ESO
14/03/2018
O MATISSE (Multi AperTure mid-Infrared SpectroScopic Experiment) observa radiação infravermelha — luz nos comprimentos de onda do espectro electromagnético entre o visível e as microondas, de 3 a 13 micrometros (µm) [1]. Trata-se de um espectro-interferômetro de segunda geração para o Very Large Telescope do ESO, que tira partido dos telescópios múltiplos e da natureza ondulatória da luz. Deste modo, fornece-nos imagens de objetos celestes mais detalhadas do que as que podem ser obtidas com qualquer telescópio simples que exista ou esteja a ser planejado para estes comprimentos de onda.
Após 12 anos de desenvolvimento realizado por um enorme número de engenheiros e astrônomos na França, Alemanha, Áustria, Holanda e no ESO, e na sequência de um extenso período de trabalhos de instalação e testes, as observações iniciais com este instrumento muito complexo confirmaram que o MATISSE está trabalhando dentro das expectativas [2].
As observações iniciais do MATISSE da estrela supergigante vermelha Betelgeuse, que se prevê que exploda sob a forma de supernova dentro de algumas centenas de milhares de anos, mostraram que esta estrela ainda tem segredos por revelar [3]. As novas observações mostram que a estrela aparenta ter diferentes tamanhos a diferentes comprimentos de onda. Tais dados permitirão aos astrônomos estudar de forma mais aprofundada os arredores da enorme estrela e como é que o seu material está sendo jogado para o espaço interestelar.
O pesquisador principal do MATISSE, Bruno Lopez (Observatoire de la Côte d’Azur (OCA), Nice, França), explica o seu poder único: “Os telescópios simples conseguem atingir uma nitidez de imagem que está limitada pelo tamanho dos seus espelhos. Para obter resoluções ainda maiores, combinamos — ou fazemos interferir — a luz coletada pelos 4 diferentes telescópios do VLT, o que permite ao MATISSE fornecer-nos as imagens mais nítidas já obtidas por um telescópio no intervalo de comprimentos de onda de 3-13 μm, região do espectro electromagnético que irá complementar as futuras observações obtidas a partir do espaço pelo Telescópio Espacial James Webb.”
O MATISSE contribuirá para diversas áreas de investigação fundamental em astronomia, focando-se em particular nas regiões internas dos discos que rodeiam as estrelas jovens, onde se formam os planetas, no estudo de estrelas em diferentes fases da sua vida, e nos arredores de buracos negros supermassivos situados nos centros das galáxias.
Thomas Henning, diretor do Instituto Max Planck de Astronomia (MPIA), em Heidelberg, na Alemanha, e co-investigador principal do MATISSE, comenta: “Ao utilizarmos o MATISSE para observar as regiões internas dos discos protoplanetários, esperamos aprender mais sobre a origem dos vários minerais contidos nestes discos — minerais estes que irão posteriormente formar os núcleos sólidos de planetas como a Terra.”
Walter Jaffe, cientista de projeto e co-investigador principal do instrumento, da Universidade de Leiden, na Holanda, e Gerd Weigelt, também co-investigador principal, do Instituto Max Planck de Rádio Astronomia (MPIfR), em Bonn, na Alemanha, acrescentam: “O MATISSE irá fornecer imagens de regiões de formação planetária, estrelas múltiplas e, quando operar com os Telescópios Principais do VLT, poderemos ver também os discos poeirentos que “alimentam” os buracos negros supermassivos. Esperamos também observar detalhes de objetos exóticos do nosso Sistema Solar, tais como vulcões em Io, e as atmosferas de exoplanetas gigantes.”
O MATISSE é um combinador de feixes de quatro direções, o que significa que combina a luz coletada por até quatro dos Telescópios Principais de 8,2 metros do VLT ou até quatro dos Telescópios Auxiliares que compõem o VLTI, obtendo tanto imagens como espectros. Deste modo, o MATISSE e o VLTI em conjunto possuem o poder coletor de um telescópio com até 200 metros de diâmetro, capaz de produzir as imagens mais detalhadas até hoje no infravermelho médio.
Os testes iniciais foram executados com os Telescópios Auxiliares, estando planejadas observações adicionais com os quatro Telescópios Principais do VLT nos próximos meses.
O MATISSE faz a sobreposição da luz de um objeto astronômico a partir da luz combinada de telescópios múltiplos, o que resulta num padrão de interferência que contém informação sobre a aparência do objeto e a partir do qual pode depois ser reconstruída uma imagem.
A primeira luz do MATISSE assinala um enorme passo à frente para os atuais interferômetros ópticos/infravermelhos e permitirá aos astrônomos obter imagens interferométricas com maiores detalhes ao longo dum maior intervalo de comprimentos de onda do que atualmente possível. O MATISSE complementará ainda os instrumentos planejados para o futuro Extremely Large Telescope do ESO (ELT), em particular o METIS (the Mid-infrared ELT Imager and Spectrograph). O MATISSE observará objetos mais brilhantes que o METIS, mas atingirá maior resolução espacial.
Andreas Glindemann, gestor de projeto do MATISSE no ESO, conclui: “Tornar o MATISSE uma realidade foi o trabalho de muitas pessoas ao longo de muitos anos e é maravilhoso ver o instrumento trabalhando tão bem. Estamos ansiosos para ver a ciência que aí virá!” [4]
[1] O MATISSE foi concebido, financiado e construído, em estreita colaboração com o ESO, por um consórcio composto por institutos na França (INSU-CNRS em Paris e OCA em Nice, que acolheram a equipe de pesquisadores principais), Alemanha (MPIA, MPIfR e Universidade de Kiel), Holanda (NOVA e Universidade de Leiden) e Áustria (Universidade de Viena). O Observatório Konkoly e a Universidade de Colonha também deram apoio na fabricação do instrumento.
[2] Com o MATISSE, o último instrumento do complemento de instrumentos de segunda geração para o VLT/VLTI chegou finalmente ao Paranal. Para o VLTI este marco assinala 17 anos — quase ao dia certo — após a obtenção das primeiras franjas de interferência com o VINCI e dois siderostatos. A primeira geração de instrumentos foi agora substituída pelos PIONIER, GRAVITY e MATISSE, instrumentos que combinam quatro telescópios (UTs ou ATs) e que em conjunto cobrem um grande domínio de comprimentos de onda no infravermelho (de 1,6 a 13 µm). O MATISSE é o primeiro interferômetro a trabalhar no infravermelho médio que pode ser usado para reconstruir imagens.
[3] Betelgeuse foi a primeira estrela a ser resolvida por interferometria por Michelson e Pease em 1920. Foi também usada como uma estrela brilhante de teste por interferômetros percursores a operar no infravermelho médio — incluindo o MIDI no VLTI.
[4] Esta notícia científica foi traduzida por Margarida Serote (Portugal) e adaptada para o português brasileiro por Gustavo Rojas.
Como citar esta notícia científica: ESO. Primeira luz do instrumento MATISSE montado no Interferômetro do Very Large Telescope do ESO. Tradução de Margarida Serote e Gustavo Rojas. Saense. http://www.saense.com.br/2018/03/primeira-luz-do-instrumento-matisse-montado-no-interferometro-do-very-large-telescope-do-eso/. Publicado em 14 de março (2018).