UFRGS
27/09/2023

Filmes de hidrogel com óleo essencial de pinus têm potencial para serem usados como curativo
Foto: Filme de hidrogel que integra a tese de doutorado da pesquisadora Patricia Hubner, desenvolvida no Programa de Pós-graduação em Engenharia Química da UFRGS (Patricia Hubner/Arquivo pessoal)

Aplicação cômoda, absorção de fluidos, auxílio no controle do processo de inflamação, biocompatibilidade , hidratação e proteção do ferimento são algumas das vantagens de filmes de hidrogéis como curativos. Ainda, com adição de óleos essenciais, como de pinheiro silvestre (pinus) e lavanda, pode ser conferida ação antibacteriana. É sobre essa possibilidade de uso que trata a tese de doutorado de Patricia Hubner, desenvolvida no Programa de Pós-graduação em Engenharia Química da UFRGS. No trabalho, a pesquisadora avaliou e testou o uso de filmes de hidrogéis com óleos de lavanda e pinus como curativos.

Um dos principais diferenciais dos curativos de hidrogéis é a possibilidade de utilização para tratamento de queimaduras de até segundo grau. Conforme explica Patrícia, “eliminaria aquela etapa do processo em que é necessário que o paciente seja submetido a uma raspagem”. A raspagem é a retirada manual da pele morta, que fica em contato com as pomadas durante o tratamento usual. “O próprio curativo vai fornecer um ambiente com umidade ideal para que auxilie no processo de cicatrização”, acrescenta.

Como esse material, porém, pode variar muito conforme a composição, o uso de óleos essenciais também interfere nas características. Assim Patricia realizou uma série de experimentos para testar a viabilidade, as propriedades e a atividade antimicrobiana dos curativos com óleo de lavanda e de pinus. Um dos principais resultados é que o filme de hidrogel, acrescido de óleo de pinus, apresenta uma boa atividade antibacteriana, podendo ser uma alternativa aos materiais existentes no mercado.

Hidrogéis, gelatina e PVA

Hidrogéis são uma rede de polímeros que pode ser formada por materiais tanto naturais quanto sintéticos. Nesse caso, o hidrogel analisado era feito a partir de gelatina e de um polímero chamado poli(álcool vinílico) ou PVA. A principal característica desses géis é a afinidade com a água e, mesmo solubilizados, conseguem manter sua forma original e absorvem grandes quantidades de água – ou fluidos, quando usados como curativos. 

Já os filmes são membranas sólidas, formadas também por polímeros variados, mas que não passam por um processo chamado reticulação, utilizados nos hidrogéis, que serve para realizar a ligação entre as cadeias químicas desses polímeros, conferindo maior estabilidade e prevenindo a solubilização. Esse processo é feito com o uso de luz ultravioleta, “que vai agir na gelatina e no PVA, criando alguns radicais livres, que vão interagir entre si e formar esse hidrogel”, explica a pesquisadora.

No trabalho, Patrícia utilizou dois materiais diferentes: a gelatina, que, por ser natural, apresenta maior biocompatibilidade (ou seja, sofre menos rejeição por parte de tecidos ou órgãos vivos) e degradabilidade, e o PVA, que apresenta mais resistência e estabilidade. Ela conta que, trabalhando somente com gelatina, o hidrogel se dissolvia ao ter contato com a umidade. “Pensando em melhorar essas propriedades, veio a ideia então de utilizar o PVA como polímero sintético e fazer a reticulação para aumentar a estabilidade”, complementa. Assim, o produto híbrido combina as vantagens dos dois materiais.

Resultados alcançados

O hidrogel pode ser caracterizado por muitos aspectos. Segundo a pesquisadora, porém, para uso em curativos, as análises mais pertinentes são referentes à permeabilidade de vapor de água e oxigênio, à elongação e ao intumescimento.

O vapor de água pode inibir a formação de crostas no ferimento, o que facilita o processo de cicatrização. No entanto, caso o curativo não permita evaporação suficiente, pode favorecer o acúmulo de fluidos e infecções. Como o hidrogel dificilmente atinge um valor recomendado de evaporação de água, o parâmetro utilizado foi, apenas, permitir mais evaporação do que a pele humana. Ainda segundo o trabalho, a evaporação abaixo do recomendado pode ter sido obtida porque a gelatina e o PVA possuem facilidade de interação com a água. Parte dela, portanto, pôde ficar retida no material.

Da mesma forma, uma baixa transmissão de oxigênio pode diminuir a regeneração de tecidos e aumentar a proliferação de bactérias anaeróbias, que têm dificuldade de viver na presença de O2. Segundo o estudo, os valores obtidos nesse quesito estão na mesma faixa de outros trabalhos sobre o assunto.

Já elongação, conforme a pesquisadora, pode ser definida quanto à capacidade do curativo de se esticar, isto é, a flexibilidade. Por fim, o intumescimento se refere a quanto o curativo consegue absorver os fluidos do ferimento. Controlando o intumescimento, pode-se, por exemplo, modificar a taxa de liberação do agente ativo, como os óleos essenciais.

Com a adição de óleos essenciais, Patricia observou algumas mudanças: tanto os curativos com pinus quanto os com lavanda apresentaram maior permeabilidade ao vapor de água e ao intumescimento. Os curativos com lavanda apresentaram, também, mais permeabilidade ao oxigênio e menor elongação.

Para o estudo de ação antibacteriana, foram realizados testes com duas bactérias: Escherichia coli Staphylococcus aureus. Os resultados demonstram que o óleo de pinheiro silvestre pode ser tão ou mais eficaz contra bactérias do que a lavanda, que já é utilizada com esse fim no mercado, desde que ajustadas as concentrações.

Segundo Patrícia, há algumas limitações no uso dos óleos, como a quantidade desses materiais que pode ser usada sem alterar as características do curativo. “Se eu colocasse mais óleo nesse filme, a gente provavelmente teria muitos problemas em relação à estrutura dele, então eu perderia em outras propriedades”, explica.

Ainda segundo ela, o pinus é uma alternativa inovadora, por ser pouco explorado em aplicações biomédicas, mesmo tendo maior efeito antimicrobiano, sendo atóxico e não apresentando irritabilidade nas baixas concentrações. Patricia conta que ainda não se encontra comercialmente esse tipo de aplicação, mas, “pelo comportamento que ele teve no nosso filme, pela resposta que ele nos deu, seria uma boa alternativa”.

Segundo o estudo, o produto apresenta características adequadas e promissoras para a sua utilização como curativo. O trabalho também ressalta a necessidade de mais estudos acerca da citotoxicidade e proliferação celular. Para o futuro, Patrícia explica que, caso o trabalho siga com novas fontes, talvez surja a oportunidade de patentear algum produto. [1], [2]

[1] Texto de Thiago Rodrigues Müller.

[2] Publicação original: https://www.ufrgs.br/ciencia/filmes-de-hidrogel-com-oleo-essencial-de-pinus-tem-potencial-para-serem-usados-como-curativo/.

Como citar esta notícia: UFRGS. Filmes de hidrogel com óleo essencial de pinus têm potencial para serem usados como curativo. Texto de Thiago Rodrigues Müller. Saense. https://saense.com.br/2023/09/filmes-de-hidrogel-com-oleo-essencial-de-pinus-tem-potencial-para-serem-usados-como-curativo/. Publicado em 27 de setembro (2023).

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