UFMG
09/03/2020

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Ex-árbitros de futebol de Minas Gerais, que foram vinculados à Federação Mineira de Futebol (FMF), foram entrevistados por Gabriel Farias Alves Correia para a dissertação intitulada Uma grande solidão em meio à multidão: histórias e memórias da arbitragem de futebol de Minas Gerais, defendida no Centro de Pós-graduação e Pesquisas em Administração, da Faculdade de Ciências Econômicas (Face) da UFMG, em fevereiro de 2020.

“As memórias dos ex-árbitros de futebol de Minas Gerais nos possibilitaram compreender outras formas de pensar a Administração e a gestão se não aquela focada nas organizações empresariais. A ideia da vida social organizada que discutimos nos possibilitou discutir o fazer social e atestarmos inconsistências de narrativas totalizantes e oficiais. Por nos distanciarmos de uma lógica tecnicista, recordar as vivências dos ex-árbitros nos permitiu pensar sobre o trabalho de rememorar que, muitas vezes, é tratado como trabalho improdutivo. No entanto, na lógica do conhecimento, a nostalgia se apresenta como uma ação importante no caminho dos fazeres sociais”, relata o pesquisador. 

O estudo teve como intuito valorizar as histórias de sujeitos que, muitas vezes, são esquecidos na memória do futebol. Para Gabriel Correia, os profissionais de arbitragem “são marginalizados pelas grandes narrativas que buscam valorizar os grandes feitos, os grandes espetáculos. Em termos de futebol, são os grandes jogadores e treinadores, as grandes jogadas, os gols memoráveis. Diferente disso, o árbitro é colocado para escanteio. É o sujeito esquecido pelas versões oficiais da história. Na relação de poder com as entidades, seus interesses são preteridos em relação aos outros”, comenta.

Com essa pesquisa, foi possível discutir como as histórias dos ex-árbitros perpassam por três questões: uma dinâmica de submissão ao autoritarismo das entidades de organização do futebol necessárias para sua sobrevivência e manutenção no meio; uma dinâmica de incerteza quanto à atividade, que passa por uma precarização do trabalho complementada por uma insegurança laboral, tendo em vista a ausência de garantias profissionais que a atividade tem no país, uma vez que ainda não é considerada uma profissão e nem apresenta garantias para tal; por fim, como a arbitragem é afetada pelas ingerências políticas relacionadas ao jogo de poder de federações, confederações e clubes de futebol, além das ingerências interpessoais, em que a simpatia de dirigentes se sobrepõe aos critérios objetivos estabelecidos pelas entidades do futebol para crescimento da carreira do árbitro.

“Trabalhar com as memórias dos árbitros me ajudou a pensar como a gestão pode ser variada: o árbitro é um gestor cada vez que ele precisa improvisar para manter a dinâmica de um ambiente. Uma gestão criativa, cotidiana, ordinária que se constitui durante o seu exercício. Ele, como produtor de uma práxis gerencial, baseada em regras, utiliza-se da própria interpretação para improvisar uma solução para a questão que sobrevier. O saber produzido pelo árbitro de futebol é um conhecimento originado desde outras formas não centrais, que não o saber acadêmico”, avalia Gabriel Correia.

Ao todo, 21 ex-árbitros foram entrevistados. A análise das narrativas considerou quatro temáticas principais: as lembranças do ser árbitro, sua função e seus pilares; os movimentos relacionados à busca pela profissionalização da arbitragem; as lembranças do futebol amador, profissional e suas tentativas de corrupção, bem como as lembranças das entidades representativas e organizadoras do futebol.

Segundo Gabriel Correia, “as discussões dessas temáticas envolvem histórias das violências sofridas nos campos amadores, das dinâmicas do futebol profissional, das imposições das entidades diretivas do futebol, das relações com as entidades representativas dos árbitros, dos detalhes sobre os fazeres, dos sentimentos conectados às experiências, das histórias das atuações dentro de campo e do movimento por uma profissionalização da atividade e da consideração do árbitro como aquele que é gestor de conflitos e de interesses, que cria tendo em vista as imposições dos sujeitos de maior poder na relação”. [2]

[1] Imagem de elbgau por Pixabay.

[2] Título da dissertação: Uma grande solidão em meio à multidão: histórias e memórias da arbitragem de futebol de Minas Gerais. Autor: Gabriel Farias Alves Correia. Orientador: Alexandre de Pádua Carrieri. Programa: Centro de Pós-Graduação e Pesquisas em Administração da Faculdade de Ciências Econômicas. Data da defesa: 5 de fevereiro de 2020.

Como citar esta notícia: UFMG. Histórias e memórias da arbitragem de futebol. Saense. https://saense.com.br/2020/03/historias-e-memorias-da-arbitragem-de-futebol/. Publicado em 09 de março (2020).

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