Agência FAPESP
29/01/2019
O trabalho das equipes da Secretaria de Estado da Saúde (SES-SP), principalmente do Centro de Vigilância Epidemiológica Prof. Alexandre Vranjac (CVE) e do Centro de Controle de Doenças (CCD), durante a epidemia e a história da doença são o tema do livro O Combate à Febre Amarela no Estado de São Paulo: história, desafios e inovações, do jornalista Carlos Henrique Fioravanti.
A obra retrata as inovações surgidas da epidemia, que obrigou os profissionais a repensar a forma de controlar a dispersão do vírus e o tratamento dos pacientes graves.
“A epidemia trouxe uma nova perspectiva na virologia e na forma de tratar a doença”, disse Regiane de Paula, diretora do CVE. Uma delas foi o uso de georreferenciamento, marcando a localização e a data de morte dos macacos, para prever a direção e a velocidade que o vírus se espalhava pelo Estado, onde entrou ainda em 2016 em sua forma silvestre. A forma urbana não existe no Brasil desde 1942.
Diferentemente do protocolo até então, em que a vacinação só começava depois dos primeiros casos em humanos, a população começou a ser vacinada ainda quando os primeiros macacos tiveram a morte pelo vírus confirmada.
“Vimos que o vírus se movia até três quilômetros por dia e estava chegando a uma área bastante populosa, que é a Grande São Paulo, com 12 milhões de pessoas. Então começamos a fazer campanhas de vacinação onde prevíamos que ele fosse chegar”, disse De Paula.
“Se fôssemos esperar aparecer casos em pessoas para começar a vacinar, haveria muito mais mortes”, disse Marcos Boulos, coordenador de Controle de Doenças da SES-SP e professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).
Quando o vírus chegou ao distrito de Anhanguera, 100% da população estava vacinada. Tanto que houve mortes de macacos, mas nenhuma de humanos. Em Mairiporã, 85% da população foi vacinada. Mesmo assim, um grande número de casos e mortes acometeu o município, que chegou a decretar estado de calamidade pública.
“Não conseguimos vacinar todos em Mairiporã porque é uma área de ocupação das matas, com difícil acesso. Há lugares bastante isolados, como o bairro Barro Preto, em que a população quase não sai e onde as equipes não conseguem chegar. Por isso houve ainda tantos casos”, disse Boulos à Agência FAPESP.
Além da nova forma de evitar que o vírus se espalhasse, o livro mostra como as equipes se prepararam para lidar com os doentes graves. Embora o transplante de fígado seja o procedimento padrão para falência hepática, foi definido que os pacientes com febre amarela deveriam passar na frente da fila de transplante, dado o risco de morte.
Durante a epidemia foi realizado o primeiro transplante de fígado em um paciente de febre amarela no mundo.
O trabalho foi reconhecido pela Organização Panamericana de Saúde (Opas), que colaborou com recursos durante a epidemia e patrocinou a produção do livro. Boulos foi recentemente ao Senegal a convite da Opas para apresentar os dados obtidos no Brasil e contribuir para a compreensão do vírus na África.
Fioravanti teve contato com o assunto quando produziu duas reportagens para a revista Pesquisa FAPESP. Uma delas foi a capa da edição de janeiro de 2018 e a outra foi publicada no mês seguinte.
“A nossa memória é muito curta. No trabalho com saúde pública, o tempo todo estamos correndo atrás do prejuízo, para fazer o máximo que podemos pela população. Um registro como esse é fundamental, porque as doenças não acabam, elas continuam por aí”, disse Boulos.
Uma prova é que o vírus segue matando, como lembra Regiane de Paula. “Ainda tem muita gente para ser vacinada. Nessa época do ano, com mais chuva e calor, o mosquito viaja mais rápido. Vencemos a batalha, mas não vencemos a guerra”, disse.
O livro tem projeto gráfico de Hélio de Almeida e Thereza Almeida e está disponível gratuitamente para download em http://www.saude.sp.gov.br/resources/ccd/noticias/cve/febre_amarela_miolo_web.pdf. [2]
[1] Crédito da imagem: Divulgação.
[2] Esta notícia científica foi escrita por André Julião.
Como citar esta notícia científica: Agência FAPESP. Livro narra desafios do combate à febre amarela. Texto de André Julião. Saense. http://www.saense.com.br/2019/01/livro-narra-desafios-do-combate-a-febre-amarela/. Publicado em 29 de janeiro (2019).