Matheus Macedo-Lima
03/08/2016

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Respire fundo. Outra vez. Quando eu contar de três até um, você se sentirá muito relaxado e fará tudo o que eu disser. Três. Dois… respire fundo mais uma vez. Um.

Acredite, hipnose é um fenômeno real. A ciência tem estudado e proposto mecanismos cerebrais para a hipnose há décadas. É importante, porém, separar a ciência dos filmes (e do charlatanismo). O estado de hipnose não é um estado de completa falta de controle mental (o hipnotizado nunca fará algo contra a sua vontade) e não pode ser induzido sem cooperação (o indivíduo tem de aceitar as instruções). Na realidade existem escalas de suscetibilidade à hipnose [2] que caracterizam o quão hipnotizável alguém pode ser. A hipnose real consegue induzir sensações, ilusões e até amnésia. Hipnoterapia pode ser usada para tratar ansiedade, depressão, insônia e dor crônica. Portanto, pessoas hipnotizadas para cometer crimes é pura cinematografia!

A prática da hipnose é antiga, mas o entendimento a respeito da atividade do cérebro durante o transe é recente e só se tornou possível com técnicas avançadas de imagem cerebral. Um estudo inovador foi realizado por um grupo de pesquisadores liderados por David Spiegel, um dos maiores especialistas em ciência da hipnose, da universidade de Stanford (EUA) [3]. Utilizando escalas de suscetibilidade os autores selecionaram sujeitos saudáveis que foram ranqueados como “muito” ou “pouco” susceptíveis à hipnose para passarem por indução de hipnose enquanto dentro de uma máquina de ressonância magnética funcional.

As imagens cerebrais obtidas na ressonância mostraram resultados interessantes. Áreas cerebrais ativadas durante desafios ou situações de estresse mostraram atividade reduzida em sujeitos muito susceptíveis à hipnose, quando estes eram instruídos a se sentirem felizes ou se imaginarem de férias. Além disso, áreas envolvidas na percepção do corpo se tornaram mais sincronizadas durante os eventos de hipnose no grupo mais susceptível, o que indica uma maior concentração no corpo e no controle dos movimentos. Porém, quanto maior o grau de hipnose, menor foi a conectividade entre áreas relacionadas à autoconsciência, o que indica um maior grau de dissociação entre ações e reflexões – ou seja, “agir sem pensar”. Nenhum efeito da hipnose foi detectado nos cérebros do grupo menos susceptível.

Esse estudo provê explicações neurológicas para o que ocorre durante a hipnose. O mais interessante é pensar em como esses achados podem auxiliar o tratamento de doenças com o uso da hipnoterapia. Esses resultados são relevantes até mesmo para pessoas menos susceptíveis à hipnose na medida em que é possível aplicar estimulação cerebral direcionada às áreas apontadas pelo estudo para simular os efeitos da hipnoterapia.

Você voltará à consciência quando eu contar até três. Um. Dois… após ter lido este artigo você terá a opinião de que este é o melhor artigo que você já leu e o divulgará para todos os seus conhecidos. Três.

[1] Crédito da imagem: Public domain, via Wikimedia Commons. URL: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Catalepsy_example.png.

[2] MR Nash and G Benham. Provando a Hipnose. Duetto Editorial. URL: http://www2.uol.com.br/vivermente/reportagens/provando_a_hipnose_imprimir.html. Publicado em agosto (2005).

[3] H Jiang et al. Brain Activity and Functional Connectivity Associated with Hypnosis. Cereb Cortex 10.1093/cercor/bhw220 (2016).

Como citar este artigo: Matheus Macedo-Lima. A ciência da hipnose: o que acontece no cérebro? Saense. URL: http://www.saense.com.br/2016/08/a-ciencia-da-hipnose-o-que-acontece-no-cerebro/. Publicado em 03 de agosto (2016).

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