Jornal da USP
21/02/2025

Título: Cientistas desvendam produção de néctar do maracujá para atrair formigas “guarda-costas”
Brasil é o maior produtor mundial de maracujá, com cerca de 150 espécies nativas; em 2023, foram produzidas mais de 700 mil toneladas de fruto em 45 mil hectares plantados – Fotomontagem Jornal da USP feita com imagens de Mural nativo/Wikimedia Commons – CC BY-SA 4.0 e Athirashijinair/Wikimedia Commons – CC BY-SA 4.0

Os botânicos já têm o conhecimento de que o néctar produzido nas folhas do maracujá atrai formigas, que por sua vez atuam afastando ácaros e insetos e oferecendo proteção à planta. Mas como exatamente isso acontece? Um estudo com a colaboração de pesquisadores da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP revela o mecanismo molecular por trás da produção de substâncias reguladoras do crescimento das folhas e da formação de nectários extraflorais (EFNs) – as estruturas produtoras desse néctar. As conclusões do trabalho estão em artigo da revista New Phytologist.

“O Brasil é o maior produtor mundial de maracujá, principalmente o maracujá azedo (Passiflora edulis), uma das espécies estudadas. Das 500 espécies de maracujá da América tropical, cerca de 150 espécies são nativas do Brasil, segundo a Embrapa”, declara ao Jornal da USP o professor Fábio Nogueira, da Esalq, integrante do grupo de pesquisadores que elaboraram o artigo. “Em 2023, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil produziu mais de 700 mil toneladas de fruto em 45 mil hectares plantados. O principal uso do maracujá é o consumo do fruto in natura ou no preparo de medicamentos, extratos, condimentos, sucos e doces”.

O professor explica que os EFNs estão localizados nas margens ou no pecíolo (ligação com o caule) das folhas de maracujá. “Sua principal função parece ser a de produzir néctar para atrair diferentes espécies de formigas”, observa. “Elas, por sua vez, funcionam como ‘guarda-costas’, evitando a presença de insetos herbívoros e ácaros que podem se alimentar e danificar as folhas”.

Desenvolvimento

Nogueira diz que o objetivo do trabalho foi entender como as plantas de maracujá usam o miR156 e seus genes alvos para controlar o desenvolvimento das folhas durante as fases juvenil e adulta, e como os EFNs são formados nesse período. “O miR156 é um pequeno RNA (microRNA) que controla a quantidade de proteínas de uma família de reguladores denominada SPL”, aponta o professor da Esalq. “O microRNA funciona como um modulador negativo da quantidade de SPLs que uma célula vegetal vai ter, fator que altera a formação dos tecidos vegetais”, diz. “Além disso, outra meta foi determinar se o miR156 e seus genes alvos regulam a interação das plantas de maracujá com as formigas atraídas pelo néctar, e como fazem isso”.

As espécies analisadas na pesquisa foram a Passiflora edulis (maracujá azedo) e Passiflora cincinnata (maracujá do cerrado ou da caatinga). “São espécies que se desenvolvem em ambientes bem diferenciados e possuem desenvolvimento foliar e de EFNs muito contrastantes”, descreve o professor da Esalq. “O maracujá azedo é plantado nas regiões Sul, Sudeste e Nordeste, enquanto o maracujá da caatinga é encontrado normalmente no Cerrado brasileiro, com o seu ecossistema característico”.

“Nosso trabalho concluiu que o miR156 possui um papel modulador muito importante no desenvolvimento das folhas de maracujá, alterando a formação e desenvolvimento dos EFNs”, destaca Nogueira. “Consequentemente, isso modifica as interações ecológicas entre o maracujá e as formigas”.

“Como esta é uma pesquisa básica, ainda é prematuro indicar como essa descoberta pode auxiliar os cultivos comerciais de maracujá”, comenta o professor da Esalq. “Entretanto, como algumas pragas são insetos e ácaros, podemos sugerir que o manejo ecológico de precisão da interação maracujá e formigas, usando as informações de como e quando os EFNs são produzidos nas folhas, pode auxiliar na redução de danos causados por essas pragas”.

Participaram do projeto pesquisadores da Esalq, Escola de Engenharia de Lorena (EEL) da USP, Instituto Butantan, Universidade Federal de Viçosa (UFV), Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e University of Bristol (Reino Unido). O artigo Proper activity of the age-dependent miR156 is required for leaf heteroblasty and extrafloral nectary development in Passiflora spp. foi publicado na revista científica New Phytologist.

Mais informações: ftsnogue@usp.br, com Fabio Tebaldi Silveira Nogueira [1], [2]

Como citar este texto: Jornal da USP. Título Cientistas desvendam produção de néctar do maracujá para atrair formigas “guarda-costas”. Texto de Júlio Bernardes. Saense. https://saense.com.br/2025/02/titulo-cientistas-desvendam-producao-de-nectar-do-maracuja-para-atrair-formigas-guarda-costas/. Publicado em 21 de fevereiro (2025).

Notícias do Jornal da USP Home