Josué Modesto dos Passos Subrinho
14/05/2025

Redução da matrícula nas escolas públicas pode ser uma boa notícia
Foto: Joel Rodrigues/ Agência Brasília (Flickr, CC by 2.0)

A cada ano a divulgação dos resultados do Censo Escolar traz dificuldades para a imprensa e para os especialistas convocados para explicar aos leigos os principais resultados e tendências captados pelo levantamento realizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas e Estudos Educacionais Anisio Teixeira (INEP).

Um dos aspectos que certamente chama a atenção dos leitores é a redução da matrícula, especialmente quando localizada nas redes públicas. Neste caso, além de suscitar a curiosidade e, talvez alguma preocupação, entre os leigos, acirra disputas políticas entre especialistas, comunidade de educadores, organizações sociais e gestores públicos.

A divulgação da Sinopse Estatística do Censo Escolar 2024, pelo INEP, reacendeu esse debate. Embora tenha sido acompanhada de uma nota técnica bem elaborada pelos especialistas do instituto, a repercussão maior se concentrou, no Brasil e em Sergipe, na questão da redução da matrícula.

É muito difícil para um leigo, especialmente se ele for mais idoso e, possivelmente, passou por alguma experiência de disputar vagas em escolas públicas, para si mesmo ou para parentes ou, ao menos, testemunhou cenas de escassez e disputa por vagas em escolas não associar redução de matrículas a decadência da educação pública.

O propósito deste artigo é demonstrar que nem sempre a redução das matrículas em escolas públicas é uma má notícia. Vamos utilizar vários dados antes de chegarmos na questão do comportamento da matrícula. Os dados utilizados têm como foco principal o estado de Sergipe.

Apesar da importância dos dados do Censo Escolar, na medida que captam apenas o universo dos estudantes vinculados às escolas, eles não respondem diretamente às indagações sobre o percentual da escolarização de crianças e jovens que deveriam estar matriculados na educação básica, conforme a legislação brasileira vigente.

Para termos uma visão de médio e longo prazo sobre a escolarização, devemos em primeiro lugar examinar o comportamento da população sergipana, conforme a tabela abaixo.

Os dados da projeção do crescimento da população sergipana fornecidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) respaldam a afirmação de alguns especialistas da área da educação acerca do potencial de redução da demanda por vagas na educação básica, com o transcorrer dos anos. Conforme pode ser visto na tabela 1, não obstante a população total sergipana continue crescendo – entre os anos 2000 e 2030 se projeta um crescimento de quase 39% — nas faixas etárias adequadas à matrícula na educação básica não há crescimento, mas sim redução da população. A redução máxima prevista ocorrerá na faixa etária de 0 a 4 anos (-24,1%) e a mínima na faixa etária de 15 a 19 anos (-13,9%) evidenciando que a queda da fecundidade tem se acentuado com o passar dos anos.

Portanto não se justificam as expectativas de crescimento da matrícula que aprendemos a projetar entre as décadas de 1960 e 1970, quando vigoravam debates acerca dos benefícios e riscos do grande crescimento demográfico que o Brasil vinha apresentando. A realidade que vivemos, pelo menos desde o início do século XXI, é de redução acentuada da taxa de natalidade, com cada vez menores participações das faixas etárias de crianças e jovens na população total.

Há uma dúvida que pode persistir. Não obstante a redução já verificada na população sergipana em idade escolar e a projeção de manutenção dessa tendência, a oferta de vagas tem sido suficiente para manter e ampliar a taxa de escolarização? Utilizaremos outros dados do IBGE para responder a esta questão.

Os dados da taxa de escolarização da população por faixa etária, os quais expressam a razão entre o número de estudantes de determinada faixa etária e o total de pessoas da mesma faixa etária, são apresentados na tabela 2, para os anos de 2016, 2019 e 2023. A fonte é a pesquisa nacional por amostra de domicílios continua anual (PNAD-C), sob responsabilidade do IBGE. Um dos questionários capta nos domicílios a população frequentando escolas, por faixa etária.

