Luana Mendonça
20/06/2017
Aqueles que já tiveram contato com uma caravela-portuguesa encalhada na areia da praia ou que já ‘se queimaram’ com águas-vivas (medusas) devem imaginar como deve ser doloroso viver em constante contato com os tentáculos das anêmonas (que, por sinal, é o local que concentra maior quantidade de nematocistos). Mas como os peixes-palhaço vivem? Será que são masoquistas? Obviamente que não! Aparentemente esses animais produzem um muco em toda a epiderme, que os protegem 24 horas por dia das toxinas lançadas pelos nematocistos. Mas veja bem, a espessa camada de muco que esses peixes parecem produzir não neutralizam as toxinas, mas apenas impedem que elas penetrem a epiderme desses animais.
Bom, os peixes-palhaço são conhecidos por viverem entre as anêmonas, mas eles não se alimentam desses animais; sua dieta é composta de pequenos invertebrados, algas e plantas marinhas, dentre outros itens. Por outro lado, um pouco mais de 100 das 6.000 espécies de peixes que vivem nos corais (primos das anêmonas, só que com um esqueleto interno de carbonato de cálcio) são conhecidas por se alimentarem dos corais em que vivem. Essa habilidade de se alimentar de organismos tão tóxicos levou os pesquisadores Huertas e Bellwood da Universidade James Cook, na Austrália, a investigar o assunto.
Em um estudo recente realizados por esses dois [2] há o relato de como uma espécie de peixe (Labropsis australis) que se alimenta de coral (coralívoro) consegue fazer isso sem se ‘queimar’. O que os autores primeiro perceberam foi que o lábio desses peixes era diferente dos daqueles que vivem nos corais, mas não se alimentam deles (Figura 1). Os lábios da espécie Coris galmard, que usa os corais como refúgio e proteção, mas não se alimentam deles possuem lábios finos e lisos, com dentes ligeiramente salientes (Figura 1C). Já o lábio dos peixes de Labropsis australia são salientes e formam um tubo quando a boca está fechada, cobrindo todos os dentes (Figura 1D).
Eu acho que esses animais são a prova viva de que o ditado do título está muito correto: o que não nos mata só nos fortalece!
[1] Crédito da imagem: Magnus Johansson (Wikimedia Commons) / Creative Commons ( CC BY-SA 2.0). URL: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Finding_Nemo%3F_(13723694934).jpg.
[2] V Huertas & DR Bellwood. Mucus-secreting lips offer protection to suction-feeding corallivorous fishes. Current Biology 27, R399 (2017).
Como citar este artigo: Luana Mendonça. O que não nos mata só nos fortalece: adaptações de peixes para se alimentarem de corais. Saense. URL: http://www.saense.com.br/2017/06/o-que-nao-nos-mata-so-nos-fortalece-adaptacoes-de-peixes-para-se-alimentarem-de-corais/. Publicado em 20 de junho (2017).
Adorei!!!!
Muito esclarecedor. Vou utilizar o texto nas minhas aulas.
Obrigada!
Fico feliz em saber que você gostou e utilizará em suas aulas!
Muito obrigada pelo comentário!