Tábata Bergonci
28/03/2021
Nosso cérebro é uma máquina incrível! Nós o utilizamos para resolver as mais diversas situações cotidianas, como também para pensar nas mais profundas questões filosóficas e científicas. Nosso cérebro ainda nos permite sonhar enquanto dormimos e, também, é ele o responsável por nossa memória. A memória pode ser descrita como a capacidade do nosso cérebro em formar, organizar, armazenar e recuperar informações disponíveis. Nosso cérebro tem memórias de curto e longo prazo de eventos que ocorreram; memórias relacionadas a cheiros e sons; memórias de trabalho, no caso, de como mover a perna, como andar de bicicleta, como tocar um instrumento etc.; entre tantos outros tipos de classificações de memória.
O hipocampo é o local do cérebro responsável pela formação, organização e armazenamento das memórias e por conectar certas sensações e emoções a essas memórias. Quando nós nascemos, nosso hipocampo ainda não está 100% maduro, o que faz com que bebês tenham memórias diferentes das nossas. Mas bebês tem mesmo memórias?
Primeiro, é preciso dizer que bebês com até 2 meses tem poucas memórias, e essas memórias, quando existentes, duram um período muito curto [2]. A partir dos 2 meses, a memória começa a se estabelecer de maneira melhor. Estudos com bebês americanos de 2 meses mostraram que eles conseguem reconhecer a voz da mãe, e diferenciá-la da voz de uma pessoa estranha [3]. Outros estudos mostraram que mesmo quando dormindo, bebês dessa idade sabem se estão escutando vozes conhecidas, de familiares, ou vozes de estranhos, que nunca ouviram anteriormente.
Entre os 2 e 3 meses de vida, o hipocampo dos bebês aumenta muito de tamanho e se torna mais maduro. Nessa mesma fase, bebês começam a reconhecer objetos com mais facilidade. É também nessa fase que eles param de sorrir involuntariamente, o chamado sorriso endógeno. Sim! Os sorrisos do seu recém-nascido não são verdadeiros, são apenas espasmos de alguns nervos faciais! Também com essa idade os bebês diminuem a frequência e a duração do chamado “choro espontâneo”, aquele que não acontece por motivos de dor, fome ou medo.
Dos 3 aos 6 meses de vida, o bebê já consegue memorizar sequências de objetos mostrados a ele e entender que existe essa sequência [4] E após os 6 meses de idade, a memória começa a ficar bem melhor, e os bebês começam a conseguir se lembrar por mais tempo das coisas. A partir dos 7 meses os bebês começam a ficar estressados quando se separam dos familiares mais próximos, e começam a ter medo de pessoas que nunca viram. Isso acontece porque a memória de um bebê de 7 meses já dura tempo suficiente para ele se lembrar dos familiares por mais tempo e perceber sua falta, por exemplo. Ou seja, antes dos 7 meses, o bebê reconhece quem são os familiares quando estes estão por perto, mas não consegue se lembrar deles quando eles “desaparecem” de seu campo de visão ou audição.
Um estudo publicado na revista Current Biology [5] mostrou que a memória dos bebês, assim como as de crianças e adultos, dependem bastante do sono. Dormir, já sabe a ciência, nos ajuda a reorganizar as memórias e facilita seu acesso. No experimento, os pesquisadores mostraram a bebês com 6 a 8 meses de idade diversos objetos e seus nomes. Depois disso, alguns bebês tiraram cochilos curtos e outros cochilos longos. Os bebês que dormiram menos tiveram sua memória prejudicada, e se recordaram de objetos tal qual um bebê de 3 meses o faria. Os bebês que dormiram mais tiveram bastante sucesso no teste e apresentaram poder de memória tão bom quanto bebês mais velhos, com mais de 9 meses de idade.
Sabendo que bebês aprendem e se lembram, mas infelizmente esquecem rápido o que memorizaram, cientistas da Universidade de Nova York foram atrás de explicações genéticas para isso: e encontraram! Em adultos, uma proteína chamada AMPA é importante na formação da memória, sendo que duas partes dessa proteína, GluA1 e GluA2, têm expressão aumentada quando um adulto memoriza algo [6]. Trabalhando com exercícios de memória em ratos bebês, os pesquisadores descobriram que quando eles memorizam algo, apenas GluA2 é mais expressa. Assim, pode-se concluir que o sistema bioquímico utilizado pelos bebês para memorizar não é semelhante ao de adultos e, por isso, eles acabam esquecendo mais rapidamente o que foi memorizado.
Mas será que bebês de até 1 ano realmente perdem toda a memória do que viveram, ou apenas nós adultos é que não conseguimos acessá-las? Será que traumas sofridos no primeiro ano de idade podem afetar sua vida de adulto? Isso é conversa para o próximo artigo!
[1] Imagem: Ruben Brave, Flickr, CC BY 2.0.
[3] 10.1080/87565641.2011.650807.
[4] 10.1016/j.cognition.2019.104091.
[5] 10.1016/j.cub.2017.06.070.
[6] 10.1038/s41598-018-32762-y.
Como citar este artigo: Tábata Bergonci. O que pensam os bebês de até 1 ano de idade? A ciência tentando entender as memórias infantis. Saense. https://saense.com.br/2021/03/o-que-pensam-os-bebes-de-ate-1-ano-de-idade-a-ciencia-tentando-entender-as-memorias-infantis/. Publicado em 28 de março (2021).