ESO
02/08/2018

Imagem composta da CK Vulpeculae — os restos de uma colisão de estrela dupla. [1]
Uma equipe, liderada por Tomasz Kamiński (Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics, Cambridge, EUA), usou o Atacama Large Millimeter/submillimeter Array (ALMA) e o NOrthern Extended Millimeter Array (NOEMA) para detectar uma fonte do isótopo radioativo de alumínio-26. A fonte, conhecida por CK Vulpeculae, foi inicialmente observada em 1670 e na época aparecia no céu como uma “estrela nova”, brilhante e vermelha. Apesar de inicialmente poder ser vista a olho nu, rapidamente enfraqueceu e atualmente são necessários telescópios potentes para observar os restos desta fusão: uma estrela central pouco brilhante rodeada por um halo de matéria brilhante que se afasta da estrela.

348 anos após a observação do evento inicial, os restos desta fusão estelar explosiva levaram à detecção clara e convincente de uma versão de alumínio radioativo, chamado alumínio-26. Trata-se da primeira molécula radioativa instável claramente detectada fora do Sistema Solar. Os isótopos radioativos têm um excesso de energia nuclear e decaem eventualmente para um estado estável.

Esta primeira observação deste isótopo num objeto do tipo estelar é também importante no contexto mais amplo da evolução química galática,” diz Kamiński. “Esta é a primeira vez que identificamos diretamente um produtor ativo do nuclídeo radioativo de alumínio-26.

Kamiński e a sua equipe detectaram uma assinatura espectral única de moléculas compostas por alumínio-26 e flúor (26AlF) nos restos que rodeiam CK Vulpeculae, situada a cerca de 2000 anos-luz de distância da Terra. À medida que giram e se deslocam no espaço, estas moléculas emitem uma “impressão digital” específica nos comprimentos de onda milimétricos, um processo conhecido por transição rotacional. Os astrônomos consideram este procedimento padrão para a detecção de moléculas [2].

A observação deste isótopo particular fornece-nos novas pistas sobre o processo de fusão que deu origem à CK Vulpeculae e demonstra também que as camadas interiores, densas e profundas, de uma estrela onde os elementos pesados e os isótopos radioativos são formados, podem agitar-se e ser lançadas para o espaço por colisões estelares.

Estamos a observar as “entranhas” de uma estrela destruída por uma colisão há cerca de três séculos atrás,” comenta Kamiński.

Os astrônomos determinaram também que as duas estrelas que se fundiram possuíam uma massa relativamente pequena, sendo uma delas uma gigante vermelha de massa entre 0,8 e 2,5 massas solares.

Uma vez que é radioativo, o alumínio-26 decai, tornando-se mais estável, e nesse processo um dos prótons do núcleo decai para um nêutron. Nesse momento, o núcleo excitado emite um fóton de elevada energia, o qual observamos sob a forma de um raio gama [3].

Anteriormente, detecções de emissões de raios gama mostraram que se encontram presentes na Via Láctea cerca de duas massas solares de alumínio-26, mas o processo que deu origem a estes átomos radioativos não era conhecido. Adicionalmente, devido à maneira como são detectados os raios gama, a sua origem precisa era também algo relativamente desconhecido. Com estas novas medições, os astrônomos detectaram definitivamente e pela primeira vez um radioisótopo instável numa molécula fora do Sistema Solar.

No entanto, e paralelamente, a equipe concluiu que a produção de alumínio-26 por objetos semelhantes à CK Vulpeculae não será a fonte principal de alumínio-26 na nossa Galáxia. A massa de alumínio-26 existente na CK Vulpeculae é aproximadamente um quarto da massa de Plutão e, dado que estes eventos ocorrem tão raramente, é altamente improvável que sejam os únicos produtores deste isótopo na Via Láctea, o que nos leva a realizar estudos adicionais sobre estas moléculas radioativas. [4] [5]

[1] Crédito da imagem: ALMA (ESO/NAOJ/NRAO), T. Kamiński; Gemini, NOAO/AURA/NSF; NRAO/AUI/NSF, B. Saxton.

[2] As características “impressões digitais” moleculares são normalmente obtidas em experiências de laboratório. No caso do 26AlF, este método não pode ser aplicado uma vez que o alumínio-26 não existe na Terra. Astrofísicos trabalhando em laboratórios na Universidade de Kassel, na Alemanha, usaram por isso dados das moléculas estáveis e abundantes de 27AlF para derivar dados precisos da molécula rara 26AlF.

[3] O alumínio-26 contém 13 prótons e 13 nêutrons no seu núcleo (um nêutron a menos do que o isótopo estável, o alumínio-27). Quando decai, o alumínio-26 transforma-se em magnésio-26, um elemento completamente diferente.

[4] Este trabalho foi descrito no artigo científico intitulado “Astronomical detection of a radioactive molecule 26AIF in a remnant of an ancient explosion”, publicado na revista Nature Astronomy.

[5] Esta notícia científica foi traduzida por Margarida Serote (Portugal) e adaptada para o português brasileiro por Gustavo Rojas.

Como citar esta notícia científica: ESO. Primeira molécula radioativa detectada fora do Sistema Solar. Tradução de Margarida Serote e Gustavo Rojas. Saense. http://www.saense.com.br/2018/08/primeira-molecula-radioativa-detectada-fora-do-sistema-solar/. Publicado em 02 de agosto (2018).

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