Matheus Macedo-Lima
30/01/2020

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O número de veículos automotivos em no mundo está em constante aumento. No Brasil, estima-se que existam por volta de 45 milhões de veículos em circulação, o que nos dá uma proporção média de 1 veículo para cada 5 brasileiros. No entanto, essa proporção aumenta em cidades. Aracaju, por exemplo tem 1 carro para cada 2 aracajuanos. Já São Paulo… 7 carros para cada 10 paulistanos (IBGE, 2018-2019). É uma “carrada”!

Apesar dos benefícios e conforto, veículos são uma significativa fonte de poluentes atmosféricos. Muitas partículas voláteis de tamanhos variados são emitidas por veículos. A fuligem por exemplo é composta de partículas grandes (geralmente visíveis) com diâmetros de até 10 micrômetros (1 centésimo de milímetro). Não deve ser novidade que fuligem pode causar ou acentuar problemas respiratórios, como alergias ou asmas. Porém, há um grupo invisível de partículas ultrafinas (< 0.1 micrômetros) também emitidas por veículos que podem causar problemas mais sinistros. Problemas estes que afetam indivíduos que nem tem idade para dirigir!

Essas partículas são tão pequenas que podem entrar facilmente na corrente sanguínea (e no cérebro!) através da mucosa nasal. Com isso em mente, um grupo de cientistas liderados por Patrick Ryan, do Hospital Pediátrico da Universidade de Cincinnati, resolveu investigar se o desenvolvimento de crianças podia ser afetado por poluição veicular. Mais especificamente, eles perguntaram: será que essas partículas podem afetar o desenvolvimento do cérebro? [2]

Esse estudo empregou dados de crianças que cresceram durante o primeiro ano de vida perto de grandes rodovias com altas taxas de poluição e os comparou com crianças criadas longe de rodovias. Eles convidaram as mesmas crianças aos 12 anos de idade para uma bateria de imagens por ressonância magnética para quantificar o tamanho de várias áreas cerebrais.

Crianças expostas a altos índices de poluição durante o primeiro ano de idade apresentaram reduções de 3-4% no volume de várias áreas cerebrais. A maior parte dessas áreas são responsáveis pelo controle de emoções, sentidos e movimentos finos.

Um detalhe importante é que as populações expostas a altos índices de poluição nesse estudo também apresentaram em média mais baixa escolaridade e maior índice de negros, mas esses fatores não afetam os resultados. Esses dados apontam que os danos da poluição atingem desproporcionalmente populações desfavorecidas.

A infância é um período altamente sensível na qual desenvolvimento cerebral é acelerado e bastante suscetível a danos. Portanto, esse estudo sugere que a poluição por tráfego de veículos pode estar afetando o desenvolvimento cerebral de crianças. Além disso, atualmente é praticamente impossível não expor crianças a poluição, o que sugere que mesmo as crianças no grupo de baixa exposição podem também estar sofrendo de efeitos no seu desenvolvimento.

[1] Crédito da imagem: Clker-Free-Vector-Images. https://www.needpix.com/photo/download/36068/baby-gas-mask-crawling-infant-child-newborn-toxic-danger.

[2] T. Beckwith et al., “Reduced gray matter volume and cortical thickness associated with traffic-related air pollution in a longitudinally studied pediatric cohort,” PLoS One, vol. 15, no. 1, p. e0228092, Jan. 2020.

Como citar este artigo: Matheus Macedo-Lima. Cérebros de crianças estão sendo afetados pela poluição automotiva. Saense. https://saense.com.br/2020/01/cerebros-de-criancas-estao-sendo-afetados-pela-poluicao-automotiva/. Publicado em 30 de janeiro (2020).

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