerando o potencial dessa tecnologia, o LMCC tem empregado desde novembro de 2019 as câmeras convencional e termográfica embarcadas no drone em seus serviços tecnológicos de identificação e diagnóstico de diversos tipos de manifestações patológicas nas fachadas dos edifícios. Dois projetos foram realizados desde então e um está em tratativas.

QUATRO FASES – O método de inspeção de fachadas com o drone consiste em quatro etapas:

  • Análise do projeto de fachada ou arquitetônico (quando disponível) e avaliação visual da edificação para a identificação das regiões que serão alvo da inspeção com o drone, assim como para verificação de condições de contorno, incluindo limitações de operacionalização do voo e interferências;
     
  • Seleção da câmera fotográfica (convencional e/ou termográfica) e operacionalização do voo para obtenção de imagens das regiões em avaliação;
     
  • Transferência de imagens para o computador e tratamento dos dados obtidos, identificando os locais das imagens nas fachadas;
     
  • Análise de manifestações patológicas, a fim de definir as diretrizes de recuperação, ou para o aprofundamento da investigação com ensaios laboratoriais específicos.


A câmera de infravermelho fornece uma imagem térmica (o chamado termograma) com dados de temperatura da superfície da fachada. “Quando há algum tipo de irregularidade no material, o fluxo de calor é alterado (tanto do ambiente externo para o interior dos materiais da fachada, quanto vice-versa) e o termograma indicará a distribuição irregular de temperaturas na superfície da fachada. Isso permite destacar anomalias, como a presença de fissuras”, explica Osmar Hamilton Becere, pesquisador do LMCC.

Não é por acaso que o pesquisador chama atenção especial para as fissuras: é através delas que ocorre a penetração de água de chuvas para o interior da edificação, gerando diversos processos de degradação nos materiais de construção, bem como o comprometimento da salubridade dos ambientes internos da edificação, ao criar condições propicias para o desenvolvimento de microrganismos. “Estas fissuras podem ser de pequena abertura e não serem detectáveis em imagens convencionais ou a olho nu, mas são identificáveis pelas imagens termográficas”, completa ele.

O ideal é que as operações de inspeção de fachadas com drones sejam realizadas sempre por dois profissionais: um fica dedicado à operação do equipamento e o outro, portador de conhecimento técnico relacionado ao objeto da investigação, faz o acompanhamento visual do equipamento e orientação dos locais de coleta de imagens – “é por isso que as atividades de inspeção no IPT são executadas por uma equipe composta por membros de diferentes formações”, lembra Caio Cavalhieri, pesquisador do Labgeo.

“Essa tecnologia possibilita a inspeção em regiões da edificação de difícil acesso, registrando anomalias de maneira rápida em imagens de alta definição, que subsidiam os pesquisadores para a tomada de decisão quanto ao estabelecimento de diretrizes corretivas”, resume Santos – ao final das contas, o resultado é uma maior assertividade nos relatórios gerados por apresentar dados analíticos detalhados.

NOVOS USOS E LIMITAÇÕES – Existem outros usos possíveis para a câmera termográfica dentro das linhas de trabalho prestadas pelo IPT, explica Cavalhieri: “Existe um grande potencial para atender a Defesa Civil e o Corpo de Bombeiros em atividades de resgate e combate a incêndios; além disso, a câmera já foi testada em pesquisas do IPT relacionadas a stress hídrico e à identificação de nascentes de água, e outra aplicação é o reconhecimento de pontos de queima de gás em áreas em que há disposição de resíduos sólidos” – a propósito deste último projeto, as cores amarela e branca no vídeo abaixo correspondem a temperaturas mais altas e estão associadas a superfícies do aterro sanitário com incidência direta de luz solar, e ao ponto de queima de gás (corpo em movimento no centro do vídeo). Já as temperaturas mais baixas (em azul e verde) dizem respeito às saias (paredes íngremes de cada degrau) do aterro com sombra.

Hoje, a câmera usada nos trabalhos é uma FLIR Zenmuse XT não radiométrica, embarcada em um drone DJI Inspire 1 V2.0, e o software para analisar as imagens termográficas é o FLIR Tools.

Apesar das inúmeras vantagens trazidas pelas câmeras termográficas a cada dia, a ferramenta não deve ser vista como a solução para todos os problemas e, o mais importante, os interessados devem estar preparados e treinados para que seja possível tirar o máximo benefício em sua utilização. A maior dificuldade que esse tipo de solução oferece está relacionada à interpretação das imagens termográficas, explica Cavalhieri: “Isso ocorre porque nossos olhos não estão acostumados a esse tipo de representação gráfica; é necessária uma análise criteriosa para compreender o significado exato da energia infravermelha emitida por diferentes objetos”.

[1] Crédito da imagem: IPT.

Como citar este texto: IPT. Termografia na construção civil. Saense. https://saense.com.br/2021/01/termografia-na-construcao-civil/. Publicado em 11 de janeiro (2021).

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