Marco Túlio Chella
19/03/2018
Em 2008 os pesquisadores em neurociência Timothy Marzullo e Gregory Gage perceberam a importância em mostrar às crianças e jovens o que é ciência e uma carreira dedicada a pesquisa. A partir dessa percepção começaram a visitar escolas, explicando o que é neurociências e alguns tópicos sobre o funcionamento do cérebro. Pesquisando e observando outras ações de popularização de ciência, constataram que, em sua maioria, elas eram demonstrações; algumas buscando ser atrativas e divertidas acabavam perdendo o objetivo de levar um real entendimento do assunto.
Com esse cenário, concluíram que era importante manter o componente lúdico, porém sem perder o objetivo de apresentar um conteúdo e que poderiam conseguir esse equilíbrio por meio de realização de experimentos semelhantes aos que realizavam nos laboratórios. Contudo, sabiam que os instrumentos de laboratório além de caros não poderiam ser transportados e instalados em uma sala de aula com facilidade. Com esse impedimento, levantaram a seguinte questão: se alguém deseja estudar astronomia não precisa ser um pesquisador pós-graduado para ter acesso a um telescópio com custo e qualidade razoável, por que não ser da mesma forma para uma pessoa ou grupo que queira estudar neurociências.
Após alguma pesquisa, concluíram que não havia à disposição equipamentos de baixo custo para experimentos em eletrofisiologia e eletroestimulação funcional. Foi assim que o pesquisador Gregory Gage, também com formação em engenharia elétrica, desenvolveu o equipamento SpikerBox [2], um sistema constituído por um circuito com bio amplificador e aplicativo para captura, visualização de sinais biológicos e geração de sinais para estimulação. Com o Spikerbox é possível realizar experimentos em tópicos como a geração de eletricidade pelos neurônios, transporte de informação pelo sistema nervoso, ou as informações que o cérebro envia para que os músculos executem movimentos. A avaliação do uso da Spikerbox em oficinas mostrou resultados positivos ao gerar interesse e envolvimento de crianças e jovens.
Com o resultado obtido com a Spikerbox, em 2013 os pesquisadores lançaram e obtiveram sucesso em uma campanha de financiamento coletivo para desenvolver o projeto RoboRoach [3]. Este sistema consiste em um módulo eletrônico constituído por rádio com comunicação Bluetooth, circuito para geração de sinais elétricos em frequência e amplitude adequados, que são aplicados por meio de eletrodos a pontos específicos do corpo de uma barata. Todo o sistema é colado na parte superior da barata. O aplicativo, no smartphone, permite o envio de comandos via Bluetooth que recebidos pelo módulo geram os estímulos elétricos semelhantes ao que ocorrem quando a antena do inseto toca um objeto, fazendo com que ele se movimente para uma direção ou outra.
Projetos como Spikerbox e RoboRoach são um bom exemplo de como é possível criar ações para popularização da ciência sem que isso envolva grandes recursos financeiros, as vezes dependentes de financiamento e iniciativa governamental. Quem sabe esse projeto inspire nossos cientistas a criar equipamentos, experimentos e roteiros de apresentação. Afinal, como Gage diz, se referindo a uma das motivações para o projeto em sua área de estudo: “Uma em cada cinco pessoas vão ser diagnosticadas com algum tipo de desordem neurológica, a maioria sem cura. Precisamos de mais pessoas educadas em neurociência para investigar essas doenças.”
[1] Crédito da Imagem: Backyard Brains / Creative Commons (CC BY-SA 3.0). https://backyardbrains.com/products/roboroach.
[2] TC Marzullo, GJ Gage. The SpikerBox: A Low Cost, Open-Source BioAmplifier for Increasing Public Participation in Neuroscience Inquiry. PLoS ONE 10.1371/journal.pone.0030837 (2012).
[3] Backyard Brains. The RoboRoach. https://www.kickstarter.com/projects/backyardbrains/the-roboroach-control-a-living-insect-from-your-sm. Acesso em 16 de março (2018).
Como citar este artigo: Marco Túlio Chella. Equipamentos de baixo custo para popularizar neurociência. Saense. http://www.saense.com.br/2018/03/equipamentos-de-baixo-custo-para-popularizar-neurociencia/. Publicado em 19 de março (2018).