UFMG
07/12/2020
O Centro de Sensoriamento Remoto (CSR) da UFMG publicou um policy brief sobre os impactos socioambientais da implementação da ferrovia EF-170, popularmente conhecida como Ferrogrão, na Amazônia. Intitulado Amazônia do futuro: o que esperar dos impactos socioambientais da ferrogrão?, o documento indica possíveis consequências da implantação da ferrovia, comparando o cenário atual do transporte de soja na região, que é feito majoritariamente pela rodovia BR-163, e o futuro cenário com parte da soja sendo transportada pela futura ferrovia.
A Ferrogrão encontra-se, no momento, em fase de licitação. Como o seu traçado ainda não foi definido, os pesquisadores do CSR trabalharam com duas projeções. A primeira considerou que a ferrovia se estenderá do município de Sinop, no Mato Grosso, até Itaituba, no Pará. A segunda prevê a ferrovia com o mesmo traçado, mas com um terminal intermediário no município de Matupá, no norte do Mato Grosso.
Segundo a pesquisadora Juliana Davis, uma das autoras da análise, o estudo mostra que, apesar dos benefícios econômicos, a implantação da ferrovia deixará os municípios da região mais vulneráveis nos campos social e ambiental, uma vez que vai alterar a dinâmica do fluxo de transporte na região.
“A Ferrogrão diminuirá os custos do transporte de soja porque o transporte ferroviário é mais barato que o rodoviário. Porém, percebemos que, no cenário que leva em conta o posto de transbordo em Matupá, poderá haver uma mobilização de rodovias estaduais para a chegada dos grãos até a ferrovia. Uma dessas rodovias passa dentro do Parque Nacional do Xingu, o que traria consequências negativas para os povos indígenas e outras comunidades menores do entorno”, explica.
A pesquisadora acrescenta que a valorização das terras do entorno da ferrovia também põe em risco as comunidades indígenas porque gera especulação imobiliária. “A especulação leva, para a região, pessoas que estão interessadas em crescer financeiramente por meio do agronegócio, mas que não levam em conta o meio ambiente e os povos locais.”
A participação desses povos no licenciamento da ferrovia poderia ajudar a diminuir os impactos negativos socioambientais da Ferrogrão. Segundo Davis, durante a etapa atual de licenciamento da obra, as populações das regiões que serão afetadas pela ferrovia precisam ser ouvidas. Ela destaca que os responsáveis pela obra deveriam, também, aumentar a área de impacto que é atualmente considerada no processo de licenciamento da Ferrogrão.
“Os povos indígenas precisam ser ouvidos durante o licenciamento. Povos que não são considerados dentro da área de influência da ferrovia não serão levados em conta para a sua implementação e, dessa forma, não estarão protegidos de futuros impactos negativos.”
As projeções do estudo foram feitas por meio do software Dinamica Ego, software de modelagem de sistemas ambientais desenvolvido por pesquisadores da UFMG e que utiliza imagens feitas por satélite das áreas analisadas. No caso dos estudos sobre a Ferrogrão, os pesquisadores consideraram o cenário do transporte brasileiro de soja em 2018, utilizando bases de dados já existentes.
O policy brief foi produzido por Britaldo Soares Filho, professor do Departamento de Cartografia do Instituto de Geociências (IGC) e coordenador do Centro de Sensoriamento Remoto (CSR), Amanda Ribeiro, pesquisadora associada no CSR e doutoranda em Análise Ambiental na UFMG, Juliana Leroy Davis, doutoranda em Engenharia de Produção na UFMG e pesquisadora associada ao CSR, e William Leles de Souza Costa, pesquisador associado no CSR e doutorando em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais na UFMG. O documento está disponível on-line.
A Ferrogrão
A Ferrogrão (EF-170) é um projeto de ferrovia de extensão de 933 quilômetros e capacidade de transporte de até 52 milhões de toneladas de commodities agrícolas ao ano. Seu objetivo é criar uma nova opção de rota para o escoamento da produção do centro-norte do Mato Grosso até os portos de Santarém e Barcarena, no Pará.
O projeto prevê o escoamento da produção de soja, milho, farelo de soja, óleo de soja e açúcar, além do transporte de produtos importados como fertilizantes e derivados de petróleo. A Ferrogrão é considerada um projeto prioritário do Programa de Parcerias de Investimento (PPI) do governo federal, e sua construção e operação serão concedidas pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) para um empreendedor privado pelo período de 69 anos. Desde julho de 2020, o plano para a concessão da ferrovia está em análise no Tribunal de Contas da União (TCU). A previsão é que a Ferrogrão comece a funcionar em 2030.
(Luana Macieira)
Como citar esta notícia: UFMG. Construção da Ferrogrão na Amazônia trará ganhos econômicos, mas ameaça comunidades indígenas. Texto de Luana Macieira. Saense. https://saense.com.br/2020/12/construcao-da-ferrograo-na-amazonia-trara-ganhos-economicos-mas-ameaca-comunidades-indigenas/. Publicado em 07 de dezembro (2020).