Embrapa
23/11/2022

Estudo inédito com RMN demonstra potencial de derivados de quitosana no tratamento de doenças infecciosas
Aparelho de RMN de alto campo utilizado no experimento na Embrapa Instrumentação [1]

Estudo realizado por pesquisadores da Embrapa Instrumentação (SP) e Universidade de São Paulo (USP) demonstrou que um derivado anfifílico de quitosana tem grande potencial no tratamento tópico da candidíase vulvovaginal. A pesquisa fez uso inédito de diferentes técnicas de ressonância magnética nuclear (RMN) para investigar a estrutura e morfologia de materiais derivados de quitosana.

Substância anfifílica é uma macromolécula que apresenta uma parte hidrofílica, solúvel em água, e outra hidrofóbica, solúvel em gordura.

O derivado foi eficiente na produção de nanopartículas de quitosana, carregadas para liberação sustentada, que mantém a concentração constante por longo tempo,com o antifúngico clotrimazol. O processo demonstrou ser eficiente no tratamento da doença infeciosa. 

A relevância da pesquisa levou William Marcondes Facchinatto a ser contemplado com o “Prêmio Tese Destaque USP – 11ª Edição”, que consagra as melhores teses de doutorado defendidas em 2021. O prêmio será entregue no dia 22, a partir das 14 horas, durante o 3º Encontro da Pós-Graduação, no Anfiteatro Camargo Guarnieri, Cidade Universitária, Butantã, em São Paulo.

Apesar da disponibilidade de uma gama significativa de medicamentos antifúngicos e produtos tópicos, o controle da infecção nem sempre é eficaz e, por isso, novas abordagens são necessárias.

“Assim, a pesquisa abre novos caminhos para formas diferentes de liberação de drogas, tanto para uso em humanos, animais e até em plantas”, diz o pesquisador da Embrapa Instrumentação, Luiz Alberto Colnago, orientador de Facchinatto no Programa de Pós-Graduação em Química do Instituto de Química de São Carlos (IQSC/USP).  O estudo foi premiado na área de Ciências Exatas e da Terra.

Vantagens e limitações

A tese de Facchinatto abordou os “Estudos físico-químicos de quitosanas quimicamente modificados através da ressonância magnética nuclear de estado sólido: de propriedades às aplicações”. Parte do estudo foi realizado na Universidade do Porto, em Portugal.

No Brasil, o pesquisador desenvolveu as etapas experimentais no laboratório do Grupo de Materiais Macromoleculares e Fibras Lignocelulósicas (IQSC/USP) e nos laboratórios de RMN da Embrapa Instrumentação. Em Portugal, no Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S) e Instituto Nacional de Engenharia Biomédica (INEB), sob a orientação e coorientação dos professores Bruno Sarmento e José das Neves.

O estudo contou com importantes colaboradores, entre eles, a dos professores Sérgio Paulo Campana Filho (IQSC/USP), Eduardo Ribeiro de Azevedo (IFSC/USP) e Tiago Bueno de Moraes (ESALQ). 

Graduado em Farmácia, especialista em aplicações de RMN em alimentos, biomateriais e nutraceúticos, com dois pós-doutorados na Universidade da Pensilvânia, Colnago explicou que a quitosana, um polímero linear obtido de fonte natural, bem como seus derivados, têm despertado grande interesse para diversas aplicações biomédicas.

“Isso se deve às suas características de mucoadesividade, biocompatibilidade e biodegradabilidade, e têm sido amplamente utilizados para a produção de nanopartículas de prata estabilizadas com albumina para fins de liberação de fármacos”, observou o pesquisador com formação em bioquímica e doutorado em Química. No entanto, a quitosana e a maioria de seus derivados são de natureza hidrofílica e podem não ser adequados para incorporar drogas altamente hidrofóbicas, como clotrimazol.

Para resolver o problema, Facchinatto sintetizou o derivado anfifílico de quitosana, que exibiu aspecto de automontagem em água, bem como alta capacidade de carga de drogas lipofílicas (afinidade por gorduras).

