Hendrik Macedo
01/01/2016

Charles Darwin. Crédito: Pixabay / Wikimedia Commons.
Charles Darwin. [1]
Um androide é novamente enviado de volta ao passado para retomar a missão de assassinar um garoto antes que este venha a se tornar o grande líder da resistência dos seres humanos contra o domínio das máquinas. Sim, esta é uma breve sinopse do filme “O Exterminador do Futuro 2”, que estreou há mais de vinte anos. O androide citado é o principal antagonista do filme e tratava-se de um modelo T-1000 avançado, cuja principal característica era a capacidade de se restaurar e transformar partes de seu corpo em lâminas ou outros objetos mais adequados à sua estratégia para atacar ou à situação adversa em que o androide se encontrasse.

Em mais um exemplo de como a vida imita a arte (mesmo que ainda com grandes limitações), pesquisadores especialistas em robótica da Université Pierre et Marie Curie (Paris 06) desenvolveram um mecanismo para permitir que robôs conseguissem se adaptar a súbitas e variadas modificações não previstas em sua morfologia, tais como pequenos danos à sua estrutura física [2]. Um dos tipos de robôs utilizados para validar experimentalmente o mecanismo foi um robô móvel de seis pernas. O método de testagem dos pesquisadores consistia em aplicar um determinado tipo de dano físico, como arrancar uma das pernas por exemplo, e aguardar que o robô descobrisse alguma estratégia de movimentação que compensasse o prejuízo causado. Uma estratégia de movimentação consiste em uma sequência de ativações dos motores do robô que permitem que ele ande. Previamente, o robô era submetido a executar milhares de movimentações e memorizar aquelas com melhor performance. Uma medida de performance poderia, por exemplo, ser a distância máxima percorrida pelo robô em um dado espaço de tempo. Após sofrer o dano físico, o robô conseguia criar novas movimentações a partir daqueles inicialmente conhecidas utilizando algoritmos inteligentes que assumem a premissa de que, mesmo em circunstâncias diferentes, as ações com maior chance de sucesso são próximas de outras ações que já se mostraram bem sucedidas. Ou seja, o robô conseguia aprender novas movimentações rapidamente e instintivamente minerando sua memória em busca de suas movimentações passadas que foram mais bem sucedidas.

A chave do mecanismo criado reside em um algoritmo inteligente da família dos Algoritmos Evolucionários [3] para lidar com este espaço de busca gigantesco (uma estratégia para o hexápode, por exemplo, que é controlado por 36 parâmetros, consiste em sequências de ativações motoras em um espaço de 36 dimensões). Esta família de algoritmos utiliza a metáfora da evolução biológica na construção de uma população de soluções (usualmente chamadas de “indivíduos”) para um dado problema, onde as melhores (mais aptas) possuem mais chances de reproduzir e gerar novas e ainda melhores soluções. Esta aptidão é uma medida de performance representada por alguma função. Sobre esta reprodução atuam outros operadores genéticos como crossover e mutação que garantem diversidade. Ao fim de algum critério de parada pré-estabelecido (e.g. número de gerações, limite mínimo de aptidão, variação do valor médio de aptidão da população de duas gerações subsequentes), a melhor solução dentre a população corrente é selecionada. No caso em questão, a melhor solução corresponde à melhor estratégia de movimentação para o robô.

Diante de tentativas anteriores frustradas em se criar inteligência robótica que exibam comportamento rápido, intuitivo e adequado à situação em voga, a partir do projeto e implementação de um ‘cérebro’ sob medida [4], talvez a melhor aposta seja investir no poder dos algoritmos evolucionários e adaptativos uma vez que boas estratégias são melhoradas pela replicação com variação e seleção, os mesmos operadores genéticos que agiram ao longo de milhões de anos de ajustes e podas darwinianas na construção do algoritmo que nosso cérebro atualmente utiliza.

[1] Crédito da imagem: WikiImages (Pixabay) / Creative Commons CC0. URL: https://pixabay.com/en/charles-darwin-scientists-62967/.

[2] A Cully et al. Robots that can adapt like animals. Nature 521, 503 (2015).

[3] DA van Veldhuizen and GB Lamont. Multiobjective evolutionary algorithms: Analyzing the state-of-the-art. Evolutionary Computation 8, 125 (2000).

[4] J Kober et al. Reinforcement learning in robotics: a survey. Int J Robot Res 32, 1238 (2013).

Como citar este artigo: Hendrik Macedo. Robôs com capacidade de readaptação. Saense. URL: http://www.saense.com.br/2016/01/robos-com-capacidade-de-readaptacao/. Publicado em 01 de janeiro (2016).

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