ESA
11/04/2018
Uma equipe internacional de pesquisadores usando o Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA e vários outros observatórios descobriu, pela primeira vez, uma galáxia em nossa vizinhança cósmica que está perdendo a maior parte — se não toda — de sua matéria escura. Esta descoberta da galáxia NGC 1052-DF2 desafia as teorias atualmente aceitas de formação de galáxias e fornece novos insights sobre a natureza da matéria escura. Os resultados estão publicados na Nature.
Astrônomos usando o Hubble e vários observatórios terrestres encontraram um objeto astronômico único: uma galáxia que parece não conter quase nenhuma matéria escura [2]. O Hubble ajudou a confirmar com precisão a distância de NGC 1052-DF2 a 65 milhões de anos-luz e determinou seu tamanho e brilho. Com base nesses dados, a equipe descobriu que a NGC 1052-DF2 é maior que a Via Láctea, mas contém cerca de 250 vezes menos estrelas, levando-a a ser classificada como uma galáxia ultra-difusa.
“Passei uma hora apenas olhando para esta imagem”, disse o pesquisador-chefe Pieter van Dokkum, da Universidade de Yale, lembrando quando viu pela primeira vez a imagem do Hubble de NGC 1052-DF2. “Essa coisa é surpreendente: uma bolha gigantesca tão esparsa que você vê as galáxias por trás dela. É literalmente uma galáxia transparente.”
Outras medições das propriedades dinâmicas de dez aglomerados globulares orbitando a galáxia permitiram à equipe inferir um valor independente da massa das galáxias. Essa massa é comparável à massa das estrelas na galáxia, levando à conclusão de que NGC 1052-DF2 contém pelo menos 400 vezes menos matéria escura do que os astrônomos preveem para uma galáxia de sua massa, e possivelmente nenhuma mesmo [3] . Esta descoberta não é prevista pelas teorias atuais sobre a distribuição da matéria escura e sua influência na formação de galáxias.
“Acredita-se que a matéria escura é parte integrante de todas as galáxias — a cola que as une e os andaimes subjacentes sobre os quais são construídas”, explica a co-autora Allison Merritt da Yale University e do Instituto Max Planck de Astronomia, Alemanha. E van Dokkum acrescenta: “Esta substância invisível e misteriosa é de longe o aspecto mais dominante de qualquer galáxia. Encontrar uma galáxia sem nenhuma é completamente inesperado; ela desafia as ideias bem estabelecidas de como as galáxias funcionam.”
Merritt comenta: “Não há teoria que prevê esses tipos de galáxias — como você realmente forma uma dessas coisas é completamente desconhecido”.
Embora contraintuitivo, a existência de uma galáxia sem matéria escura nega teorias que tentam explicar o Universo sem que a matéria escura seja uma parte dele [4]: A descoberta da NGC 1052-DF2 demonstra que a matéria escura é de alguma forma separável das galáxias. Isso só é esperado se a matéria escura estiver ligada à matéria comum por meio da gravidade.
Enquanto isso, os pesquisadores já têm algumas idéias sobre como explicar a falta de matéria escura na NGC 1052-DF2. Será que um evento cataclísmico, como o nascimento de uma multidão de estrelas massivas, varreu todo o gás e a matéria escura? Ou o crescimento da enorme galáxia elíptica vizinha NGC 1052 bilhões de anos atrás desempenhou um papel na deficiência de matéria escura da NGC 1052-DF2?
Essas idéias, no entanto, ainda não explicam como essa galáxia se formou. Para encontrar uma explicação, a equipe já está à procura de mais galáxias deficientes em matéria escura ao analisar as imagens do Hubble de 23 galáxias ultra-difusas — três das quais parecem ser similares a NGC 1052-DF2. [5] [6]
[1] Crédito da imagem: NASA, ESA, P. van Dokkum (Yale University).
[2] A galáxia foi identificada com o Dragonfly Telephoto Array (DFA) e também observada pelo Sloan Digital Sky Survey (SDSS). Além do Telescópio Espacial Hubble da NASA/ESA, o Observatório Gemini e o Observatório Keck foram usados para estudar o objeto com mais detalhes.
[3] Desde 1884 os astrônomos invocaram a matéria escura para explicar por que as galáxias não se separam, dada a velocidade com que as estrelas dentro das galáxias se movem. A partir da Segunda Lei de Kepler, espera-se que as velocidades de rotação das estrelas diminuam com a distância do centro de uma galáxia. Isso não é observado.
[4] A teoria MOND — Modified Newtonian Dynamics (Dinâmica newtoniana modificada) — sugere que os fenômenos usualmente atribuídos à matéria escura podem ser explicados pela modificação das leis da gravidade. O resultado disso seria que uma assinatura usualmente atribuída à matéria escura deveria sempre ser detectada, e é uma consequência inevitável da presença de matéria comum.
[5] Os resultados foram publicados em um artigo intitulado “A galaxy lacking dark matter” no periódico Nature.
[6] Esta notícia científica foi traduzida por Claudio Macedo.
Como citar esta notícia científica: ESA. Hubble encontra galáxia sem matéria escura. Tradução de Claudio Macedo. Saense. http://www.saense.com.br/2018/04/hubble-encontra-galaxia-sem-materia-escura/. Publicado em 11 de abril (2018).