Jornal da USP
24/06/2020

As desigualdades relacionadas ao transporte público aumentaram em razão das medidas adotadas pelos gestores durante a pandemia – Montagem: Cleber Siquette – Fotos: Marcos Santos/Jornal da USP

Estudo produzido pela Rede de Pesquisa Solidária mostra que as mudanças operacionais realizadas pelos governos estaduais e municipais no transporte público, como redução na circulação de ônibus, trens e metrô, não acompanharam adequadamente a demanda e aumentaram as lotações dos transportes públicos particularmente nas periferias de grandes cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Curitiba, o que aumentou o risco de contágio da covid-19. Na capital paulista, as linhas da região central tiveram redução de 68% de passageiros e de 61,3% no número de ônibus circulando, ao passo que na região leste, a demanda se reduziu em cerca de 5% a menos do que na região central (63,6%), mas a redução da oferta de ônibus não acompanhou essa diferença, sendo mantida em 61,6%. Assim, o estudo conclui que as desigualdades relacionadas ao transporte público aumentaram em razão das medidas adotadas pelos gestores durante a pandemia.

As conclusões do trabalho estão reunidas em uma nota técnica publicada pela Rede de Pesquisa Solidária. O estudo foi coordenado por Mariana Giannotti, pesquisadora do Centro de Estudos da Metrópole (CEM) e professora da Escola Politécnica (Poli), e teve participação dos pesquisadores Tainá Bittencourt e Pedro Logiodice, ambos da Poli e do CEM. O centro é um dos integrantes da rede, que reúne mais de 40 pesquisadores para analisar a eficácia e sugerir aperfeiçoamentos das políticas públicas para o enfrentamento da covid-19. “Além de não reduzirem as taxas de lotação observadas nos anos anteriores, no sentido de diminuir a exposição e contaminação nos trajetos, [as mudanças] geraram muitas vezes condições ainda piores do que antes da pandemia”, destacam os autores.

De acordo com a pesquisa, as alterações feitas no sistema de transporte durante a pandemia elevaram em até 80% a frequência nas estações nas regiões periféricas. “A redução da circulação de ônibus, que pode fazer algum sentido do ponto de vista financeiro, provoca lotações, aglomerações e aumenta, assim, o risco de contágio da população. As desigualdades sociais e de raça nos deslocamentos urbanos aumentam o risco de contágio em moradores das periferias.” Com base no observado pelos pesquisadores, e considerando o cenário de retomada das atividades não essenciais, eles sugerem medidas para redução dos riscos, como a utilização de veículos adicionais em trechos de maior lotação, somados a veículos expressos e diretos entre grandes terminais e polos de origem e destino de viagens. “Isso pode criar pontos de alívio e reduzir os custos associados ao maior número de veículos em operação”, destacam.

O reforço de linhas locais e capilares que conectam as diferentes áreas da cidade às linhas estruturais de transporte público de média e alta capacidade também pode contribuir para reduzir a pressão por mais ônibus e aumentar a frequência do serviço. “O estudo indica que é importante olhar a cidade como um todo, mas não apenas de forma agregada. As ações devem considerar as diferenças presentes no território para atuar de forma condizente à realidade de cada região, em busca de minimizar o impacto das desigualdades socioespaciais”, afirma a professora Mariana Giannotti.

Como citar esta notícia: Jornal da USP. Mudanças no transporte coletivo aumentaram risco de contágio dos grupos mais vulneráveis à covid-19. Saense. https://saense.com.br/2020/06/mudancas-no-transporte-coletivo-aumentaram-risco-de-contagio-dos-grupos-mais-vulneraveis-a-covid-19/. Publicado em 24 de junho (2020).

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