CCS/CAPES
20/09/2019

Vinícius de Oliveira Boldrini com seu grupo de pesquisa. Foto: arquivo pessoal

Graduado em Ciências Biológicas pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC – Campinas), Vinícius de Oliveira Boldrini, doutorando no Programa de Pós-Graduação em Genética e Biologia Molecular do Instituto de Biologia (IB) da Universidade de Campinas (Unicamp), recebeu no último mês de agosto dois prêmios por suas pesquisas na área do sistema imunológico de pacientes com esclerose múltipla (EM), doença autoimune do sistema nervoso central.

Fale um pouco sobre o seu projeto de pesquisa.
Desde o meu mestrado, feito no Laboratório de Neuroimunologia da Unicamp, tenho buscado compreender o comportamento de células citotóxicas em pacientes com esclerose múltipla (EM). Células como, por exemplo, os linfócitos T CD8+, são importantes, sobretudo, para nos proteger contra infecções virais e processos tumorais. Contudo, em pacientes com EM, essas células reconhecem componentes do sistema nervoso central como estranhos e passam a reagir contra eles. Diversas evidências científicas sugerem que este é um mecanismo importante durante doença.

Durante a pesquisa de mestrado demonstramos que no sangue de pacientes com EM outras células do sistema imunológico pareciam “copiar” a função dos linfócitos T CD8+. Isto fez com que, no período de doutorado, sob a orientação decidíssemos aprofundar ainda mais esta investigação.

Quais são os principais pontos da sua pesquisa?
Verificamos que a presença de células que imitam o comportamento de linfócitos T CD8+ parece ser um fenômeno não restrito apenas aos pacientes com EM uma vez que observamos estas mesmas células no sangue periférico de portadores das Doenças do Espectro da Neuromielite Óptica (NMOSD).

Assim como a EM, as NMOSD também são doenças autoimunes que afetam o sistema nervoso central.
Embora o papel das células que imitam o comportamento citotóxico precise ser melhor compreendido em ambas as doenças, nossos resultados sugerem que estas funções podem estar associadas a outras doenças autoimunes.

Qual a importância do seu trabalho para a realidade brasileira? E no âmbito internacional?
Estudos que buscam entender como o sistema imunológico funciona são de extrema importância para o desenvolvimento de medicamentos novos e mais eficientes. Estas terapias devem ter um impacto muito positivo no tratamento de diversas doenças em um futuro próximo. É nítido que existe uma corrida internacional pela descoberta de alvos específicos do sistema imunológico que possam ser ativados ou desligados nas doenças em que as respostas imunes são consideradas importantes.

No Brasil, atualmente, algumas destas drogas já são utilizadas no tratamento de pacientes com certos tipos de tumores. Assim, ao descrevermos funções até então inesperadas para certos tipos celulares (como fizemos nestes trabalhos premiados) esperamos colaborar, ainda que minimamente, para situar o Brasil no rol de estudos internacionais que contribuem para um entendimento mais sólido sobre o funcionamento do sistema imunológico. Isto, por sua vez, pode também abrir perspectivas para o desenvolvimento de novos medicamentos no futuro.

O que a sua pesquisa traz de diferente daquilo que já é visto na literatura?
Vimos nestes trabalhos que a atividade citotóxica inesperada, encontrada em células do sistema imunológico (sobretudo em linfócitos B), parece estar relacionada à expressão de uma proteína chamada Runx3.

Em linfócitos T CD8+ a expressão desta proteína se relaciona diretamente com as funções citotóxicas. Embora alguns trabalhos na literatura sugerissem que a expressão do Runx3 pudesse ocorrer em outras células do sistema imunológico, não existiam descrições consistentes de que a atividade citotóxica acompanharia a expressão do Runx3, por exemplo, nestes mesmos linfócitos B.

Nos conte um pouco sobre a premiação. Quais foram os trabalhos premiados?
Em 2019 nosso grupo de pesquisas obteve duas premiações em eventos científicos distintos. Ambas foram concedidas em eventos científicos da área de neurologia, cujo foco principal é o estudo da esclerose múltipla. Neste sentido, as premiações são semelhantes. A primeira delas, no dia 2 de agosto, se refere à melhor apresentação de trabalho Massive cytotoxic behavior of B cells in Multiple Sclerosis Patients treated with Fingolimod and Natalizumab na modalidade oral, durante o V Encontro de Investigadores Brasileiros em Neuroimunologia, organizado pela Academia Brasileira de Neurologia. Já no 20th BCTRIMS, a categoria Gilberto Belisário Campos premiou o trabalho em que demonstramos, pela primeira vez, a ocorrência destas mesmas células na NMOSD.

Qual foi a sua reação ao saber do prêmio?
Foi motivo de grande alegria para mim e todo o nosso grupo de pesquisas. O trabalho com amostras de pacientes é minucioso e bastante difícil em algumas etapas. Por exemplo, no trabalho Massive Cytotoxic Cells Activity During Neuromyelitis Optica Spectrum Disorder, contamos com amostras biológicas que nos foram enviadas do Rio de Janeiro (RJ) para Campinas (SP). Para isso foi preciso criar uma logística que permitisse cumprir o ciclo de coleta, envio, transporte e recebimento do material biológico; tudo isso sem que a integridade das amostras fosse comprometida. Para tanto contamos com a valiosa colaboração de diversos neurologistas, sem a participação dos quais o trabalho não teria sido possível. Desta forma, penso que a premiação é reflexo de um grande esforço conjunto.

Continuaremos a investigação a respeito do envolvimento das células citotóxicas, tanto na EM quanto na NMOSD, buscando revelar se existem marcadores celulares específicos que consigam discriminar estas populações dentre as demais existentes.

Como citar esta notícia: CCS/CAPES. Pesquisa sobre esclerose múltipla é premiada duas vezes. Saense. https://saense.com.br/2019/09/pesquisa-sobre-esclerose-multipla-e-premiada-duas-vezes/. Publicado em 20 de setembro (2019).

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