Jornal da USP
16/12/2024
Países estão sujeitos a eventos de desestabilização o tempo todo. Crises, guerras e até pandemias são capazes de afetar a economia e o bem-estar da população. Ainda que se sintam os efeitos das flutuações dos ciclos econômicos – associados a períodos de expansão e recessão –, muitos governos implementam políticas de suavização, como políticas de seguro-desemprego, para que os impactos de crises financeiras não cheguem totalmente aos cidadãos.
Pesquisadores da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA-RP) da USP desenvolveram uma metodologia para estimar o custo de bem-estar dos consumidores em diferentes cenários, considerando que os dados de consumo coletados são influenciados pelas políticas econômicas em vigor. Os resultados mostraram que um aumento equivalente a 11% no consumo das famílias seria capaz de suprir as necessidades totais das políticas de estabilização.
O trabalho consistiu em comparar uma economia real com economias “contrafactuais”, ou seja, economias fictícias com diferentes níveis de políticas de estabilização ou suavização. A partir dessa contraposição de mundos, foi possível mensurar os ganhos e as perdas de bem-estar a partir de cada contexto.
Um dos diferenciais da pesquisa é que, além da proposição de um cenário nulo de incertezas geradas por ciclos econômicos, os cientistas analisaram o contexto da ausência total de políticas de suavizações. “Quando construímos uma economia pior, conseguimos calcular também quanto o consumidor [do mundo real] já ganhou em termos de bem-estar”, diz Fernando Barros Jr., professor na FEA-RP e integrante da pesquisa, ao Jornal da USP.
Oscilações de consumo
Compreender o funcionamento e as consequências dos ciclos econômicos ao longo do tempo, considerando que todos os dados observados já são influenciados parcialmente por medidas de suavização, foi o primeiro passo do estudo. “Esses ciclos causam incerteza. Não sabemos exatamente o que acontecerá com a economia. E a incerteza reduz o bem-estar dos consumidores: se você soubesse tudo o que vai acontecer na sua vida, você não correria mais risco”, explica Fábio Gomes, diretor e professor titular da FEA-RP.
Por meio do desenvolvimento de um modelo matemático capaz de definir os diferentes graus de sucesso das políticas de suavização, o trabalho examinou as propriedades de cada economia que poderiam ser aplicadas a dados quantitativos. Fernando Barros Jr. comenta que o ponto de partida para a construção de uma boa base de dados na construção de cenários foi pensar em períodos históricos nos quais as medidas de estabilização de governos eram incipientes ou ausentes.
A compilação de informações de consumo feita pelos economistas da Universidade de Harvard Robert Barro e José Ursúa se mostrou adequada pela extensão e variedade de países analisados, entre eles os Estados Unidos – escolhido como foco da pesquisa pela disponibilidade de informações. “Pegamos dados de consumo que começam em 1834, com periodicidade anual, e usamos até 2019, que foi o ano pré-crise da covid, em que há uma perturbação muito grande da economia, e achamos melhor não considerar [dados dos anos seguintes]”, descreve Barros Jr.
A partir do mapeamento do período de políticas de estabilização incipientes, o grupo observou uma significativa diferença de oscilação de consumo entre antes e depois do fim da Segunda Guerra Mundial. A análise dos dados, combinada com testes estatísticos e estudos históricos do período, contribuíram para identificar o cenário econômico da época como um dos parâmetros de mudança a ser utilizado no trabalho. Segundo Barros Jr., é no período pós-guerra que, de fato, essas políticas ganharam corpo. “Os economistas passaram a entender mais sobre os ciclos econômicos e o governo passou a ter mais ação”, diz.
Um dos resultados de destaque do estudo foi que o custo de bem-estar das flutuações econômicas – migrando do pior até o melhor mundo contrafactual – seria equivalente a 11% do nível de consumo das famílias ao longo da vida.
“Bem-estar é uma coisa abstrata, precisamos buscar um meio de medir isso: o quanto temos que aumentar o seu consumo para você ficar igualmente satisfeito na pior e na melhor economia é 11%”
Fábio Gomes
Outro dado encontrado a partir da análise comparativa dos cenários econômicos é que a atual política econômica dos Estados Unidos já filtraria cerca de 70% dos choques, indicando uma política de suavização considerada bem-sucedida. Isso abre possibilidades de aplicações em outros cenários para além dos estudados.
“Uma vez que se consiga utilizar essa métrica de mensuração para diferentes países, posso entender o quão distante se está dos Estados Unidos em termos de grau da suavização”, completa Barros Jr. Os pesquisadores afirmam que acompanhar certas políticas implementadas no país norte-americano, partindo da metodologia de comparação desenvolvida, poderia auxiliar no aumento dos níveis de estabilização econômica de outros locais como o Brasil e países que ainda convivem com altas oscilações de consumo.
O artigo The welfare costs of business cycles unveiled: Measuring the extent of stabilization policies pode ser lido aqui.
Mais informações: e-mail fabiogomes@fearp.usp.br, com Fábio Gomes, e fabarrosjr@usp.br, Fernando Barros Jr. [1], [2]
[1] Texto de Fernanda Zibordi
[2] Publicação original: https://jornal.usp.br/ciencias/qual-o-custo-no-bem-estar-de-consumidores-em-diferentes-cenarios-de-estabilizacao-economica/
Como citar este texto: Jornal da USP. Qual o custo no bem-estar de consumidores em diferentes cenários de estabilização econômica? Texto de Fernanda Zibordi. Saense. https://saense.com.br/2024/12/qual-o-custo-no-bem-estar-de-consumidores-em-diferentes-cenarios-de-estabilizacao-economica/. Publicado em 16 de dezembro (2024).