Luana Mendonça
21/11/2017

Figura 1 – Escaravelho (Besouro da folha) Cassida rubiginosa na fase adulta (A) e larval (B) hospedeiro da bactéria extracelular com menor genoma já conhecido (em verde e azul fluorescentes) que habita diversos órgãos do sistema digestivo (C, D e E) e reprodutivo (C, F e G) do inseto hospedeiro. FG: intestino anterior; MG: intestino médio; HG: intestino posterior; OV: ovários. [1]
Primeiro o mais importante, o que é Pectina? É um polissacarídeo que constitui boa parte dos tecidos das plantas, mas também tem várias aplicações gastronômicas, pois esse polissacarídeo possibilita a formação de géis (geleias, sucos, doces de frutas, dentre outros). Obviamente o maior uso da pectina na alimentação humana é como espessante (geralmente em pó) e como os programas culinários estão em alta, todo mundo já viu vários ‘truques’ da gastronomia molecular que tem como elemento mágico a pectina. Longe de ser um elemento difícil para a digestão humana, esse polissacarídeo é de complicada digestão para inúmeras outras espécies de animais.

Segundo, esse texto vai falar sobre um recente artigo que mostra uma relação simbiôntica em que simbionte e hospedeiro parecem ter evoluído juntos e acabaram chegando a uma condição super especial! Vamos começar falando do hospedeiro, o escaravelho Cassida rubiginosa (chamado de Besouro da folha no artigo, leaf beetle’s) é um besouro pertencente à família Chrysomelidae (Figura 1, A-B), nativo da Eurásia que vem sendo introduzido, geralmente de maneira intencional, em locais da América do Norte e da Nova Zelândia para controle de herbáceas. Por se alimentar exclusivamente de folhas, pesquisadores [1] buscaram entender a forma como esse inseto degradava a pectina. E como as vezes achamos o que não estávamos procurando junto com o que realmente queríamos encontrar (agradeçam sempre a São Longuinho), esses pesquisadores descobriram que a fonte para degradação do polissacarídeo está na presença de uma bactéria extracelular alojada em órgãos especializados do hospedeiro que estão conectados ao intestino (Figura 1, C-G). Agora sobre a bactéria, que também é incrível, os autores descobriram que ela possui o menor genoma já encontrado em um organismo que não existe fora da célula hospedeira. No entanto, apesar do pequeno genoma, a bactéria manteve o metabolismo pectinolítico (para degradar pectina e outros polissacarídeos) funcionando. Os autores também encontraram alta expressão de pectinase (enzima que quebra a pectina) nos órgãos do inseto hospedeiro o que demostra a intima relação entre a presença da bactéria simbionte e a capacidade do inseto hospedeiro de digerir a pectina (o principal componente da dieta dessa espécie). Os autores também mencionam que a eliminação do simbionte resulta em uma drástica redução da capacidade de sobrevivência do hospedeiro, pois a habilidade de degradar pectina é reduzida.

Por fim, os autores destacam a simbiose como excelente estratégia para um herbívoro metabolizar a pectina, componente universal dos tecidos vegetais considerado um dos polissacarídeos mais complexos da natureza. Esse estudo obviamente também abre portas para vários outros que visem estudar mais a fundo a relação de interdependência entre simbionte e hospedeiro, sem contar que pode também mostrar caminhos para a quebra de outras moléculas de digestão difícil para os animais!

[1] H Salem et al. Drastic Genome Reduction in an Herbivore’s Pectinolytic Symbiont. Cell 171, 1 (2017).

Como citar este artigo: Luana Mendonça. A bactéria simbionte com menor genoma já conhecido fornece ao seu hospedeiro uma capacidade incrível: quebrar Pectina! Saense. URL: http://www.saense.com.br/2017/11/a-bacteria-simbionte-com-menor-genoma-ja-conhecido-fornece-ao-seu-hospedeiro-uma-capacidade-incrivel-quebrar-pectina/. Publicado em 21 de novembro (2017).

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