ESO
11/06/2019

Very Large Telescope do ESO (VLT). Crédito: A. Ghizzi Panizza/ESO

O Breakthrough Watch, um programa astronômico global que procura planetas do tipo terrestre em torno de estrelas próximas, e o Observatório Europeu do Sul (ESO), a principal organização astronômica intergovernamental europeia, anunciaram hoje a “primeira luz” de um novo instrumento de busca de planetas montado no Very Large Telescope do ESO, no deserto do Atacama, Chile.

O instrumento, chamado NEAR (Near Earths in the AlphaCen Region), foi concebido para procurar exoplanetas no nosso sistema estelar vizinho, Alfa Centauri, nas “zonas habitáveis” das suas duas estrelas semelhantes ao Sol, onde a água poderá potencialmente existir em forma líquida. O instrumento foi desenvolvido nos últimos três anos e construído em colaboração com a Universidade de Uppsala na Suécia, a Universidade de Liège na Bélgica, o Instituto de Tecnologia da Califórnia nos EUA e o Telescópio Óptico Kampf em Munique na Alemanha.

Desde o dia 23 de maio que os astrônomos do Very Large Telescope do ESO (VLT) levam a cabo uma campanha de observação de 10 dias para estabelecer a presença ou ausência de um ou mais planetas no sistema estelar. As observações terminarão amanhã, dia 11 de junho. Os planetas no sistema (pelo menos duas vezes maiores que a Terra) seriam detectáveis com esta instrumentação melhorada. O intervalo de comprimentos de onda observado, do infravermelho próximo ao infravermelho térmico, é significativo já que corresponde ao calor emitido por um candidato a planeta, possibilitando assim aos astrônomos determinar se a temperatura do planeta permitirá a existência de água líquida.

O sistema Alfa Centauri é o mais próximo do nosso Sistema Solar, situando-se a cerca de 4,37 anos-luz de distância. É constituído por duas estrelas do tipo do Sol, Alfa Centauri A e B, e uma estrela anã vermelha, Proxima Centauri. O conhecimento atual que temos dos sistemas planetários de Alfa Centauri é escasso. Em 2016, uma equipe de pesquisadores utilizou instrumentos do ESO para descobrir um planeta do tipo da Terra em órbita de Proxima Centauri. No entanto, Alfa Centauri A e B permanecem ainda variáveis desconhecidas; não é claro quão estáveis serão tais sistemas binários para planetas do tipo terrestre e por isso a maneira mais promissora de estabelecer se tais planetas existem é tentar observá-los.

Obter imagens destes planetas é, no entanto, um desafio tecnológico grande, já que a luz estelar que é refletida pelos planetas é geralmente bilhões de vezes mais fraca do que a luz que nos chega diretamente das estrelas hospedeiras; conseguir distinguir um pequeno planeta próximo da sua estrela progenitora a uma distância de vários anos-luz pode comparar-se a conseguir ver uma borboleta voando em torno de um lâmpada de rua a uma distância de várias dezenas de quilômetros. Para resolver este problema, em 2016 o Breakthrough Watch e o ESO iniciaram uma colaboração focada na construção um instrumento especial chamado coronógrafo infravermelho térmico, quel foi concebido para bloquear a maioria da radiação emitida pela estrela e otimizado para capturar a radiação infravermelha emitida pela superfície quente de um planeta em órbita, em vez da pequena quantidade de radiação estelar que o planeta reflete. Tal como objetos situados próximo do Sol (e normalmente escondidos pelo seu brilho) podem ser vistos durante um eclipse total, também um coronógrafo cria uma espécie de eclipse artificial na estrela alvo, bloqueando a sua radiação e permitindo que objetos muito mais tênues existentes na sua vizinhança possam ser detectados. Trata-se de um avanço significativo das capacidades observacionais.

O coronógrafo foi instalado num dos quatro telescópios de 8 metros do VLT, ao alterar e melhorar um instrumento já existente chamado VISIR, de modo a otimizar a sua sensibilidade nos comprimentos de onda infravermelhos associados a exoplanetas potencialmente habitáveis. O instrumento poderá assim procurar assinaturas de calor semelhantes às da Terra, que absorve energia do Sol e reemite-a nos comprimentos de onda infravermelhos térmicos. O novo instrumento, NEAR, é uma modificação do VISIR de três maneiras diferentes, combinando várias técnicas de engenharia astronômica de vanguarda. Primeiro, adapta o instrumento à coronografia, permitindo a redução drástica da radiação emitida pela estrela alvo e revelando deste modo assinaturas de potenciais planetas terrestres. Segundo, usa uma técnica chamada óptica adaptativa para deformar o espelho secundário do telescópio, compensando assim os efeitos de distorção produzidos pela atmosfera da Terra. Terceiro, aplica estratégias de filtragem que também reduzem o ruído, além de permitirem que o instrumento mude rapidamente de estrela alvo, a cada 100 milissegundos, maximizando assim o tempo de telescópio disponível.

Peter Worden, Diretor Executivo das Iniciativas Breakthrough, disse: “Estamos muito satisfeitos por colaborar com o ESO na concepção, construção, instalação e agora uso deste novo instrumento tão inovador. Se existirem planetas do tipo terrestre em torno de Alfa Centauri A e B, será uma grande notícia para todas as pessoas do nosso planeta.”

“O ESO tem todo o prazer em partilhar a sua experiência, infraestruturas existentes e tempo de observação no Very Large Telescope com o projeto NEAR,” comentou o gestor do projeto no ESO Robin Arsenault.

“Trata-se de uma oportunidade valiosa, já que — além dos seus próprios objetivos científicos — a experiência NEAR é também prercursora de futuros instrumentos de busca de planetas para o Extremely Large Telescope,” disse Markus Kasper, o cientista principal do ESO para o NEAR.

“O NEAR é o primeiro e (atualmente) único projeto que poderá obter imagens diretas de um planeta habitável, constituindo por isso um importante marco. Estamos com muita esperança que exista um planeta habitável grande em órbita de Alfa Cen A ou B”, comentou Olivier Guyon, cientista principal do Breakthrough Watch.

“Os seres humanos são exploradores naturais,” disse Yuri Milner, fundador das Iniciativas Breakthrough, “Está na hora de descobrirmos o que é que está além do vale seguinte. Este telescópio vai nos permitir ver o que tem lá.” [1]

[1] Esta notícia científica foi traduzida por Margarida Serote (Portugal) e adaptada para o português brasileiro por Eugênio Reis Neto.

Como citar esta notícia científica: ESO. “Primeira luz” de instrumento melhorado para busca de planetas do tipo terrestre no sistema estelar mais próximo de nós. Tradução de Margarida Serote e Eugênio Reis Neto. Saense. https://saense.com.br/2019/06/primeira-luz-de-instrumento-melhorado-para-busca-de-planetas-do-tipo-terrestre-no-sistema-estelar-mais-proximo-de-nos/. Publicado em 11 de junho (2019).

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