Observando-se todos os grupos de idade, consta-se um comportamento ligeiramente mais favorável à escolarização da população em Sergipe quando comparado com o Brasil. Em Sergipe, ao contrário do que se verifica no Brasil, há um contínuo crescimento da taxa de escolarização de 29,2 %, em 2016, 29,3%, em 2019, e finalmente, 30,2%, em 2023.

Quando examinamos os dados por faixas etárias podemos ter uma visão mais clara sobre as taxas de escolarização da população em idade escolar. Na faixa de 0 a 5 anos de idade, tanto no ano 2016, quanto no ano de 2019, a taxa de escolarização em Sergipe foi menor que a análoga no Brasil, porém apresentando um crescimento mais acentuado que o observado nacionalmente, levando, em 2023 a um resultado (60,4%) superior ao alcançado pelo Brasil (58%) no mesmo ano.

A faixa etária de 0 a 5 anos de idade foi desdobrada em duas: a primeira de 0 a 3 anos de idade, adequada para a matrícula das crianças em creche. Esta ainda não é de frequência obrigatória, havendo apenas uma meta fixada pelo Plano Nacional de Educação 2014-2024 (PNE) que prevê 50% das crianças matriculadas. O Monitoramento das metas do PNE, pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) constatam que a meta não será alcançada e mais ainda, que os indicadores de matrícula são inferiores exatamente nos grupos que deveriam prioritariamente ser atendidos, como os mais vulneráveis economicamente, os sujeitos à discriminação racial e as populações rurais. A relativamente menor matrícula em creche das crianças oriundas desses grupos reforçam as baixas perspectivas de sucesso educacional deles. [1]

Os dados agregados da matrícula na faixa etária de 0 a 3 anos repetem o comportamento já exposto para a escolarização na faixa etária de 0 a 5 anos. Isto é, Sergipe em 2016 e em 2019 apresentou taxas de escolarização inferiores à brasileira, mas no ano de 2023 conseguiu superar o percentual atingido pelo Brasil, com taxas de 38,8% e 38,7%, respectivamente.

Na faixa etária de 4 a 5 anos de idade há uma expectativa de que as crianças sejam matriculadas na pré-escola. Esta etapa se tornou obrigatória desde 2009 e sua oferta, no âmbito público, compete aos municípios. [2]  Conforme podemos ver na Tabela 2, no ano de 2016 a taxa de escolarização em Sergipe, nesta faixa etária, foi ligeiramente inferior à do Brasil (89,3% e 90%, respectivamente), mas tanto em 2019 quanto em 2023 esteve acima do percentual atingido pelo Brasil, com perspectivas de alcançar a universalização da matrícula.

A faixa etária de 6 a 14 anos, hoje equivalente ao ensino fundamental, dividido em anos iniciais e anos finais, é a de obrigatoriedade relativamente mais antiga. Desde 1971, o então chamado ensino de primeiro grau passou a ser obrigatório. Como se sabe, a escolarização no Brasil foi muito tardia em relação aos países desenvolvidos e mesmo em relação a alguns países da América Latina. A obrigatoriedade e gratuidade do ensino público primário de quatro anos só foram estabelecidas na Constituição Federal de 1946.  O ponto a ressaltar é a relativamente mais antiga obrigatoriedade e expansão da matrícula em redes públicas, incialmente após os 7 anos de idade e posteriormente após os 6 anos, variando as denominações do que hoje corresponde ao ensino fundamental. Em Sergipe, com defasagens em relação a alguns estados brasileiros, tivemos a expansão da matrícula tendendo a universalização, conforme os dados da tabela 2, tratando do período mais recente. [3]

Em 2016, a taxa de escolarização em Sergipe, na faixa etária de 6 a 14 anos era ligeiramente maior que a brasileira (99,4% e 99,2% respectivamente). Em 2019, tanto em Sergipe quanto no Brasil há uma pequena oscilação na taxa de escolarização, mais intensa em Sergipe levando a uma inversão de posições, o Brasil fica com uma taxa ligeiramente superior à de Sergipe. Finalmente, em 2023, se repete a situação, mas o ponto a destacar é que tanto em Sergipe quanto no Brasil a taxa de escolarização para a faixa etária de 6 a 14 anos se aproxima da universalização, com Sergipe chegando a 99,3% e o Brasil a 99,4%.

