Eduardo Freire
16/04/2018

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Há uns 40 anos atrás Bill Gates (cofundador da Microsoft) profetizou que haveria um computador em cada mesa de cada lar. Hoje podemos ver crianças que ainda não sabem ler usando aplicativos em tablets e celulares. Os computadores estão ao alcance de qualquer pessoa, independentemente do grau de escolaridade que possua. Mas nem sempre foi assim.  Atualmente poucos sabem, e muito poucos passaram por isso, mas nos anos 1970 era muito difícil usar computadores. As pessoas que eram capazes de usá-los eram técnicos de nível superior muito especializados. Naquela época os computadores estavam ao alcance apenas de grandes empresas e universidades e não havia interface gráfica. Tudo tinha que ser feito através de linhas de comando digitadas pelos usuários. No final dos anos 1970 a Xerox criou o primeiro mouse e a primeira interface gráfica de usuário baseada em ícones, que foi rapidamente adaptada pela Apple no sistema operacional do seu famoso Machintosh, lançado em 1984. Algum tempo depois, a Microsoft criou a primeira versão do Windows, e assim as coisas foram evoluindo até o lançamento do iPhone em 2007 pela Apple, que levou a simplicidade da interface com o usuário a um novo patamar. O que era novidade há pouco mais de 10 anos atrás, agora é padrão, e qualquer celular, tablet ou computador é muito mais fácil de usar, e praticamente todas as pessoas têm acesso a um ou mais desses dispositivos. Assim, podemos considerar que Bill Gates estava certo em sua previsão.

Mas quando teremos robôs em nossas casas, nos ajudando em nossos trabalhos diários como vemos nos filmes de ficção científica? Quando comecei a trabalhar com robótica, minha mãe me perguntou quando lhe faria um robô para fazer as tarefas domésticas. Já se passaram mais de 20 anos e não tenho ainda uma boa resposta para ela.

Até bem pouco tempo atrás, os robôs estavam restritos às indústrias e aos laboratórios de pesquisa. Tais robôs são de custo extremamente elevado, e são muito difíceis de serem operados. Mesmo que conseguisse fazer um robô doméstico para minha mãe, teria que dar um notebook a ela e um livro de programação em linguagem C. Obviamente, ela me colocaria para correr e jogaria o livro em mim.

Entretanto, versões simplificadas de robôs foram lançadas no mercado como brinquedos de alta tecnologia. Tais robôs ainda são caros, mas já são acessíveis às camadas da população com renda mais alta. Mas suas possíveis aplicações ainda são muito restritas, pois esta foi a única forma de simplificar o processo de interação das pessoas com esses robôs.

Assim, para que a robótica possa alcançar a mesma abrangência da informática, sendo usada por qualquer pessoa para lhe ajudar em suas muitas tarefas diferentes, e não apenas ficando restrita a técnicos especializados, será necessário que ocorra um processo semelhante ao que aconteceu com a informática nos últimos 40 anos.

Nesse sentido, existem diversos trabalhos já ocorrendo em uma área de pesquisa recente denominada Interação Homem-Robô. Na Universidade Federal de Sergipe (UFS), o Grupo de Pesquisa em Robótica – GPRUFS – (www.gprufs.org) já está trabalhando nessa linha, e vem desenvolvendo uma metodologia para obtenção de vocabulários de gestos intuitivos para interação homem-robô. A opção por uma interação baseada em gestos foi feita considerando que em ambientes com elevado nível de ruído, como muitos ambientes industriais, os gestos são mais úteis que a fala para fins de comunicação. Além disso, existem pesquisas que indicam que talvez seja possível criar um vocabulário de gestos que seja intuitivo para pessoas de diferentes países, falando línguas diferentes. A ideia de buscar gestos intuitivos é justamente no sentido de eliminar, ou pelo menos minimizar, o processo de treinamento do usuário para interagir com o robô. A metodologia para obtenção de vocabulários de gestos intuitivos para interação entre pessoas e robôs já foi desenvolvida e está em processo de validação. Também está em andamento no laboratório de robótica da UFS um estudo sobre o impacto que a origem cultural do usuário pode ter no grau de intuitividade dos gestos do vocabulário. Na sequência está prevista a realização de um amplo estudo, envolvendo outros grupos de pesquisa no Brasil, Canadá, Argentina, Portugal e possivelmente Japão, no qual a metodologia para obtenção de gestos intuitivos desenvolvida em nosso laboratório será aplicada com pessoas de países e idiomas diferentes. O que se deseja verificar é se os vocabulários de gestos intuitivos obtidos por esses vários grupos, para um mesmo conjunto de tarefas que podem ser requisitadas ao robô, serão semelhantes.

Mas as pesquisas não podem parar. A forma como interagimos uns com os outros é através da fala e dos gestos. Sendo assim, também são fundamentais os estudos envolvendo interação homem-máquina usando linguagem natural. Só assim, no futuro, se poderá chegar a uma forma de interação simples e natural como a que se vê nos filmes de ficção científica, e todos poderemos ter um ou mais robôs em nossas casas, no trabalho, etc.

[1] Crédito da imagem: TheDigitalArtist (Pixabay) / CC0 Creative Commons. https://pixabay.com/en/futuristic-robot-cyborg-3308094/.

Como citar este artigo: Eduardo Freire. Quando terei um robô para me ajudar nas tarefas domésticas? Saense. http://www.saense.com.br/2018/04/quando-terei-um-robo-para-me-ajudar-nas-tarefas-domesticas/. Publicado em 16 de abril (2018).

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