UFRGS
17/10/2022

O problema da infertilidade é hoje uma realidade para muitas pessoas que desejam constituir uma família. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 190 milhões de pessoas ao redor do mundo sofrem com esse problema, afetando aproximadamente 50 milhões de casais. No Brasil, a estimativa é de que atinja os 8 milhões de indivíduos.
Tendo em vista esses números, uma tese de doutorado do Programa de Pós-graduação em Ciências Biológicas: Bioquímica da UFRGS criou métodos para conseguir auxiliar as clínicas de reprodução assistida na escolha dos melhores óvulos das pacientes. A pesquisa gerou, além de cinco artigos em periódicos internacionais, o teste de software Ostera Test e uma startup operacional, a Ostera. A ferramenta busca aumentar as taxas de sucesso do processo de reprodução assistida, que, hoje, ficam em torno de 30%.
A infertilidade é a inaptidão que um casal possui após um ano de tentativas falhas para engravidar, impactando 15% dos pares em idade reprodutiva e 30% em países subdesenvolvidos. Na pesquisa, a autora Lucia Meirelles identificou componentes distintos dos processos celulares, do metabolismo e das defesas antioxidantes das células do Cumulus, que têm a função de coordenar o desenvolvimento folicular e a proteção do oócito, que dá origem ao óvulo. Como esse material é rico em informações biológicas sobre a condição do oócito, é possível antecipar métodos e tecnologias aplicáveis ao ambiente clínico para conseguir, então, auxiliar pacientes em tratamento de reprodução assistida.
Após a coleta de 223 amostras de células de Cumulus humanas, a pesquisadora trabalhou em diferentes cenários in vitro (em laboratório) e in vivo (em organismos vivos) para identificar pontos determinantes para o desenvolvimento do oócito. Outro objetivo foi encontrar marcadores prognósticos de qualidade, isto é, características que permitem identificar as melhores células.
O modelo que consegue prever a qualidade oocitária trabalha analisando níveis de expressão gênica de 25 genes-alvo selecionados. Subsequentemente avaliados pelo software, esses dados ajudam a formar um “ranking” dos melhores oócitos de cada paciente.
Os testes mostraram que o projeto, por meio desse parecer dos oócitos da paciente, é capaz de antecipar a qualidade do embrião que será formado depois da fertilização in vitro. A pesquisadora chegou a uma acurácia média de 84% para indicar a capacidade de os embriões se desenvolverem até a próxima etapa do processo embrionário. Dessa forma, a ferramenta auxilia na escolha do melhor embrião para ser transferido ao útero.
Mudanças clínicas com o uso da Ostera
Lucia conta que, nas clínicas de reprodução assistida, as pacientes realizam uma estimulação para a produção de óvulos, para que, a partir disso, os médicos analisem os gametas. “A gente não pode transferir tantos embriões do útero materno porque é um risco muito grande de uma gestação gemelar (mais de um feto)”, conta a pesquisadora. “Falta uma ferramenta que auxilie o embriologista na identificação [do potencial do embrião], para que não seja só visual. E o que o Ostera Test faz é exatamente isso”, acrescenta.
Outro objetivo da startup é evitar que pacientes mantenham os óvulos congelados por anos sem ter a certeza do potencial de seus possíveis futuros embriões. Dessa forma, se poderia saber desde o início do processo a probabilidade de aquela célula ter sucesso de se tornar uma gestação futura.
Lucia alega que seu trabalho pode abrir portas para novos estudos desse segmento, como, por exemplo, a continuação da elucidação dos processos biológicos do folículo ovariano e da fertilidade feminina.
“A reprodução assistida humana é uma área muito recente. A primeira pessoa que nasceu por meio de uma técnica dessas tem hoje cerca de quarenta anos. Por ser uma área nova, temos também muito campo para mais pesquisas”
Lucia Meirelles
Hoje um ciclo de fertilização assistida custa cerca de 20 mil reais, e são necessários, em média, quatro ciclos para se conseguir uma gestação. Já o custo do processo da Ostera é de 4 mil reais por ciclo. “É justamente nisso que queremos auxiliar: abreviar esse tempo e esse esforço, com menos ciclos”, ressalta a pesquisadora. “Um casal em média vai gastar 100 mil reais para ter um filho, o que é completamente inatingível para a maioria da população”, completa. Com a diminuição de ciclos possibilitada pelo Ostera, a fila de espera por tratamentos de reprodução assistida no Sistema Único de Saúde – que fica entre 3 e 5 anos – também deve diminuir.
Para a pesquisadora, a falta de informação aos pacientes sobre infertilidade e potencial reprodutivo é um dos pontos que impactam na saúde reprodutiva da população. “A maioria das mulheres com 35, 40 anos está começando a pensar em ter filhos, mas para a biologia do sistema reprodutor isso é muito ruim, porque ele já está em involução”, diz. “A informação precisa ser uma ferramenta potente”, complementa. [2]
[1] Foto: Cidacs/Fiocruz-Bahia.
[2] Texto de Gabhriel Giordani.
Como citar esta notícia: UFRGS. Estudo cria ferramenta que pode reduzir custos e agilizar o processo de reprodução assistida. Texto de Gabhriel Giordani. Saense. https://saense.com.br/2022/10/estudo-cria-ferramenta-que-pode-reduzir-custos-e-agilizar-o-processo-de-reproducao-assistida/. Publicado em 17 de outubro (2022).