Na faixa etária de 15 a 17 anos de idade a taxa de escolarização em Sergipe, em 2016, é inferior à do Brasil (85,8% e 86,9% respectivamente). Em 2019, as taxas de escolarização nessa faixa etária, tanto para Sergipe quanto para o Brasil apresentam crescimento e a posição relativa é mantida. Em 2023, o crescimento relativamente mais rápido na taxa de escolarização de Sergipe leva a uma inversão das posições relativas:  Sergipe com 92,3% e o Brasil com 91,9%. Ou seja, tanto em Sergipe quanto no Brasil como um todo, entre 2016 e 2023, houve um importante crescimento na taxa de escolarização indicando uma trajetória que reforça a tendência à universalização da escolarização na faixa etária.

A já mencionada PNAD-C do IBGE apresenta uma outra tabela interessante para os estudos da situação educacional da população. Trata-se da taxa ajustada de frequência escolar líquida, por faixa etária ideal por curso frequentado. A diferença entre a anterior, que relaciona o total de matriculados em escolas com a população total de determinada faixa etária, é que nesta nova tabela se relaciona o total de matriculados na etapa educacional ideal para a faixa etária. Dito de outra, a faixa etária ideal para frequentar os anos iniciais do ensino fundamental é de 6 a 10 anos idade, situação que se verificaria se o estudante ingressou na idade prevista no ensino fundamental e foi aprovado em todos os anos escolares, concluindo a etapa com 10 anos de idade. Com 11 anos de idade, ele ingressaria nos anos finais do ensino fundamental e o concluiria com 14 anos. Aos 15 anos ingressaria no ensino médio e o concluiria com 17 anos de idade. Esta situação de vínculo a uma etapa de escolarização na faixa etária ideal é por vezes identificada como taxa líquida de matrícula da etapa. Vejamos os dados na tabela 3.

Na educação infantil (creche e pré-escola) não há avaliação de desempenho e, portanto, não há reprovação. A criança frequenta a etapa conforme a idade. No ensino fundamental começa o sistema de avaliação e de reprovação de estudantes, portanto começa a aparecer a diferença entre a taxa de escolarização da faixa etária e a taxa de frequência líquida.

Como se pode ver na tabela 3, Sergipe apresentou taxas ajustadas de frequência escolar líquidas acima das taxas do Brasil, em 2016, para todo o ensino fundamental (idade de 6 a 14 anos) e anos iniciais do ensino fundamental (idade de 6 a 10 anos). Nos anos de 2019 e 2023 as taxas sergipanas ficam abaixo das taxas brasileiras. Quanto aos anos finais do ensino fundamental, em 2016 a taxa sergipana (76,1%) já era consideravelmente menor do que a brasileira (84,8%) e assim permanecem em 2019 e 2023, não obstante o crescimento da taxa sergipana.

É no ensino médio que a discrepâncias entre as taxas ajustadas de frequência escolar líquida de Sergipe e do Brasil ficam mais evidentes. Em 2016 a taxa sergipana foi de 50,9% e a do Brasil de 68,2%. Em 2019 a situação foi agravada, visto que a taxa sergipana regrediu em relação a 2016 para 47,6% e a brasileira cresceu para 71,3%. Em 2023, possivelmente com a grande contribuição da aprovação automática adotada nos anos de 2020 e 2021 e do programa de correção de fluxo adotado pela Secretaria Estadual da Educação a partir de 2019 e por alguns municípios, a taxa sergipana chegou 66%, ainda consideravelmente abaixo da brasileira, de 75%. Os resultados da melhoria do fluxo de estudantes no ensino fundamental se refletiram no percentual de jovens que iniciam e permanecem no ensino médio. Em 2016, Sergipe tinha a menor taxa ajustada de frequência escolar líquida no grupo de idade entre 15 e 17 anos entre todas as unidades da Federação. Em 2023, o estado era o quarto colocado entre as unidades da Federação com menores taxas e a terceira unidade em incremento de pontos percentuais na taxa ajustada de frequência escolar, no grupo de idade entre 15 e 17 anos, no período 2016-2023.

