Matheus Macedo-Lima
06/07/2017

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Há muitos métodos por aí que prometem facilitar o aprendizado de línguas. Por mais inacreditável que pareça a propaganda – “saia falando inglês em 2 semanas” – nenhum “método” parece ser tão eficiente quanto começar a aprender desde criança. Isso se dá porque existe um período crítico no cérebro durante o qual sons são facilmente aprendidos e a capacidade de desenvolver linguagem (especialmente falada) é bem flexível.

Imagine como seria fantástico poder simplesmente tomar um remédio para voltar a esse estado inicial!

Uma pesquisa recente, publicada na revista Science [2], sugere que pode haver esperança para você que sofre para aprender uma língua nova ou para perder aquele sotaque. No estudo, camundongos adultos e idosos conseguiram aprender novos sons em um teste antes apenas possível de ser aprendido por camundongos jovens. Os pesquisadores relatam que eles conseguiram reativar o período crítico no cérebro apenas com a redução da sinalização de uma molécula no sistema auditivo cerebral, a adenosina.

O estudo identifica uma área do cérebro fundamental para esse processo. A redução da sinalização de adenosina especificamente no núcleo geniculado medial do tálamo foi suficiente para reabrir o período crítico nos animais. O estudo também mostra que os níveis de adenosina, e da enzima que a fabrica, aumentam com a idade nesta região. Faz sentido!

Os camundongos ingeriram drogas altamente específicas para inibir um tipo de receptor da adenosina (receptores A1), mas os pesquisadores sugerem que outras drogas menos específicas possam ter os mesmos efeitos.

Sabe o que mais é um inibidor de receptores de adenosina?

Vou dar algumas dicas: essa droga é consumida por cerca de 95% da população brasileira acima dos 15 anos [3] e é o segundo líquido mais bebido no Brasil, presente em 98% dos lares – ficando atrás apenas da água… por enquanto [4]. Ficou fácil, né? Vai um cafezinho?

Os pesquisadores sugerem que caso essa descoberta também se aplique para humanos, pode ser que a cafeína facilite o aprendizado de sons (tanto de linguagem como de música). Porém, por ser um inibidor menos específico, os efeitos podem ser fracos ou imprevisíveis. Resta-nos esperar por pesquisas em humanos para ter certeza…

Mas por enquanto não custa tentar, né? Pode ser que aquele cafezinho antes ou durante a aula de inglês ou de música traga mais benefícios do que somente te manter acordado(a)!

[1] Crédito da imagem: Phillip McMaster (Flickr) / Creative Commons (CC BY-NC 2.0).  URL: https://www.flickr.com/photos/dragonpreneur/3274101715/.

[2] JA Blundon et al. Restoring auditory cortex plasticity in adult mice by restricting thalamic adenosine signaling. Science 356, 1352 (2017).

[3] ABIC. Dados do IBGE confirmam pesquisas da ABIC: café é o alimento mais consumido. Encafé. URL: http://www.abic.com.br/publique/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=1016&sid=29. Publicado em 03 de agosto (2011).

[4] ABIC. Indicadores da indústria de café no Brasil – 2015. Encafé. URL: http://www.abic.com.br/publique/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=61. Acesso: 04 de julho (2017).

Como citar este artigo: Matheus Macedo-Lima. Uma tradição brasileira pode ajudar o cérebro a aprender línguas e música. Saense. URL: http://www.saense.com.br/2017/07/uma-tradicao-brasileira-pode-ajudar-o-cerebro-a-aprender-linguas-e-musica/. Publicado em 06 de julho (2017).

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