Leonardo Nogueira Matos
26/08/2016
Nos anos 1990, a SBC (Sociedade Brasileira de Computação) iniciou um programa de incentivo a publicação de livros nas diversas subáreas da Computação, dando oportunidade para vários professores de universidades brasileiras divulgar o conhecimento em suas áreas disciplinares. Este programa, na sua concepção inicial, não durou muito tempo mas abriu oportunidade para publicação do livro de Inteligência Artificial [3] do professor Guilherme Bittencourt, da Universidade Federal de Santa Catarina. O livro, além de ter um bom conteúdo técnico, aborda as questões motivacionais de forma extremamente didática. Uma das seções, denominada “A alma material”, também traz à tona uma analogia entre o sistema natural e artificial, entre o cérebro e o computador, e compara ambos sob um prisma materialista, tal como no livro de Carl Sagan. No entanto, neste segundo, o autor vai mais além pois sugere que todo o conjunto de memórias, sentimentos e emoções, isto é, a própria alma e essência do ser possui uma representação material. Seríamos nós, então, um produto do que está programado em nossos sistemas neurais naturais? Isto põe sob outra perspectiva a dualidade entre corpo e espírito. Somos uma alma e temos um corpo, ou somos um corpo e temos uma alma?
Enquanto questões filosóficas dessa natureza não são resolvidas, a ciência segue inabalavelmente seu caminho. Existem em curso diversas pesquisas tratando da ligação entre os sistemas naturais e artificiais para processamento de dados, como próteses de membros que respondem aos comandos do pensamento, marca-passos que escutam o estímulo nervoso proveniente do cérebro e acionam a contração do músculo cardíaco, dentre outros que tem contribuído para melhorar a qualidade de vida de uma grande quantidade de pessoas. No bojo destas pesquisas, uma delas, particularmente interessante, foi divulgada recentemente no sítio de notícias na web da revista Exame [4]. Trata-se do armazenamento de um grande volume de dados em DNA sintético. Pesquisadores da Microsoft conseguiram armazenar em filamentos de DNA cerca de 200 MB de dados, o que incluía 100 clássicos da literatura e um vídeo da banda americana OK Go. Embora não sinalize o fim da era do silício na microeletrônica, nem o anúncio de que computadores terão alma no futuro, experimentos como este confirmam que máquinas para processamento de dados criadas pelo homem se aproximarão cada vez mais daquelas criadas pela natureza.
[1] Crédito da imagem: Chris Drumm (Flickr) / Creative Commons (CC BY 2.0). URL: https://www.flickr.com/photos/cdrummbks/3547872915/.
[2] C Sagan. Cosmos. Ballantine Books (1985).
[3] G Bittencourt. Inteligência Artificial: Ferramentas e Teorias. Editora da UFSC (1998).
[4] M Demartini. Microsoft consegue armazenar vídeos e livros em DNA humano. Exame. URL: http://exame.abril.com.br/tecnologia/noticias/microsoft-consegue-armazenar-videos-e-livros-em-dna-humano. Publicado em 10 de julho (2016).
Como citar este artigo: Leonardo Nogueira Matos. A alma material. Saense. URL: http://www.saense.com.br/2016/08/a-alma-material/. Publicado em 26 de agosto (2016).