É importante compararmos os dados da tabela 2 com os da tabela 3. Vejamos que em 2023, conforme pode ser visto na tabela 2, 92,3% dos jovens sergipanos de 15 a 17 anos estavam frequentando a escola, na tabela 3, entretanto podemos ver que apenas 66% dos jovens sergipanos estavam matriculados no ensino médio. Essa significativa diferença representa os estudantes que continuavam matriculados, mas não etapa e na série escolar ideal, eles continuavam no ensino fundamental. Isto se repete no Brasil como um todo, mas em proporções menores. Como se pode notar na tabela 2, em 2023, 91,9% dos jovens de 15 a 17 anos frequentavam a escola e 75% estavam matriculados no ensino médio, conforme a tabela 3. [4]

Nossos sistemas educacionais, diferentemente do que ocorre nos países desenvolvidos, produzem estudantes repetentes da série escolar e estudantes que abandonam a escola, entre outras razões, por não se sentirem estimulados a aprender. Vejamos o que dizem os números sobre reprovação e abandono escolar. [5]

Os dados da tabela 4 demonstram a persistência das taxas de reprovação dos estudantes no Brasil como um todo e no estado de Sergipe, com maior intensidade. Reprovações sistemáticas de estudantes caracterizam os sistemas educacionais dos países menos desenvolvidos e de alguns de médio desenvolvimento, entre os quais o Brasil. Há que se notar, contudo, que as taxas de reprovação têm apresentado uma tendência de declínio tanto no Brasil quanto em Sergipe. Nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, por exemplo, no ano de 2016, a taxa de reprovação para o Brasil era de 6,8%, enquanto em Sergipe era de 15%. No ano de 2023, a taxa de reprovação para o Brasil, nos anos iniciais do ensino fundamental era de 2,9% e em Sergipe de 5,3%. Deve-se ressaltar a gravidade das elevadas taxas de reprovação, em Sergipe, em 2016, nos anos iniciais do ensino fundamental. Sergipe ocupou a primeira posição entre todos os estados brasileiros, com a maior taxa de reprovação. Em, 2023, quando a taxa se reduz a 5,3%, houve uma melhora relativa: Sergipe passou a ocupar o sétimo lugar entre os estados com maior taxa de reprovação. [6]

O problema da reprovação escolar se agrava na etapa seguinte: anos finais do ensino fundamental. Nessa etapa, conforme pode ser constatado na tabela 4, a taxa de reprovação, no ano de 2016, foi de 12,7% para o Brasil e de 27,6% para Sergipe. Apesar desses níveis elevadíssimos de reprovação, há uma tendência de redução das taxas. Em 2023, por exemplo, a taxa de reprovação para o Brasil, nos anos finais do ensino fundamental foi de 5,4% e em Sergipe de 13,5%. Não obstante a redução da taxa de reprovação nos anos finais do ensino fundamental, Sergipe era, em 2016, o estado com a mais elevada taxa de reprovação e, em 2023, passou a ser o segundo entre os estados com as maiores taxas de reprovação, nesta etapa.

Vejamos a situação quando analisamos as taxas de reprovação no ensino médio, conforme a tabela 5.

Persistem as características e tendências verificadas no ensino fundamental. De um lado a tendência de declínio das taxas de reprovação entre os anos de 2016 e 2023 e por outro lado a permanente superioridade das taxas de reprovação em Sergipe quando comparadas com as do Brasil nos mesmos anos. Possivelmente o problema das elevadíssimas taxas de reprovação que caracterizam o ensino fundamental em Sergipe teve uma resolução parcial, com melhoria relativa na classificação entre os estados que mais reprovam, isto porque as taxas continuam acima das do Brasil como um todo. Em 2016, a taxa de reprovação no ensino médio, em Sergipe, era a sétima mais elevada entre todos os estados brasileiros e, em 2023, era a oitava mais elevada entre todos os estados brasileiros.

Uma das consequências de taxas elevadas de reprovação que perpassam todas os anos e séries do ensino fundamental e do ensino médio é a tendência de parte dos estudantes abandonarem a escola, não obstante a previsão legal de obrigatoriedade da escolarização. Vejamos os dados.

