UFSC
08/04/2022
Um estudo liderado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em parceria com o Museu de História Natural (Naturalis Biodiversity Center), da Holanda, e a Universidade de São Paulo (USP), apontou que as mudanças climáticas ameaçam plantas de importância socioeconômica para agricultores e comunidades indígenas no Brasil. Os pesquisadores avaliaram 135 espécies priorizadas pela iniciativa do Ministério do Meio Ambiente Espécies nativas da flora brasileira de valor econômico atual e potencial: Plantas para o Futuro – Região Sul, de 2011.
Mesmo uma década após a publicação, essas espécies continuam demonstrando um grande potencial para proporcionar a segurança alimentar para comunidades e têm valor comercial no mercado nacional e externo. Agricultores e populações indígenas cotidianamente utilizam esses recursos vegetais para construção, alimentação, medicina, ornamento, entre outros usos. Assim, a eventual perda dessas espécies impacta diretamente sua subsistência.
“A principal motivação para a realização desse estudo foi a urgente necessidade de incorporar o impacto das alterações climáticas nos planos de conservação da biodiversidade, bem como discutir abordagens alternativas que melhorem os sistemas ecológicos e, concomitantemente, a qualidade de vida de populações locais que diariamente fazem o uso de diversos recursos vegetais”, justifica Valdeir Pereira Lima, o primeiro autor do trabalho, doutorando do Programa de Pós-Graduação em Recursos Genéticos Vegetais (RGV/UFSC) que atualmente desenvolve pesquisas na Universidade de New Brunswick, no Canadá.
O artigo foi publicado em fevereiro deste ano na Scientific Reports (clique AQUI para acessar a íntegra). No estudo, os pesquisadores utilizaram a modelagem de nicho ecológico, uma ferramenta globalmente empregada para estimar habitats climaticamente adequados e as diretrizes da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, sigla em inglês) para acessar preliminarmente o status de conservação das espécies estudadas.
A pesquisa estima um declínio médio entre 22% a 56% das 135 espécies analisadas nas áreas climaticamente adequadas. Embora apenas 4,3% dessas espécies estejam potencialmente ameaçadas pela Lista Vermelha IUCN, este número aumenta para 41% a 84% quando consideradas as mudanças climáticas, uma vez que essas espécies poderão se tornar ameaçadas pela perda de condições necessárias para sobrevivência.
Esses resultados evidenciam um futuro de perdas potenciais para a biodiversidade brasileira e, ao mesmo tempo, reforçam a necessidade de avaliações preliminares para que políticas de conservação sejam efetivamente colocadas em práticas antes da erosão irreversível da biodiversidade que ainda sustenta as diversas populações no Brasil.A fim de amenizar as perdas previstas, os pesquisadores recomendam uma série de ações, entre elas estão a promoção dessas espécies em agroecossistemas, paisagismo e quintais – alternativas promissoras para aumentar sua população – e a identificação de matrizes, produção e distribuição de mudas, bem como a divulgação de seus múltiplos usos. São indicadas a incorporação de avaliações de impacto das mudanças climáticas em programas de conservação e a adoção de políticas públicas envolvendo agricultores e comunidades locais, uma vez que as práticas e sistemas de manejo por eles implementados têm demonstrado manter as paisagens com fragmentos florestais produtivos, favorecendo a conservação das espécies e da floresta.
Os sistemas diversificados de produção em paisagens agrícolas conectam fragmentos florestais isolados e, consequentemente, ajudam a conservar outras espécies não comumente utilizadas, incluindo as demais plantas, animais e micro-organismos nativos da paisagem. Para Valdeir Lima, o cenário ambiental brasileiro passou por avanços significativos na última década, dentre as quais as mudanças no Código Florestal (Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012), que possibilitaram o estabelecimento de Sistemas Agroflorestais (SAFs) na recuperação ambiental.
De acordo com o pesquisador, apesar de os resultados do estudo evidenciarem um futuro de perdas potenciais para a biodiversidade brasileira, a incorporação dessas espécies em SAFs permite a manutenção de paisagens com fragmentos florestais produtivos. O autor tem a expectativa de que o trabalho provoque um maior debate sobre o tema no meio científico. “Os resultados representam um avanço para a comunidade científica brasileira, especialmente por estarem intimamente alinhados a outros projetos e grupos de pesquisa que vislumbram a conservação da biodiversidade. Com a publicação desse artigo, nós esperamos um maior debate no meio científico, o qual é indispensável para o avanço do conhecimento”, avalia Valdeir Lima.
Maykon Oliveira/Jornalista da Agecom/UFSC
Como citar este texto: UFSC. Mudanças climáticas ameaçam plantas de importância socioeconômica para agricultores e comunidades indígenas, aponta estudo. Texto de Maykon Oliveira. Saense. https://saense.com.br/2022/04/mudancas-climaticas-ameacam-plantas-de-importancia-socioeconomica-para-agricultores-e-comunidades-indigenas-aponta-estudo/. Publicado em 08 de abril (2022).