“O derivado foi utilizado como nanocarreador de clotrimazol para o tratamento tópico da candidíase vulvovaginal. O nanossistema apresentou liberação sustentada de fármaco independente do pH por até 48 horas, o que afetou tanto a atividade anticandida in vitro como a citotoxicidade”, constatou Facchinatto, com formação em química e agora doutor em Ciências, área do conhecimento Físico-Química.

Satisfação dupla

Para Facchinatto, a premiação ocorre de forma bastante inusitada. Ele conta que durante toda a sua trajetória acadêmica teve a oportunidade de celebrar vitórias pontuais, no geral não apresentando grandes destaques, mas que, de toda forma, representaram pequenos passos rumo ao reconhecimento profissional. “No tocante ao Prêmio Tese Destaque USP, compreendo que esse reconhecimento pode dar um salto para além do que imaginei ser capaz, já que apesar de aspirante ao prêmio, levei o processo na esportiva sem ao menos esperar de que fosse possível”, afirmou o homenageado.

Ele disse que o trabalho de doutorado foi naturalmente laborioso, mas acredita que seu aprendizado, no que tange à condução de trabalhos científicos, focado na qualidade, impacto e na valorização de potenciais colaborações, muito incentivado pelo ex-orientador Luiz Alberto Colnago, foi determinante para a elaboração da tese. “Desse modo, esse prêmio representa para mim uma confirmação de que a minha maneira de planejar, conduzir e reportar ciência está bem direcionada”, concluiu Facchinatto, que no momento finaliza um estágio pós-doutoral na Universidade de Estrasburgo, na França.

 Além do trabalho, que vai render um prêmio de R$ 10 mil a Facchinatto e R$ 5 mil a Colnago, o contemplado ainda recebeu a confirmação de que foi aprovado em concurso público para o cargo de Pesquisador de nível inicial na Universidade de Aveiro, Portugal, com início programado para janeiro de 2023. O novo doutor disse que esta chance ocorre em hora bastante oportuna, uma vez que alcançar uma posição acadêmica permanente é tarefa árdua não somente no Brasil.

“Neste cargo, espero contribuir efetivamente para as áreas de pesquisa ligadas às que venho desenvolvendo e ainda explorar novas fronteiras. Graças aos trabalhos e publicações de que pude conduzir e participar como colaborador até o momento, preservo no Brasil diversos parceiros profissionais em diferentes áreas, com os quais seguramente continuarei em contato, contribuindo para internacionalização de estudantes e futuros colaboradores” afirma.

Durante seu doutorado, trabalhos que deram origem à tese já haviam sido premiados pela Associação de Usuários de RMN (AUREMN). A primeira premiação foi contemplada em 2018, na categoria de melhor trabalho de doutorado, apresentado na XV Jornada Brasileira de Ressonância Magnética, em Bento Gonçalves (RS). A segunda premiação ocorreu em 2019, na categoria de melhor pôster apresentado no 17th NMR Users Meeting, em Búzios (RJ).

Durante o desenvolvimento do doutorado até a data da submissão final da tese, diversos artigos foram publicados em periódicos revisados ​​por pares. O último, sobre “Clotrimazole-loaded N-(2-hydroxy)-propyl-3-trimethylammonium, O-palmitoyl chitosan nanoparticles for topical treatment of vulvovaginal candidiasis”, foi publicado pela Acta Biomaterialia, v. 125, p. 312-321, 2021 e está acessível neste endereço.

O estudo foi apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo (Fapesp), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e em parte pelo Conselho Nacional de Aperfeiçoamento do Ensino Superior (Capes). [2]

[1] Foto: Luiz Colnago

[2] Texto de Joana Silva

Como citar este texto: Embrapa. Estudo inédito com RMN demonstra potencial de derivados de quitosana no tratamento de doenças infecciosas.  Texto de Joana Silva. Saense. https://saense.com.br/2022/11/estudo-inedito-com-rmn-demonstra-potencial-de-derivados-de-quitosana-no-tratamento-de-doencas-infecciosas/. Publicado em 23 de novembro (2022).

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