Em 2016, 2,6% das crianças sergipanas matriculadas, nos anos iniciais do ensino fundamental, em escolas das redes públicas, abandonaram a escola. Para o Brasil como um todo, a taxa de abandono, na mesma etapa e condições foi de 1,1%. Sergipe ocupou então o quarto lugar entre os estados com mais elevadas taxas de abandono escolar para esta etapa. A redução das taxas de abandono nos anos iniciais do ensino fundamental foi significativa tanto para o Brasil quanto para Sergipe, conforme se pode ver na tabela 6. Em 2023, Sergipe passou a ocupar o décimo primeiro lugar entre os estados com maiores taxas de abandono. Ainda são necessários estudos específicos sobre as razões dessa redução nas taxas de abandono, por ora se pode especular acerca da importância das campanhas massivas de permanência das crianças na escola desenvolvidas com o apoio do UNICEF.

Nos anos finais do ensino fundamental as taxas de abandono são mais expressivas, tanto no Brasil quanto em Sergipe. Em 2016, a taxa de abandono no Brasil era de 3,5% e em Sergipe de 8,1%, que colocava o Estado na quarta posição entre os estados com maiores taxas de abandono, nesta etapa. Em 2023, a taxa de abandono no Brasil era de 1,4% e em Sergipe de 2,1%, levando o estado para a oitava posição entre os com maiores taxas anuais de abandono escolar para essa etapa.

Vejamos finalmente a situação do abandono escolar, na última etapa da educação básica, o ensino médio.

Há uma parcela importante da população jovem que nem sequer se matricula no ensino médio, especialmente entre os segmentos sociais de menores rendas e os historicamente discriminados. Entre os que ingressam no ensino médio, a taxa de abandono é maior do que no ensino fundamental, conforme se pode ver na tabela 7, tanto no Brasil quanto em Sergipe. Em 2016, a taxa de abandono no Brasil era de 7,5% e em Sergipe de 14,3%, quase o dobro da taxa brasileira, colocando o Estado em quarto lugar entre os estados brasileiros com as maiores taxas de abandono. Em 2023, a taxa de abandono para o Brasil foi reduzida a 3,8% e a de Sergipe a 3%, conseguindo o feito de ficar abaixo da taxa brasileira, invertendo uma tendência que vinha se verificando entre as etapas anteriores. Neste caso, deve-se ressaltar que Sergipe está entre os estados com as menores taxas de abandono, localizando-se na décima primeira posição entre os estados com menores taxas de abandono. Os estados com as menores taxas de abandono, Pará, Paraná, Goiás, Pernambuco e Espírito Santo são os que têm apresentado os melhores índices de aprendizagem nas últimas avaliações do Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB). [7]

Uma vez que foi examinada a tendência à redução da população sergipana em idade escolar verificada nos últimos anos e com projeção de continuidade da tendência, que foram apresentados os dados da escolarização da população total sergipana e por faixas etárias, bem como as taxas líquidas de matrícula nas faixas etárias adequadas às etapas de escolarização, que foram vistas as taxas de reprovação e de abandono escolar se pode, finalmente, apresentar os dados da matrícula na educação básica sergipana, nas redes públicas.

Entre 2016 e 2024, a matrícula na educação básica sergipana, considerando as redes públicas, foi reduzida em 4,7%. Seria possível aceitar como explicação os efeitos da redução da população em idade escolar comprovada pelo IBGE. A desagregação da matrícula total por etapas e modalidades da educação básica mostra, entretanto, uma realidade mais matizada.

Considerando as etapas do ensino regular, pode-se ver que há um expressivo crescimento da matrícula em creche (106,4%), etapa de escolarização ainda não obrigatória. A meta do PNE é atingir, até 2024, 50% das crianças com idade de zero a três anos matriculadas. Essa meta provavelmente não será atingida no Brasil e em Sergipe, mas o crescimento da matrícula tem sido expressivo, havendo ainda possibilidades de continuidade de expansão da matrícula tendo em vista os objetivos de maximizá-la, especialmente entre a população mais carente.

