Hendrik Macedo
09/07/2017

Pessoa contempla o Universo. [1]
Imagens de quatro galáxias foram postadas no Twitter juntamente com um pedido de ajuda para classificá-las em relação às suas respectivas espécies. Alguns astrofísicos afirmaram tratarem de galáxias elípticas ou galáxias espirais, por exemplo. Os mais desconfiados (atributo importante em tempos de redes sociais digitais) questionaram se realmente tratavam-se de galáxias reais ou apenas simulações computacionais com uso fiel, naturalmente, de toda a Física relacionada. Na verdade, as imagens haviam sido sim criadas por computador, mas este nem de longe conhecia algo sobre a Física relacionada e, portanto, não se tratava de simulação. O computador era “inteligente” o suficiente para compreender em um gigantesco nível de profundidade os padrões que caracterizam uma galáxia e se fez valer dos mesmos para criar artificialmente essas quatro. Apesar do “Teste de Turing” elaborado pela equipe do pesquisador astrofísico Kevin Schawinski ter obtido sucesso, o principal objetivo do trabalho por trás da “brincadeira” é o de criar uma tecnologia capaz de fazer com que uma imagem de menor resolução de uma galáxia, uma imagem com ruídos, seja inteligentemente aprimorada até parecer ter sido obtida a partir de um telescópio de melhor qualidade, permitindo que mais informação de qualidade possa ser extraída para fins de pesquisa na área [2,3].

A Inteligência Artificial envolvida no processo consiste de um modelo de aprendizado gerativo. Ao contrário dos modelos discriminativos, modelos gerativos procuram compreender e explicar os dados de entrada diante da ausência de rotulação para esses dados. Ou seja, não existe um supervisor humano que defina previamente qual o rótulo de exemplo fornecido de modo a permitir que a máquina aprenda com essa informação. Uma vez que o mundo atual produz cada vez mais dados – haja vista as redes sociais digitais – e, ao mesmo tempo, não é naturalmente um grande supervisor – a maioria dos dados coletados não possui rótulos e, portanto, a tarefa de rotulação é eminentemente humana e manual – modelos gerativos ganham importância ímpar. No caso do trabalho de Schawinski, o modelo treinado tratou-se de uma Generative Adversarial Network (GAN) [4,5]. Como o próprio nome sugere, há um duelo entre duas redes neuronais artificiais adversárias. Uma das redes, a geradora, utiliza ruídos como entrada e cria exemplos artificialmente. A outra, a discriminadora, recebe como entrada um conjunto de dados que incluem os exemplos falsos criados pela geradora e outros provenientes de uma base de dados reais e precisa competentemente identificar as falsificações, funcionando como uma espécie de detetive. O jogo de “enganação e investigação” continua de modo que a geradora se torna cada vez mais hábil em gerar exemplos realísticos enquanto a discriminadora se torna melhor em detectar falsificações. No fim do jogo espera-se dados artificialmente criados quase indistinguíveis dos originais.

A equipe de Schawinski coletou milhares de imagens reais de galáxias e as degradaram artificialmente. A seguir, treinaram sua rede geradora para aprender a reconstruir essas imagens de modo a conseguir enganar a rede discriminadora. Ao fim, a GAN desenvolvida mostrou-se superior a outras técnicas de suavização de imagens ruidosas de galáxias. A abordagem foi considerada de vanguarda no uso de aprendizado de máquina na Astronomia, Ciência que produz petabytes de dados, quantidade claramente impraticável à análise humana. Em outro artigo [6], pesquisadores da indico Research e da Facebook AI Research mostram o enorme poder gerativo de uma GAN em outros domínios, como na criação artificial de imagens realísticas de quartos de uma residência e de rostos humanos.

[1] Crédito da imagem: geralt (Pixabay) / Creative Commons CC0. URL: https://pixabay.com/en/universe-person-silhouette-star-1044107/.

[2] K Schawinski et al. Generative adversarial networks recover features in astrophysical images of galaxies beyond the deconvolution limit. Mon Not R Astron Soc Lett 467, L110 (2017).

[3] J Sokol. Machines that make sense of the sky. Science 357, 26 (2017).

[4] I Goodfellow et al. Generative adversarial nets. In Advances in neural information processing systems (pp. 2672-2680) (2014).

[5] T Salimans et al. Improved techniques for training GANs. In Advances in Neural Information Processing Systems, pp. 2234-2242 (2016).

[6] A Radford et al. Unsupervised representation learning with deep convolutional generative adversarial networks. arXiv preprint arXiv:1511.06434 (2015).

Como citar este artigo: Hendrik Macedo. “Aperfeiçoando” galáxias. Saense. URL: http://www.saense.com.br/2017/07/aperfeicoando-galaxias/. Publicado em 09 de julho (2017).

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