Marcelo M. Guimarães
09/10/2016
Até o início do século XXI os únicos locais onde havia água no Sistema Solar, segundo nosso conhecimento, eram na Terra e nos cometas que regularmente visitam nossa vizinhança. É claro que desconfiávamos da existência de água em outros lugares, por exemplo em cometas e corpos gelados nos confins do cinturão de Kuiper e na nuvem de Oort. Mas a medida que nosso conhecimento sobre os nossos vizinhos foi aumentando, percebemos que a água é uma substância abundante.
Comecemos com Marte. Graças às sucessivas e bem sucedidas missões ao planeta vermelho [2], conseguimos descobrir a existência de água no planeta vermelho sob a forma de gelo e durante o verão marciano sob a forma líquida. Diversas rochas marcianas foram formadas na presença de água e hoje podemos dizer que no passado, Marte foi coberto com oceanos.
Movendo um pouco mais além, encontramos Ceres, o único planeta-anão na parte interna do Sistema Solar, situado entre as órbitas de Marte e Júpiter. Recentemente a NASA conseguiu enviar a sonda Dawn [3] para Ceres, revelando um objeto cheio de surpresas e peculiaridades. Talvez a maior surpresa tenha sido um conjunto de manchas brilhantes na superfície de Ceres, cuja origem até o momento permanecem um mistério, mas desconfia-se de gelo de água e sais. Nesse pequeno mundo os vulcões não são feitos de lava, mas de gelo.
Prosseguindo em direção ao Sistema Solar exterior, chegamos a Júpiter e suas dezenas de satélites naturais. Há algumas semanas, a NASA revelou indícios de que o telescópio Hubble conseguiu observar jatos de vapor de água sendo ejetados da lua Europa [4], reforçando ainda mais a possibilidade de existência de um oceano abaixo da sua superfície congelada. Indícios desse oceano surgiram há muitos anos graças às observações de fendas e rachaduras na superfície de Europa.
Passemos para o próximo gigante gasoso, Saturno. A sonda Cassini [5], que ainda está orbitando Saturno, nos revelou um sistema belíssimo e nos trouxe surpresas incríveis. Titã, a maior lua de Saturno, possui oceanos de metano e outros compostos orgânicos. Seu relevo é esculpido por chuvas e rios de metano, que graças à temperatura de Titã, encontra-se próximo de seu ponto triplo. Assim como a água, o metano também possui um ponto triplo de temperatura e pressão, no qual as fases sólida, líquida e gasosa coexistem. Se em Titã o metano corre em forma de rios, o gelo de água é tão duro quanto rocha e cobre a superfície. Enquanto estudava as luas de Saturno, a Cassini fez um descoberta incrível, jatos de vapor de água sendo ejetados da lua Enceladus. Grandes plumas saem da superfície e atingem altas altitudes, ricas em água e compostos orgânicos. Há poucos dias a equipe da Cassini informou que a lua Dione também possui jatos de água sendo ejetados da superfície.
Continuando nossa jornada para os confins do Sistema Solar, vamos saltar Netuno e Urano, pois possuímos poucas informações desses planetas e de suas luas. Ainda não tivemos nenhum missão dedicada a estudar os dois últimos gigantes gasosos do nosso sistema. Chegamos então a Plutão, o mais representativo dos planetas-anões, e suas 5 luas; Caronte, Styx, Nix, Cérberos e Hidra. Caronte tem metade do tamanho de Plutão e cerca de 10% de sua massa, fazendo com que o centro de massa do sistema Plutão-Caronte esteja fora de Plutão, em outras palavras, Plutão e Caronte valsam em torno do centro de massa, exercendo forças de maré um no outro continuamente. A missão New Horizons [6], que passou por Plutão no ano passado, mudou completamente o nosso entendimento sobre esse objeto. No lugar de uma superfície congelada e morta fomos surpreendidos com uma superfície dinâmica, mutável, onde icebergs gigantes de gelo de água flutuam e se movem em uma superfície de nitrogênio. A eterna dança de Plutão e Caronte fornece energia suficiente para que seu interior não esteja completamente congelado, o que provoca a renovação da sua superfície, graças a vulcões de gelo e provavelmente um oceano de água sob sua superfície.
Duas décadas de exploração espacial foram suficientes para nos mostrar que a substância essencial para a nossa vida, a água, é comum no Sistema Solar e provavelmente é comum em outros sistemas estelares. O que as próximas duas décadas nos reservam?
[1] Crédito da imagem: Silver Blue (Flickr) / Creative Commons (CC BY-SA 2.0). URL: https://www.flickr.com/photos/cblue98/7203788448/.
[2] NASA. Mars Exploration. URL: http://mars.nasa.gov. Acesso: 08 de outubro (2016).
[3] NASA. Dawn. URL: http://dawn.jpl.nasa.gov. Acesso: 08 de outubro (2016).
[4] NASA. NASA’s Hubble Spots Possible Water Plumes Erupting on Jupiter’s Moon Europa. URL: http://www.nasa.gov/press-release/nasa-s-hubble-spots-possible-water-plumes-erupting-on-jupiters-moon-europa. Publicado em 26 de setembro (2016).
[5] NASA. Cassini. URL: https://saturn.jpl.nasa.gov. Acesso: 08 de outubro (2016).
[6] NASA. New Horizons. URL: http://pluto.jhuapl.edu. Acesso: 08 de outubro (2016).
Como citar este artigo: Marcelo M. Guimarães. A Abundância de água no Sistema Solar. Saense. URL: http://www.saense.com.br/2016/10/a-abundancia-de-agua-no-sistema-solar/. Publicado em 09 de outubro (2016).