Quanto à pré-escola, etapa de escolarização obrigatória, houve um crescimento de 1,7%% na matrícula, entre 2016 e 2024. Apesar do possível efeito da redução da população na faixa etária de 4 a 5 anos, ideal para a escolarização nesta etapa, pode-se lançar mão de outro dado para controle da segurança de informação, a taxa de escolarização, apresentada na tabela 2. Segundo esses dados, em 2016, Sergipe apresentava uma taxa de escolarização ligeiramente abaixo da nacional (89,3% e 90%, respectivamente), mas no transcorrer dos anos, se obtive maior sucesso que a média nacional na matrícula das crianças na pré-escola. Assim sendo, em 2023, 96,8% das crianças, em Sergipe, estavam matriculadas na pré-escola enquanto no Brasil se chegava a 92,9%. Este é o fator que pode explicar o discreto crescimento da matrícula, não havendo perspectivas de crescimento significativo dela, visto estar se aproximando da universalização, nesta etapa.

No ensino fundamental, tanto nos anos iniciais quanto nos anos finais há uma redução importante nas matrículas entre 2016 e 2024. Para os anos iniciais a redução foi de 18,9% e para os anos finais a redução foi de 8,0%. A expressiva redução da matrícula nos anos iniciais do ensino fundamental não pode ser explicada totalmente pela redução da população na faixa etária de 6 a 10 anos, a ideal para essa etapa escolar. Os dados do IBGE, expostos na tabela 1, indicam para o período 2020-2030 uma redução de 9,2% na faixa etária de 5 a 9 anos. Ou seja, não obstante a não perfeita coincidência de faixas etárias e tempo, pode-se verificar que há uma diferença considerável nos percentuais de redução da população na faixa etária de escolarização nos anos iniciais do ensino fundamental e na matrícula registrada entre os anos de 2016 e 2024. Portanto, deve haver outras explicações para a redução na matrícula, além da própria redução populacional.

Deve-se afastar a hipótese de redução da taxa de escolarização, isto é do percentual de crianças matriculadas na faixa etária para explicar a redução na matrícula. Na tabela 2, constata-se que a taxa de escolarização na faixa etária de 6 a 14 anos foi de 99,4%, em 2016 e 99,3%, em 2023. Ou seja, do ponto de vista do efeito estatístico parece ser irrelevante a não matrícula das crianças no ensino fundamental. O que não está assegurado, uma vez matriculada a criança é que ela tenha uma aprendizagem adequada e uma trajetória tranquila de progressão entre os anos escolares. O baixo nível de aprendizagem, mensurado pelos sistemas oficiais de avaliação educacional, as reprovações e abandono da escola permeiam a trajetória de parte dos matriculados nas redes públicas.

O efeito da persistência de elevadas taxas de reprovação é o inchaço da matrícula para além do nível previsto pela população na faixa etária adequada. Na tabela 4, constata-se que 15% das crianças matriculadas nos anos iniciais do ensino fundamental, nas redes públicas sergipanas foram reprovadas, em 2016. Como praticamente todas permanecem matriculadas, e como as reprovações se sucedem ano a ano, o total da matrícula vai sendo inflada, não apenas pela chegada de novos estudantes na etapa educacional, mas também pela retenção de parte deles.

Outro efeito é representado pelo desalento das crianças e adolescentes e dos seus familiares quanto à baixa aprendizagem e as reprovações. Uma parte termina abandonando a escola, mesmo que esta não seja uma decisão mantida para sempre. Na tabela 6, se constata que 2,6% das crianças matriculadas nos anos iniciais do ensino fundamental, em Sergipe, nas redes públicas abandonaram a escola no ano de 2016. O efeito sobre o total da matrícula é o contrário do efeito da taxa de reprovação, ou seja, há uma diminuição na matrícula total pelo abandono de uma parte dos estudantes.

Há que se enfatizar que ambas as taxas, a de reprovação e a de abandono escolar apresentaram reduções significativas nas redes públicas sergipanas, não obstante ainda permanecerem acima das taxas verificadas no Brasil. Em 2016, a taxa de reprovação, nos anos iniciais do ensino fundamental, nas redes públicas sergipanas foi de 15%, em 2016, passando para 5,3% em 2023. Quanto às taxas de abandono, para a mesma etapa e redes educacionais, passou de 2,6%, em, 2016 para 0,4% em 2023. Observe-se que se a taxa de abandono fosse equivalente, a cada ano, à taxa de reprovação o efeito líquido sobre o crescimento da matrícula seria nulo. Como a taxa de reprovação sempre foi maior que a taxa de abandono, havia um efeito líquido de crescimento da matrícula.

