UFRGS
22/07/2022

Análise do padrão estético feminino no telejornalismo escancara falta de representatividade
Segundo estudo, telejornalismo brasileiro segue o padrão de beleza vigente no país [1]

Corpos magros, cabelos lisos e castanhos – nunca grisalhos – , rostos com poucas ou nenhuma ruga. Esse é o padrão estético das jornalistas da televisão aberta brasileira, segundo dissertação de mestrado defendida em junho no Programa de Pós-graduação em Comunicação da UFRGS que analisou a aparência de repórteres e âncoras de programas jornalísticos da Record, SBT, Band e Globo.

A autora do trabalho, Mariana Argoud Dias, confirmou essa padronização após analisar cor da pele, cor, textura e tamanho dos cabelos, formato dos corpos, maquiagens, figurinos e acessórios de 64 jornalistas que trabalham em frente às câmeras. Das profissionais avaliadas, 92% eram brancas, 62,5% magras, 84% tinham cabelo liso e 64% não tinham rugas. A pesquisa também detectou a predominância do uso de cores sóbrias, como preto e bege, e de acessórios pequenos.

Os dados obtidos demonstram que o telejornalismo brasileiro segue o padrão de beleza vigente no país. Para melhor entender o impacto desses dados, Mariana entrevistou quatro telejornalistas que trabalham em televisões abertas. Nessas conversas, detectou casos de racismo sofridos por profissionais negras por parte de entrevistados, por exemplo.

Mesmo que teoricamente o uso da maquiagem não seja obrigatório dentro do espaço de trabalho, Mariana relata que uma das jornalistas entrevistadas confessou que as mulheres recebiam um kit de maquiagem pela equipe técnica no momento da contratação. Fica claro, dessa forma, como as exigências são aplicadas, ainda que não verbalizadas.

Apesar das mudanças, falta de representatividade persiste

Mesmo que isso ocorra de forma extremamente lenta, Mariana percebe evoluções entre as apresentações da classe jornalística feminina ao longo dos anos. Ela destaca que, hoje em dia, já se notam repórteres com tatuagens e piercings à mostra, uso de cores quentes (como o vermelho) no figurino e maior presença de profissionais orientais, por exemplo.

“A mudança é lenta porque as pessoas dão maior credibilidade a um padrão já conhecido na televisão, e o telejornalismo reproduz o que já é visto. A muito custo, com o trabalho de movimentos sociais, isso vem mudando. A quebra da padronização dos veículos de imprensa causa desconforto na população por ela estar acostumada com um cenário, e, quando ele muda, causa impacto”

Mariana Argoud Dias

Como exemplo de momentos que causaram impacto na televisão e que hoje são naturalizados, Mariana relembra de quando os âncoras do Jornal Nacional, da Rede Globo, começaram a se levantar e caminhar pelo estúdio, deixando de lado a ideia da bancada fixa. O que na época foi descredibilizado por uma parcela da população, nos dias de hoje passa praticamente despercebido. A inserção de telejornalistas que tragam maior representatividade, acrescenta, deve seguir o mesmo processo.

Por não haver grande presença de jornalistas que se diferem das características-padrão, a pesquisadora alega que isso se torna um fator crucial para que estudantes de jornalismo não se interessem por trabalhar em televisão – afinal, elas acham que não têm lugar no telejornalismo brasileiro. “A gente precisa de uma maior representatividade urgentemente, para que essas alunas possam saber que aquele lugar também pode ser seu. A mudança também parte por começar a ter mais representatividade para que esse cenário comece a mudar mais rápido”, afirma.

Para ela, reforçar esses padrões pouco vistos no dia a dia da sociedade acaba por tornar invisíveis vários outros tipos de corpos possíveis, inviabilizando que mulheres que não se encaixem nesse padrão atuem em frente às câmeras. Quanto mais características a profissional tiver em comum com o padrão, maiores são as chances de ingressar nesse mercado de trabalho e permanecer na televisão.

“É o ideal de televisão que a telejornalista tenha todas as características. Não existe, por exemplo, uma mulher que seja completamente ao contrário do padrão. Então, uma mulher que é negra, gorda, com o cabelo cacheado e com rugas não aparece na televisão. Esse é o ponto zero”, relata Mariana. O trabalho na íntegra deve ser disponibilizado em breve no Lume, repositório digital da UFRGS. [2]

[1] Foto: Flávio Dutra/JU.

[2] Texto de Gabhriel Giordani.

Como citar esta notícia: UFRGS. Análise do padrão estético feminino no telejornalismo escancara falta de representatividade. Texto de Gabhriel Giordani. Saense. https://saense.com.br/2022/07/analise-do-padrao-estetico-feminino-no-telejornalismo-escancara-falta-de-representatividade/. Publicado em 22 de julho (2022).

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