Embrapa
15/10/2020

Plantio de soja afetada por nematoide Pratylenchus (Foto: Waldir Pereira Dias)

Como em qualquer doença de plantas, para que as nematoses provoquem danos há necessidade da conjunção de três fatores básicos: densidade populacional do nematoide (patógeno) agressivo ou virulento, suscetibilidade ou intolerância da planta, e ocorrência de condições ambientais favoráveis à doença. O quanto cada um desses fatores contribui para a ocorrência de danos depende de cada caso.

Para várias espécies de nematoides, a densidade populacional no momento do plantio de culturas anuais (Pi) é um fator preponderante para a ocorrência de danos. Exemplos disso são observados com o nematoide de cisto da soja ou com o nematoide de galhas em algodoeiro. Ambos são influenciados pela combinação raça (virulenta) – variedade (suscetível) e pelo ambiente (textura e fertilidade do solo, temperatura e outros), mas a contribuição da densidade populacional desses nematoides para a ocorrência de danos é fundamental. Para essas e outras espécies de comportamento semelhante, práticas de manejo que visem à redução da densidade populacional do nematoide são altamente recomendadas. Assim, o uso de rotação ou sucessão com culturas não hospedeiras, o pousio, o cultivo de variedades resistentes (que não permitem a multiplicação do nematoide) e o uso de produtos nematicidas são geralmente empregados com resultados satisfatórios.

Na esteira das situações acima expostas, veio a generalização e certa “vulgarização” do conceito de que o Fator de Reprodução (ou simplesmente FR, que representa a variação da densidade populacional de uma determinada espécie de nematoide no tempo) seria o principal elemento a ser considerado para a definição da estratégia de manejo. Não raro, cultivares de soja, algodão, milho ou culturas de cobertura (incluídas as gramíneas forrageiras) passaram a ser caracterizadas pelo FR, ou seja, pela capacidade de permitir ou não a multiplicação do nematoide em suas raízes e, por consequência, serem mais adequadas para o plantio em áreas infestadas. O FR é realmente importante em muitos casos, porém não é suficiente.

Há nematoides que são muito mais dependentes de condições ambientais específicas para causarem danos. Usualmente são tidos como patógenos de importância secundária, mas que sob determinadas condições passam a ser altamente danosos.

Um bom exemplo parece ser o que estamos vivenciando com o nematoide Pratylenchus brachyurus nas culturas de soja e algodão.

P. brachyurus, que há pouco tempo era considerado um nematoide secundário em culturas anuais, passou a representar uma das principais preocupações de produtores do Brasil-Central, tanto pela frequência de ocorrência e ampla distribuição, quanto pelos expressivos danos que tem causado.

O que teria levado esta espécie a estar causando danos de tão grande monta?

A resposta parece estar relacionada a outros fatores que não a alta densidade populacional. Trabalhos realizados por várias instituições têm evidenciado a dificuldade em se estabelecer clara relação entre a densidade populacional de P. brachyurus e os danos (redução de produtividade) em cultivos de espécies anuais, principalmente soja e algodão. Há, contudo, um forte indicativo de que, mesmo em populações baixas, sob determinadas condições ambientais desfavoráveis à cultura, esse nematoide cause danos. Ou seja, as condições ambientais desfavoráveis são a oportunidade de ação do nematoide, por isso o termo oportunista é empregado para qualificá-lo.

 Dentre as várias condições já identificadas como favorecedoras de danos, as reconhecidamente mais importantes são: a) compactação (adensamento) do solo na camada de 0,10 a 0,20m; b) solos com baixo teor de argila (arenosos); c) solos com baixa umidade gravimétrica; d) solos mais ácidos ou com teores de cálcio abaixo dos níveis críticos. É importante ressaltar que tais condições não necessariamente favorecem a reprodução de P. brachyurus. Ou seja, para o caso deste nematoide, mais do que a densidade populacional, fatores do solo adversos ao desenvolvimento das plantas são fundamentais para a ocorrência de danos. O FR não é preponderante.

Para P. brachyurus, ou outras espécies que apresentem comportamento semelhante, práticas de manejo do solo passam a ter maior importância que o manejo do nematoide per si. O uso de culturas com sistemas radiculares agressivos (tais como várias gramíneas forrageiras ou nabo forrageiro) em rotação ou sucessão, a manutenção de cobertura vegetal (palha) permanente para a manutenção da umidade do solo e a adequada fertilidade do solo estão entre as principais estratégias de manejo. Práticas que visem apenas a redução da população do nematoide podem não ser tão eficientes, além de serem menos duradouras.

Em resumo, P. brachyurus é um nematoide tido como de importância secundária, mas está presente na grande maioria das áreas agrícolas do Brasil-Central e oportuniza-se de condições ambientais adversas para causar danos consideráveis a culturas anuais. Sistemas ou modelos de produção conduzidos em tais condições são potencialmente destinados a apresentarem problemas com este nematoide. [1]

[1] Artigo de Guilherme Lafourcade Asmus (Pesquisador da Embrapa Agropecuária Oeste).

Como citar este artigo: Embrapa. Pratylenchus, o nematoide oportunista.  Texto de Guilherme Lafourcade Asmus. Saense. https://saense.com.br/2020/10/pratylenchus-o-nematoide-oportunista/. Publicado em 15 de outubro (2020).

Notícias da Embrapa     Home