Jornal da USP
27/05/2025

Não há só uma forma das células de defesa responderem a infecções
Neutrófilo (amarelo) libera uma armadilha extracelular de neutrófilos (verde) para capturar bactérias invasoras que infeccionam o organismo (roxas) -Foto: CHDENK – CC BY-SA 4.0

Os neutrófilos são células que formam a primeira linha de defesa do organismo contra vírus, bactérias e fungos, além de desempenharem um papel significativo na regulação da resposta inflamatória. Pesquisadores do Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid) Redoxoma, liderados pela professora Graziella Eliza Ronsein, do Instituto de Química (IQ) da USP, descobriram que essas células regulam sua resposta imunológica conforme o estímulo recebido, o qual indica a ameaça ao corpo.

Os neutrófilos empregam vários mecanismos para eliminar ameaças, como degranulação, fagocitose e a liberação de armadilhas extracelulares (NETs), estruturas formadas por DNA e proteínas microbicidas. Os cientistas pesquisaram a resposta a dois ativadores conhecidos, que fornecem os estímulos: PMA e ionomicina. E os resultados mostram que a ativação acontece por vias bioquímicas diferentes.

“Na literatura científica, todos os estímulos que os neutrófilos recebem são tratados da mesma forma, como se toda a reação fosse a mesma”, explica Graziella Eliza Ronsein. “Nosso estudo mostra que os neutrófilos reagem de modo diferente, dependendo do estímulo, e as consequências dessas respostas parecem ser bem distintas também.”

“Observamos que os peptídeos [proteínas pequenas] gerados pela ativação dos neutrófilos com ionomicina são muito semelhantes aos que se formam quando os neutrófilos interagem com certas toxinas bacterianas específicas”, afirmou a doutoranda Rafaela Oliveira Nascimento, primeira coautora do artigo publicado na revista Redox Biology. “E muitos desses peptídeos são encontrados atuando como autoantígenos envolvidos em doenças autoimunes, como a artrite reumatoide.”

Defesas

Uma estratégia bem conhecida da resposta imune envolve a produção rápida e em grande quantidade de espécies reativas, quando os neutrófilos são recrutados para o local afetado pela infecção. Os pesquisadores descobriram que apenas os neutrófilos ativados por PMA geram espécies reativas, enquanto aqueles estimulados por ionomicina não produzem essas moléculas.

A degranulação, outro mecanismo de defesa essencial, envolve a liberação de grânulos contendo enzimas tóxicas para as células invasoras (citotóxicas). Em um trabalho anterior, os pesquisadores desenvolveram um método para isolar os grânulos dos neutrófilos a partir de um pequeno volume de sangue e fornecer a caracterização dessas estruturas conforme as proteínas que sintetizam (proteômica). No estudo atual, a análise revelou que, enquanto o PMA provoca degranulação leve, a ionomicina induz degranulação maciça de grânulos primários e secundários.

Outra estratégia antimicrobiana crucial é a formação de armadilhas extracelulares de neutrófilos (NETs). Conforme os neutrófilos liberam NETs, eles passam por uma forma de morte celular conhecida como NETose, que pode ser desencadeada por vários estímulos. A pesquisa mostrou que tanto PMA quanto ionomicina induzem a formação de NETs, mas com diferenças significativas. A microscopia de células vivas revelou que a formação de NETs desencadeada por ionomicina ocorre muito mais rápido do que a induzida por PMA, indicando mecanismos distintos.

Mudanças

A pesquisa também revelou que a ionomicina promove uma modificação nas proteínas dos neutrófilos conhecida como citrulinação. Quando essa mudança acontece nas histonas, proteínas que organizam o DNA celular, acontece a formação de NETs por meio de um mecanismo independente de espécies reativas.

Muitas das proteínas citrulinadas detectadas neste trabalho foram previamente identificadas como autoantígenos em doenças autoimunes. Autoantígenos são moléculas próprias do organismo que causam reação imune. 

A liberação descontrolada de NETs é considerada uma fonte de autoantígenos e está associada a doenças autoimunes como artrite reumatoide e lúpus eritematoso sistêmico. Para os pesquisadores, este mecanismo de resposta dos neutrófilos pode desempenhar um papel no desenvolvimento de doenças autoimunes.

Em um estudo anterior, a equipe de Graziella Ronsein mapeou proteínas citrulinadas em neutrófilos ativados por ionomicina, identificando mudanças que precedem a formação de NETs. Como próximo passo, os pesquisadores planejam investigar como os neutrófilos respondem a estímulos mais brandos, como os fisiológicos, fornecendo mais indícios da regulação imunológica. “A ionomicina é um estímulo muito forte que remodela rapidamente as proteínas intracelulares”, diz Graziella.

O artigo Investigating Neutrophil Responses to Stimuli: Comparative Analysis of Reactive Species-dependent and Independent Mechanisms, de Lorenna Rocha Reis, Rafaela Oliveira Nascimento, Mariana Pereira Massafera, Paolo Di Mascio e Graziella Eliza Ronsein, pode ser lido aqui. A pesquisa teve apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

Mais informações: ronsein@iq.usp.br, com a professora Graziella Eliza Ronsein, e nrafaelaoliveira@usp.br, com Rafaela Oliveira Nascimento [1]

[1] Publicação original: https://jornal.usp.br/ciencias/nao-ha-uma-unica-forma-das-nossas-celulas-de-defesa-responderem-a-infeccoes/

Como citar este texto: Jornal da USP. Não há só uma forma das células de defesa responderem a infecções. Saense. https://saense.com.br/2025/05/nao-ha-so-uma-forma-das-celulas-de-defesa-responderem-a-infeccoes/. Publicado em 27 de maio (2025).

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