Jornal da USP
15/09/2021
Um estudo da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP avaliou o caso do envelhecimento da população no Japão. A pesquisadora Beatriz Kaori Miyakoshi Lopes, analisou a realidade do país asiático e os desafios que surgem com o envelhecimento, como a falta de mão-de-obra e os impactos na saúde e economia.
O trabalho foi desenvolvido com análises de censos japoneses e bibliografia dos principais pesquisadores da área, tanto japoneses quanto estrangeiros.
Beatriz Lopes ressalta que o envelhecimento, em geral, é uma marca de sucesso para um país, pois decorre do aumento da qualidade de vida dos cidadãos. “O Japão tem aproximadamente 28% de sua população como idosos, o que equivale a 35 milhões de pessoas.”
Por outro lado, o envelhecimento impacta fortemente em outros problemas demográficos, como na diminuição da população economicamente ativa e em uma economia estagnada, principalmente quando ocorre juntamente com a diminuição na taxa de fecundidade. “Há conflitos intergeracionais. A sociedade e o governo consideram a camada idosa como um ‘peso’, com os jovens devendo arcar com os custos para sustentar as próximas gerações.”
Diferentemente de outros países, onde estrangeiros repõem uma parte da força de trabalho para compensar o grande número de idosos, como Canadá e Austrália, no caso japonês a situação se agrava por ser historicamente um país com imigração mais restrita.
De acordo com a pesquisadora, todos os países vão passar por um processo de envelhecimento da população, cada qual com suas peculiaridades. “Boa parte dos países europeus já passou por esse processo até se tornarem populações idosas. A França, por exemplo, levou mais de 100 anos para isso, Suécia, 85, e Estados Unidos, 69 anos. O Japão foi a primeira grande exceção entre os desenvolvidos, levando só 25 anos.”
Beatriz Lopes já havia estudado alguns dos problemas sociais existentes no Japão, como o machismo, o trabalho feminino, o karoushi (morte pelo excesso de trabalho), além da imigração fechada. Com o mestrado, ela fez uma correlação desses problemas com o envelhecimento da população. “O envelhecimento não existe em uma bolha. Uma possível solução não pode lidar só com os idosos, mas precisa levar em conta todos esses fatores.”
Por exemplo, há 1,8 milhão de cuidadores para 5,5 milhões de idosos que requerem cuidados. “Essa é uma profissão que jovens japoneses não têm interesse. O trabalho acaba sobrando para a robótica [há forte investimento do governo e da sociedade privada japonesa] e para imigrantes, mas falta aceitação da própria sociedade japonesa.”
Brasil
O Brasil envelhece rapidamente. Dados do Banco Mundial mostram que 9,6% de nossa população é idosa, quase 17 milhões de pessoas. Uma população mais idosa é um sinal de qualidade de vida, mas também representa a necessidade de uma maior atenção de governos e cidadãos em políticas públicas e inclusão.
Por aqui, vários relatórios mostram que a população está envelhecendo rapidamente sem que exista uma estrutura adequada para acolher essas pessoas. O Brasil tem atualmente 9,6% de idosos acima dos 65 anos, idade que muitos países adotam como parâmetro, bem próximo da média mundial de 9,3%, de acordo com dados do Banco Mundial. “O percentual pode parecer baixo, mas com uma população como a nossa, isso equivale a quase 17 milhões de pessoas.”
Beatriz ressalta que o envelhecimento é pouco discutido no Brasil mas muito estudado no exterior, principalmente no desenvolvimento e implementação de políticas públicas. “O Brasil é praticamente uma sociedade idosa, mas ainda temos a noção de que somos jovens.”
O desafio inclui ter mais planejamento na infraestrutura de serviços, como saúde, educação, economia, transporte adequado às necessidades de pessoas idosas, etc. “É preciso investir para que a população envelheça com qualidade de vida e dignidade, sem que os jovens tenham de arcar com custos gigantescos e, enfim, garantir que a economia do país não estagne ou entre em declínio.”
A dissertação Os desafios do Japão, a primeira sociedade super-envelhecida: envelhecimento, declínio populacional e a condição das mulheres japonesas teve a orientação do professor Alexandre Ratsuo Uehara.
Mais informações: e-mail biakaori@usp.br. [2]
[1] Fotomontagem por Rebeca Alencar com imagens de Wikimedia Commons, Piqsels e Pxfuel.
[2] Texto de Paulo Andrade/Assessoria de Comunicação da FFLCH.
Como citar este texto: Jornal da USP. O que o envelhecimento populacional do Japão pode ensinar ao Brasil? Texto de Paulo Andrade. Saense. https://saense.com.br/2021/09/o-que-o-envelhecimento-populacional-do-japao-pode-ensinar-ao-brasil/. Publicado em 15 de setembro (2021).