SBF
06/06/2022
O mundo ficou impressionado com a imagem da sombra do buraco negro central da nossa galáxia, a Via Láctea, divulgada no dia 12 de maio pela colaboração Event Horizon Telescope (EHT). O trabalho do EHT envolveu observações, análises de dados e simulações astrofísicas extremamente avançadas, mas a física básica por trás dessas imagens pode ser completamente trabalhada e discutida por alunos de Física nos cursos de introdução à teoria da relatividade geral.
Em um artigo didático publicado ano passado na Revista Brasileira de Ensino de Física (RBEF), Luis Carlos Bassalo Crispino, professor da Universidade Federal do Pará (UFPA), com seu aluno de doutorado, Haroldo Lima Junior, e os pesquisadores portugueses Carlos Herdeiro e Pedro Cunha, ambos atualmente na Universidade de Aveiro, em Portugal, discutiram a divulgação, no ano de 2019, da primeira imagem obtida pelo EHT, a da sombra do buraco negro no centro da galáxia M87.
De acordo com Crispino, obter a imagem da sombra do buraco negro no centro da Via Láctea, conhecido como Sagitário A*, foi um desafio muito maior para a colaboração EHT, por causa da alta velocidade de rotação do plasma, muito maior no caso de Sagitário A*. “Enquanto o plasma próximo a M87 leva dias ou semanas para dar uma volta completa em torno do buraco negro, no caso de Sagitário A* a volta completa é dada em minutos”, diz Crispino. “O fato se torna ainda mais impressionante quando nos damos conta de que os dados necessários para se compor cada uma dessas imagens precisam ser obtidos durante algumas horas de observações. Ao tentarmos fazer uma fotografia de um pião ou de uma bailarina girando, temos ideia da dificuldade em obter uma imagem de um objeto em rotação rápida.”
Apesar da grande diferença entre os dois buracos negros – o do centro da galáxia M87 possui uma massa 6 bilhões de vezes a massa do Sol, enquanto Sagitário A* tem 4 milhões de massas solares – a semelhança entre as duas imagens é notável, como previsto pela Teoria da Relatividade Geral de Einstein, comenta Crispino. Em um estudo publicado ano passado na revista Physical Review D, Crispino, Lima e seus colegas mostraram que a imagem da sombra de um buraco negro não determina inequivocamente a geometria de seu espaço-tempo. “Esse trabalho levanta a hipótese de que buracos negros em teorias alternativas de gravitação podem imitar perfeitamente a sombra dos buracos negros previstos pela teoria de Einstein”, explica Lima no vídeo. “É importante ressaltar que, quando dois buracos negros diferentes projetam exatamente a mesma sombra, o efeito de lente de gravitacional é geralmente diferente.”
Um dos estudos publicados pela colaboração EHT comparou os dados das observações de Sagitário A* com um conjunto de simulações baseadas na relatividade geral e teorias alternativas. A conclusão foi que as previsões da teoria da relatividade geral para um buraco negro em rotação são as que melhor explicam as observações, dentro de um intervalo de incerteza de cerca de 10%.
Referências
Lima, Haroldo C. D. et al., Sombras de buracos negros: desvendando a física por detrás da imagem de M87, Revista Brasileira de Ensino de Física, 2021, v. 43 , e20200232.
Xavier, Sérgio V. M. C. B. et al., Órbitas esféricas de fótons ao redor de um buraco negro de Kerr, Revista Brasileira de Ensino de Física, 2020, v. 42 , e20200181. Lima, Haroldo
C. D. et al., Can different black holes cast the same shadow?, Phys. Rev. D 103, 084040, 22 de abril de 2021.
[1] Foto: Event Horizon Telescope Collaboration
Como citar esta notícia: SBF. A física por detrás das imagens de buracos negros. Saense. https://saense.com.br/2022/06/a-fisica-por-detras-das-imagens-de-buracos-negros/. Publicado em 06 de junho (2022).
Conheci o o Professor Crispino numa palestra que proferiu, e que assistí ontem, sobre buracos negros, via youtube. Simplesmente a melhor e didática – muiiiiito didática – exposição a respeito desses objetos tão famosos e ainda controversos, felizmente apenas para uns poucos cosmólogos, inclusive um deles brasileiro. Estou interessado em ler seus artigos relacionados a tal tema. Parabéns ao grande mestre. Coisas que, apesar de já estudar o asssunto, amadoristicamente, há mais de uma década, alguns aspectos conceituais, sobretudo sobre a interpretação de alguns gráficos, que me escapavam, foram esclarecidas num instante, naquela palestra. Obrigado. Agora irei em busca de outros seus artigos, sobre o tema e sobre relatividade geral(se houver).