Claudio Macedo
04/02/2024
Em 2016, e em dois anos anteriores, o Inep realizou a Avaliação Nacional de Alfabetização (ANA) com o objetivo de avaliar os estudantes matriculados no Ciclo de Alfabetização das redes públicas de ensino, gerando informações sobre os níveis de alfabetização e letramento em Língua Portuguesa e alfabetização Matemática dos estudantes. Nessa época, estava em vigor Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC). O Pacto estabelecia o compromisso de alfabetizar as crianças até o final do 3º ano do Ensino Fundamental (EF).
As turmas consideradas na ANA em 2016 (3º Ano do EF) influenciaram diretamente os resultados do Ideb do 5º Ano do EF em 2017 e em 2019. No Saeb de 2017, os alunos do 3º Ano de 2016 que foram aprovados estavam no 4º Ano e os que foram reprovados ainda estavam no 3º Ano, e no Saeb 2019 alunos do 3º Ano de 2016 que tiveram reprovações estavam entre o 3º e o 5º Ano. Todos esses alunos influenciaram as taxas de aprovação, que é um dos fatores que definem o Ideb, e os que estavam no 5º Ano participaram das provas do Saeb 2019, portanto, influenciando, também, o outro fator que compõe o Ideb: a nota média em Língua Portuguesa e em Matemática.
Os resultados da ANA em leitura de 2016 foram apresentados em uma escala de proficiência em que a média brasileira foi de 508 pontos, mas o desejável era que a pontuação obtida pelas escolas tivesse sido igual ou maior do que 625.
Na tabela 1 são mostrados os resultados obtidos pelas redes públicas (municipais e estaduais) dos 26 estados e do Distrito Federal em Proficiência em Leitura dos alunos do 3º Ano do EF em 2016 e o Ideb do 5º Ano do EF em 2017 e em 2019.
O que se observa na tabela 1 é que há uma grande semelhança entre a sequência das redes públicas das unidades federativas ordenadas de maior para menor pontuação na Proficiência em Leitura em 2016 e a sequência dessas mesmas redes públicas considerando os Idebs de 2017 e de 2019 do 5º Ano do EF, também ordenados do maior para o menor. Isto é, salvo pequenas variações, maior Proficiência em Leitura em 2016 resultou em maior Ideb em 2017 e em 2019 e, menor Proficiência em Leitura em 2016 resultou em menor Ideb em 2017 e em 2019. O coeficiente de correlação de Pearson expressa bem o resultado: ρ = 0,95 entre a Proficiência 2016 e o Ideb 2017 e ρ = 0,94 entre a Proficiência 2016 e o Ideb 2019. A correlação é fortíssima, pois o valor máximo é ρ = 1. [1]
A partir de 2017 a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) estabeleceu que o foco da alfabetização se daria nos dois primeiros anos do EF, sendo assim, em 2019 o Saeb passou a avaliar os estudantes matriculados no 2º Ano do EF em Língua Portuguesa e em Matemática. Na avaliação de Língua Portuguesa, os resultados foram apresentados numa escala de proficiência em que a média brasileira foi de 750 pontos, mas o desejável era que a pontuação obtida pelas escolas tivesse sido igual ou maior do que 825.
O aluno que estava no 2º Ano do EF em 2019, após dois anos, em 2021, se foi sempre aprovado, estava no 4º Ano, se teve reprovação, estava no 2º ou 3º Ano. Tanto num caso, como no outro, o aluno do 2º Ano em 2019 influenciou o resultado do Ideb do 5º Ano do EF em 2021 através da taxa de aprovação, que é um dos fatores que definem o Ideb.
Na tabela 2 são apresentados os resultados obtidos pelas redes públicas (municipais e estaduais) dos 26 estados e do Distrito Federal em Proficiência em Língua Portuguesa no 2º Ano do EF em 2019 e o Ideb do 5º Ano do EF em 2021.
Outra vez, como ocorreu na tabela 1, podemos observar na tabela 2 que, salvo pequenas variações, maior Proficiência em Língua Portuguesa em 2019 resultou em maior Ideb em 2021 e, menor Proficiência em Língua Portuguesa em 2019 resultou em menor Ideb em 2021. O coeficiente de correlação de Pearson expressa bem o resultado: ρ = 0,91 entre a Proficiência em Língua Portuguesa em 2019 e o Ideb 2021. A correlação é, novamente, fortíssima.
As tabelas 1 e 2 caracterizam muito bem a essencialidade de se promover a alfabetização de boa qualidade nas nossas escolas. Nossos jovens só podem evoluir adequadamente nos estudos se forem bem alfabetizados até o 2º Ano do Ensino Fundamental. A partir do 3º Ano a alfabetização deixa de fazer parte do dia a dia das aulas e os alunos que não estão bem alfabetizados passam a ter dificuldade de aprender os conteúdos curriculares e, assim, se tornam desmotivados e candidatos a tirar notas baixas, a serem reprovados e, até mesmo, abandonar a escola.
Somando os dias letivos do 1º e do 2º Ano do Ensino Fundamental, temos 400 dias letivos disponíveis para a escola promover a alfabetização adequada dos estudantes. Acreditamos que 400 dias letivos sejam suficientes para alfabetizar bem nossas crianças. Precisamos que isso aconteça para podermos ter uma educação pública de boa qualidade. [2], [3]
[1] Coeficiente de correlação (ρ) calculado através da Função Pearson do Microsoft Excel. ρ tem valor máximo 1 quando o ordenamento de duas séries de grandezas é idêntico, isto é, se sempre que uma grandeza de uma das séries cresce a correspondente da outra série também cresce.
[2] Inep: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira; Saeb: Sistema de Avaliação da Educação Básica; Ideb: Índice de Desenvolvimento da Educação Básica.
[3] Artigos relacionados: Claudio Macedo. A contraproducente reprovação escolar. Saense. https://saense.com.br/2023/09/a-contraproducente-reprovacao-escolar/; A alfabetização interrompida. Saense. https://saense.com.br/2023/03/a-alfabetizacao-interrompida/; A qualidade da educação básica avaliada. Saense. https://saense.com.br/2023/04/a-qualidade-da-educacao-basica-avaliada/; A alfabetização interrompida. Saense. https://saense.com.br/2023/03/a-alfabetizacao-interrompida/; A distorção do atraso escolar. Saense. https://saense.com.br/2023/03/a-distorcao-do-atraso-escolar/.
Como citar este artigo: Claudio Macedo. O efeito da boa alfabetização na aprendizagem das crianças. Saense. https://saense.com.br/2024/02/o-efeito-da-boa-alfabetizacao-na-aprendizagem-das-criancas/. Publicado em 04 de fevereiro (2024).