A redução da matrícula total que se constata ultimamente, nos anos iniciais do ensino fundamental, se deve, portanto aos seguintes fatores:

a) redução da população na faixa etária de 6 a 10 anos;

b) redução da taxa de reprovação;

A redução da taxa de abandono tem um efeito de elevação da matrícula, mas tem ocorrido em um nível que não é capaz de anular as duas componentes anteriores.

As mesmas componentes que foram observadas para impactar o comportamento da matrícula nos anos iniciais do ensino fundamental, se verificam nos anos finais do ensino fundamental, em graus diferentes. Conforme pode ser visto na tabela 8 a matrícula nos anos finais do ensino fundamental nas redes públicas sergipanas foi reduzida em 8,0% entre 2016 e 2023.

O efeito da redução da população na faixa etária de 11 a 14 anos deve ser contado como uma das explicações para a redução da matrícula total. Não se deve imaginar um efeito de baixa significativa na taxa de escolarização para explicar a redução, já que, como pode ser visto na tabela 2, entre 2016 e 2023 a taxa de escolarização, na faixa etária mais ampla de 6 a 14 anos, ficou praticamente estável, no nível elevado de 99,4% e 99,3%, respectivamente.

Quanto ao funcionamento das redes públicas sergipanas, no período de 2016 a 2023, a taxa de reprovação, nos anos finais do ensino fundamental, passou de 27,6% para 13,5%, respectivamente. Já se mencionou o quanto é elevado, mesmo para os padrões brasileiros, esses níveis de reprovação. Parece inconcebível para observadores externos um sistema educacional que produz tanto fracasso escolar. Uma consequência óbvia de tão elevada taxa de reprovação é o inchaço da matrícula para abrigar simultaneamente estudantes em idade-série adequada e estudantes repetentes.

Parte desses estudantes, alguns dos quais se aproximando da idade adulta, abandonam a escola. Em Sergipe, nessa etapa, nas redes públicas a taxa de abandono, em 2016 era de 8,1%, passando para 2,1%, em 2023. A redução da matrícula nas redes públicas sergipanas, nos anos finais do ensino fundamental, entre os anos de 2016 e 2024, portanto, se deve aos mesmos fatores observados nos anos iniciais do ensino fundamental:

 a) impacto da redução da população em idade escolar na faixa etária;

b) com maior importância, a redução das taxas de reprovação de 27,6% para 13,5%.

A redução da taxa de abandono, no mesmo período de 8,1% para 2,1% tem um efeito de aumentar a matrícula ao manter os estudantes vinculados à escola. Esse percentual, entretanto, não foi suficiente para anular o impacto da redução mais expressiva das taxas de reprovação, no mesmo período.

Em síntese: pode-se caracterizar o comportamento da matrícula nas redes públicas sergipanas, no período 2016-2024 da seguinte forma:

1) As etapas e modalidade que tiveram aumento da matrícula e isto é muito positivo do ponto de vista educacional:

1.1) O crescimento das matrículas em Creche e Pré-Escola, nas quais não há reprovação escolar. Enquanto não extrapolar os limites estabelecidos pela população da faixa etária correspondente, representa um resgate importante da dívida histórica com segmentos populacionais mais carentes e excluídos;

1.2) O crescimento da matrícula na Educação Profissional e Técnica, atendendo uma demanda de jovens e adultos por uma educação que viabilize uma inserção mais favorável no mercado de trabalho;

1.3) O crescimento da matrícula no Ensino Médio. Não obstante o efeito da redução da população na faixa etária entre Sergipe 15 e 19 anos mensurada pelo IBGE, o crescimento da matrícula em Sergipe, no período 2016-2024 se deve à redução da taxa de reprovação no ensino fundamental que permite que um número crescente de adolescentes sergipanos ingresse e permaneça no ensino médio. A redução na taxa de abandono no ensino médio também contribuiu para o crescimento recente na matrícula nesta etapa.

