Agência FAPESP
25/06/2024

Fator genético influencia resistência do tambaqui a parasita intestinal
Após confirmar a presença dos ovos nos tanques de experimentação, os tambaquis a serem testados foram liberados para que a infecção ocorresse naturalmente (foto: John Fredy Gomez Agudelo)

Agência FAPESP* – Um experimento inédito com tambaquis demonstrou que a resistência a parasitas intestinais tem base genética. Esse achado abre o horizonte para a seleção de um plantel de animais mais resistentes à parasitose, ajudando os piscicultores a evitar prejuízos causados pelo baixo peso dos peixes ao final do ciclo de produção. Atualmente, a produção do peixe amazônico tambaqui (Colossoma macropomum) tem papel importante na aquicultura da região Norte e é a segunda espécie em produção no Brasil, atrás apenas da tilápia.

Divulgada na revista Aquaculture, a pesquisa envolveu grupos da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Jaboticabal e da Universidade Nilton Lins (Manaus, AM), além de colaboradores internacionais. Foi apoiada pela FAPESP por meio de um edital lançado em parceria com a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam).

Os pesquisadores abordaram duas características da infecção: resistência, ou seja, o número total de parasitas no tambaqui; e resiliência, que é a capacidade do peixe de continuar crescendo mesmo com a infecção. “Nós vimos que animais de determinadas linhagens eram mais resistentes ou mais resilientes ao parasita. Encontramos animais com 300, 400 acantocéfalos no intestino e outros com apenas dez ou 20 parasitas. Os exemplares com poucos parasitas eram aparentados, o que sugeriu um componente genético nesta resistência”, explica Diogo Hashimoto, do Centro de Aquicultura da Unesp de Jaboticabal.

A parasitose provocada pelo acantocéfalo Neoechinorhynchus buttnerae não representa perigo para humanos. Primeiramente, porque se trata de um parasita cujo hospedeiro definitivo é exclusivamente o tambaqui e o hospedeiro intermediário é um zooplâncton. Além disso, o parasita se instala no intestino do peixe, parte que não é comercializada para consumo humano. Mesmo não sendo uma zoonose, a doença é de grande interesse do ponto de vista zootécnico, pois, além de prejudicar o bem-estar animal, causa grandes prejuízos financeiros para o produtor. O parasita N. buttnerae ocorre naturalmente em tambaquis de vida livre nos rios amazônicos e, geralmente, não causa efeitos graves. Entretanto, em sistemas de confinamento com falhas nas medidas de biosseguridade, cria-se uma condição para a proliferação do parasita e seus ovos, favorecendo a reinfecção do peixe. “Para o produtor, a acantocefalose significa grande impacto no crescimento, no desempenho produtivo e, consequentemente, na renda”, explica Gustavo Valladão, da Universidade Nilton Lins. Estima-se que 70% a 80% dos custos de produção de peixes sejam com ração. A infecção por acantocefalose representa desperdício de recursos, já que os peixes se alimentam normalmente, mas não convertem isso em ganho de peso. Um estudo anterior apontou que os animais infectados com acantocéfalos são 300% menores que os não infectados.


Acantocéfalo Neoechinorhynchus buttnerae (foto: John Fredy Gomez Agudelo)

Experimento inovador

Os pesquisadores desenvolveram um experimento inovador para testar a resistência dos peixes ao parasita. Para isso, utilizaram uma população de tambaquis livres de acantocéfalos, oriunda de São Paulo e do Amazonas, e outra previamente diagnosticada com acantocefalose. Os tambaquis infectados foram usados para liberar ovos do parasita no ambiente onde seria realizado o experimento. Após confirmar a presença dos ovos nos tanques de experimentação, os tambaquis a serem testados foram liberados para que a infecção ocorresse naturalmente. Durante 60 dias, monitorou-se o ganho de peso dos peixes para avaliar a resiliência durante a infestação e a quantidade de parasitas em cada peixe ao final do período para medir a resistência.

Os pesquisadores constataram que os peixes geneticamente mais resistentes e resilientes tinham parentesco, indicando que esses atributos possuem componentes genéticos transmissíveis aos descendentes. Isso significa que tais características podem ser alvo de seleção para melhoramento genético. “É possível selecionar peixes que sejam bons tanto em resistir quanto em suportar a doença, garantindo um desempenho produtivo razoável em sistemas de produção”, explica Hashimoto. Ele acrescenta que “esses resultados sugerem que a seleção genética dos melhores peixes pode ajudar a reduzir o impacto da doença na aquicultura”.

Outro aspecto que os pesquisadores pretendem avançar é com o processo de seleção genética para acantocefalose. “Atualmente, precisamos sacrificar o peixe para determinar se ele é resistente ou resiliente à parasitose. Para evitar a perda de boas matrizes com genética superior, estamos desenvolvendo uma ferramenta de seleção genômica baseada em marcadores de DNA”, explica Hashimoto. Com apenas um pequeno pedaço da nadadeira, será possível identificar a resistência e resiliência do peixe à parasitose. Essa ferramenta molecular, de baixo custo, em breve estará disponível para uso rotineiro na cadeia produtiva do tambaqui.

Enquanto o plantel de tambaquis mais resistentes e resilientes à acantocefalose ainda está em desenvolvimento, Valladão explica que existem formas complementares de evitar a doença nas pisciculturas. “Primeiramente, é essencial garantir uma fonte de água livre de acantocéfalos; em segundo lugar, adquirir um plantel certificado como livre de acantocéfalos; e, por fim, realizar regularmente a assepsia sanitária caso algumas das medidas anteriores falhem”, conclui Valladão.

O artigo Genetic parameters for host-response to acanthocephaliasis caused by the endoparasite Neoechinorhynchus buttnerae in the Amazon fish Colossoma macropomum pode ser lido em: www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0044848623013078?via%3Dihub.

* Com informações da Assessoria de Comunicação do Programa de Pós-Graduação em Aquicultura da Unesp Jaboticabal..

Como citar este texto: Agência FAPESP. Fator genético influencia resistência do tambaqui a parasita intestinal. Saense. https://saense.com.br/2024/06/fator-genetico-influencia-resistencia-do-tambaqui-a-parasita-intestinal/. Publicado em 25 de junho (2024).

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