Claudio Macedo
29/08/2017

[1]
Poderíamos acreditar que maior escolaridade e entendimento dos processos da ciência tornaria a pessoa mais consciente das questões da natureza, mais lúcida para lidar com as interpretações dos fenômenos observados e, finalmente, mais confiante nos resultados da pesquisa científica. O fato é que isso é apenas parcialmente verdadeiro. Tem sido notado que um número significativo de pessoas, com grau de escolarização elevada, vem expressando intensamente divergências das evidências científicas em temas identificados como controversos em função de convicções políticas ou religiosas. As redes sociais, é certo, têm facilitado as manifestações de polarização nesses temas científicos.

Pesquisadores norte-americanos, utilizando os dados de pesquisas sociais regularmente realizadas nos EUA (The General Social Survey), examinaram a relação entre convicções pessoais sobre seis temas científicos contemporâneos, presumidos controversos, e a educação das pessoas, considerada em três aspectos: escolaridade geral, escolaridade científica e letramento científico [2]. Os temas científicos investigados foram: pesquisa com células-tronco, Big Bang, evolução humana, alimentos geneticamente modificados, nanotecnologia e mudanças climáticas antropogênicas.

Os autores descobriram que as convicções estavam correlacionadas com a identidade política individual para a pesquisa com células-tronco, Big Bang, evolução humana e mudanças climáticas antropogênicas. A identidade religiosa mostrou-se significativamente associada às convicções em relação a pesquisa com células-tronco, Big Bang, evolução humana e nanotecnologia. Em cada uma dessas questões, os indivíduos com mais educação geral, educação científica e letramento científico mostraram ter mais convicções polarizadas por razões políticas ou religiosas. Os pesquisadores não encontraram evidência de polarização política ou religiosa para alimentos geneticamente modificados.

No entendimento dos autores, o resultado do trabalho, indicando que maior formação geral e científica está associada a uma maior polarização em temas controversos por motivação política e religiosa, é consistente com o argumento de raciocínio motivado, pelo qual indivíduos mais conhecedores são mais adeptos da interpretação de evidências em apoio das suas conclusões preferenciais (viés de confirmação), e de erro de avaliação, pelo qual o conhecimento aumenta a confiança dos indivíduos mais rapidamente do que aumenta esse conhecimento.

Esse assunto é muito intrigante. As pessoas com alta escolaridade que divergem dos resultados científicos nos chamados temas controversos, normalmente, excluindo tais temas, valorizam a ciência e acreditam nos seus resultados. Assim, ficamos com algumas questões interessantes: Como as posições pessoais sobre temas científicos controversos mudam ao longo do tempo? Como a opinião das pessoas sobre esses temas variam dependendo da nacionalidade? Quais são as causas que levam pessoas com maior escolaridade geral e científica segurar-se em convicções íntimas de natureza política ou religiosa em detrimento de evidências científicas?

[1] Crédito da imagem: Lwp Kommunikáció (Flickr) / Creative Commons (CC BY 2.0). URL: https://www.flickr.com/photos/lwpkommunikacio/8243955303/.

[2] C Drummond, B Fischhoff. Individuals with greater science literacy and education have more polarized beliefs on controversial science topics. PNAS 10.1073/pnas.1704882114 (2017).

Como citar este artigo: Claudio Macedo. O efeito da maior escolaridade nas divergências em temas científicos. Saense. URL: http://www.saense.com.br/2017/08/o-efeito-da-maior-escolaridade-nas-divergencias-em-temas-cientificos/. Publicado em 29 de agosto (2017).

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