2) As etapas que tiveram redução da matrícula e isso é muito positivo do ponto de vista educacional. Representadas pelo ensino fundamental. As elevadíssimas taxas de reprovação inflam a matrícula e terminam provocando o abandono escolar. Apresentamos dados para comprovar que não há evidências de um problema de oferta de vagas nas redes públicas sergipanas para essa etapa, tanto nos anos iniciais quanto nos anos finais. A redução das taxas de abandono tem um efeito de crescimento da matrícula, mas a continuidade e possível aceleração do processo de redução das taxas de reprovação provocarão novas reduções na matrícula nesta etapa. Isto é uma boa notícia.

      3) A redução na matrícula na modalidade educação de jovens e adultos é preocupante, na medida em que há uma população adulta que ou não foi escolarizada na idade adequada ou aprendeu muito pouco. Há em curso novas tentativas de adequar os projetos pedagógicos às necessidades e interesses do público-alvo e medidas para melhorar o financiamento da modalidade.

      A participação do ensino fundamental no total da matrícula da educação básica provavelmente determinará por alguns anos a redução da matrícula total na educação básica sergipana. O importante sempre será verificar em que etapa e modalidade está ocorrendo aumentos ou diminuições de matrícula e se preparar para entender em que circunstâncias estas variações da matrícula podem ser uma boa notícia para a educação.

      [1] INEP. Relatório do 5º. Ciclo de monitoramento de metas do plano nacional de educação:2024. Disponível em: chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://download.inep.gov.br/publicacoes/institucionais/plano_nacional_de_educacao/relatorio_do_quinto_ciclo_de_monitoramento_das_metas_do_plano_nacional_de_educacao.pdf. Acesso em 12.05.2025.

      [2] Emenda Constitucional 59/2009 de 11 de novembro de 2009. Disponível em : https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc59.htm2009. Acesso em 06.05.2025.

      [3] Lei N. 5.692 de 11 de agosto de 1971. Fixa Diretrizes e Bases para o ensino de 1° e 2º graus, e dá outras providências. Disponível em: https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1970-1979/lei-5692-11-agosto-1971-357752-publicacaooriginal-1-pl.html. Acesso em 06.05.2025. Sobre a obrigatoriedade do chamado ensino primário, vide: Savério, Esméria de Lourdes e Tenreiro, Marida Odete. Escolarização obrigatória no Brasil: aspectos históricos e constitucionais. Disponível em: chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://ri.uepg.br/riuepg/bitstream/handle/123456789/824/EVENTO_Escolariza%C3%A7%C3%A3oObrigatoria.pdf?sequence=1#:~:text=A%20emenda%20constitucional%20059/2009,tiveram%20acesso%20na%20idade%20pr%C3%B3pria%E2%80%9D. Acesso em 06.05.2025.

      [4] Cf. Claudio Macedo.  A distorção do atraso escolar. Saense. https://saense.com.br/2023/03/a-distorcao-do-atraso-escolar/. Publicado em 14 de março (2023). Acesso em 11.05.2025.

      [5] Cf. Claudio Macedo. A contraproducente reprovação escolar. Saense. https://saense.com.br/2023/09/a-contraproducente-reprovacao-escolar/. Publicado em 21 de setembro (2023). Acesso em 11.05.2025.

      [6] INEP. Taxas de rendimento. Disponível em: https://www.gov.br/inep/pt-br/acesso-a-informacao/dados-abertos/indicadores-educacionais/taxas-de-rendimento-escolar. Acesso em 10.05.2025.

      [7] INEP. Disponível em: https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiMGVjMzIwZWQtM2IzZS00NmE0LTkwNjUtZjI1YjMyNTVhZGY0IiwidCI6IjI2ZjczODk3LWM4Y. Acesso em 10.05.2025.

      Como citar este artigo: Josué Modesto dos Passos Subrinho. Redução da matrícula nas escolas públicas pode ser uma boa notícia. Saense. https://saense.com.br/2025/05/reducao-da-matricula-nas-escolas-publicas-pode-ser-uma-boa-noticia/. Publicado em 14 de maio (2025).

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